... mas valeu a pena perder a razão ...

26 3 6
                                    

A notícia do surto de Marta chegou nos diretores do programa, que decidiram a afastar por uma semana, se compadecendo dela por conta do que estava acontecendo com Lucrécio. A mulher, antes imponente e confiante, agora estava amuada dentro de um táxi que uma figurinista havia chamado para ela por estar penalizada com sua situação. Quando Marta chegou em casa, viu Calixto com os pés sobre o sofá da sala, bebendo uma garrafa de cerveja, que estava pela metade, e rodeado por muitas outras, vazias. Ao ver o rosto borrado com maquiagem de Marta, e perceber que ela deveria estar apresentando o jornal, e não parada ali, branca como um papel, na sua frente, ele largou a cerveja, franziu as sobrancelhas e olhou irritado para ela.

— O que você está fazendo aqui? — ele a interrogou, incomodado de a ver ali àquela hora.

— Eu... eu fui afastada por uma semana. — Marta murmurou, desanimada.

— Afastada? Como assim? Depois de tudo que fizemos para você conseguir o cargo dele? — Calixto agora estava de pé, olhando fixo para ela.

— Eu vi o Lucrécio de novo. — choramingou.

— De novo esse papo maluco? Eu estou começando a achar que você não fez o serviço direito. — dizia ele, desconfiado.

— Eu fiz o que me disse para fazer. Levei ele longe, no meio do mato, falei que o pneu furou e quando ele saiu do carro eu atirei nele. — Marta contou, com o coração batendo forte.

— Atirou onde? — Calixto quis saber.

— No peito, como você falou.

— Você viu o pulso dele? Ele morreu, certo?

— M-morreu. Eu acho que morreu. Estava escuro, não fui para perto dele. Tinha muito sangue. Ele morreu. — balbuciava Marta, ficando levemente irritada.

— Droga Marta. Você que queria o dinheiro e o cargo dele, foi sua ideia tirar ele da sua frente para conseguir o lugar dele no jornal. Eu tive que te aturar reclamando dele toda noite, o quanto ele era sovina, como ele não te satisfazia. Eu achei que você faria direito, mas eu que deveria ter ido.

— E iria falar o que? Eu disse que íamos sair de férias, e ele demorou concordar. Não, aquele velho sovina morreu, eu vi. —Marta, mesmo assustada, tinha agora a uma irritação crescente. —Talvez seja só alguém querendo pregar uma peça, me assustar. — ela preferia acreditar nessa versão dos fatos.

— Pode ser, mas quem sabe que ele não está desaparecido como os jornais dizem? Ele tem algum irmão, primo?

— Eu não sei Calixto, eu acho que não, nunca vi ninguém da família dele desde que nos casamos.

— Droga Marta. Droga. Você tem que se recompor, senão vão desconfiar. Para de dar bandeira por aí, não fica com essa cara de papel nem pareça assustada. Fica de olho aberto para tudo, vê se alguém parece suspeito, se desconfiam de você lá na emissora. Aqui. Toma esses remédios, vão te fazer relaxar.

— Remédios? Isso não é remédio, Calixto. — disse Marta, olhando com raiva os comprimidos suspeitos que foram colocados em sua mão.

— Não importa. Aqui, engole. — Calixto levou a mão de Marta à boca dela, fazendo com que engolisse os comprimidos sem chance de recusar.

— Ótimo, boa garota. Eu vou sair.

— Calixto. — Marta o interceptou antes que pudesse alcançar a porta de entrada.

— O que é? — ele perguntou, irritado, com a mão na maçaneta da porta.

— Você me ama? — Marta quis saber. Sentia-se tão desesperada aqueles dias que precisava de um acalento.

Quem sou eu? Quem é você?Onde histórias criam vida. Descubra agora