Pela janela

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Eu ouvi toda a história enquanto encarava a escuridão lá fora. Imaginei a avó fitando o nada, na minha mente era uma imagem estranha, não sei se já consideraria automaticamente como triste. Seria como encarar a escuridão do outro lado da janela? Algo que por mais que você se concentrasse, por mais que colocasse todas as suas forças, ainda assim, não conseguiria discernir uma simples figura. No máximo uma ou duas silhuetas, e talvez ela se perguntasse o que aquelas formas estariam fazendo, quais suas intenções, para onde iam? O que viam? Será que a viam de volta? Será que a enxergavam? Saberiam o quanto ela estava tentando ver, mas a escuridão não permitia? Ou pior, talvez não houvesse uma escuridão. Talvez ela conseguisse enxergar. E o esforço que fazia, o motivo de fitar tão intensamente o horizonte. Fosse não conseguir fazer nenhuma ação, não conseguir acenar, não conseguir gritar. Como olhar por uma janela para as pessoas lá fora, mas ser fraca demais para quebrar a janela e chamar por eles, avisá-los de que o ônibus em que estava presa já iria partir. E então ela não os veria mais.

Eu conseguia entender um pouco do que o cara ao meu lado sentia, essa imagem da avó encarando o nada, e mesmo assim deixando que uma lágrima caísse. Essa imagem era bem tocante. Mas a minha curiosidade meio que ofuscava a sensibilidade da cena. Antes eu estava curiosa pra descobrir porquê a pessoa ao meu lado estava chorando, mas eu acabei ganhando só mais dúvidas. Outra pessoa que eu não sei o motivo de estar chorando, mais a ser descoberto. Mas essa é um tanto quanto mais complexa, me pergunto como devo abordar essa questão?

— Então, o que você acha?

E olha só, eu havia esquecido de respondê-lo, será que ele pensou que dormi? Mas, o que devo falar? O que se fala quando alguém te conta uma história sobre uma lágrima misteriosa?

— Tem certeza de que a avó não fez mais nenhuma ação?

— Hmm, não que eu me lembre. Acho que falei tudo o que eu consegui registrar.

Okay, mas antes de tentar entender qualquer coisa, eu precisava ter em mente o que realmente eu queria descobrir.

— Então nós queremos saber por que aquela senhora derramou uma lágrima, certo?

— Isso. Não é algo que fica na mente?

— Foi uma única lágrima, certo?

— Sim. Bom, eu vi claramente só uma, mas podem ter tido outras, eu fiquei ocupado a maior parte do tempo, então provavelmente eu deixei de ver...

— Eu perguntei apenas para confirmar se eu não tinha entendido errado que era apenas uma lágrima. Temos que nos ater no que você acabou de contar, que foi o que você viu. Não podemos levar em conta o que você não viu, porque existe um infinito de coisas que aconteceram e você não estava lá para ver. Então, temos que achar uma razão para aquela lágrima dentro de suas memórias, algo que vá satisfazer sua curiosidade, e se justifique em si mesma.

— Algo que vá satisfazer minha curiosidade? Então pode ser que não seja verdade?

— Se você achar que faz sentido, então se torna verdade. Uma verdade para você.

— Entendi. Você realmente é boa com as palavras.

— Então podemos começar com o básico. Temos que definir o que queremos saber. Só pra deixar claro.

— Queremos saber por que a avó derramou aquela lágrima.

— Bom, isso é um tanto em aberto. Pense bem, quantas razões para se chorar devem existir? Pode ser desde seu corpo mantendo os olhos úmidos, até um simples bocejo.

— Você tem razão, mas de uma coisa eu tenho certeza. Aquela lágrima era verdadeira. E com verdadeira, eu quero dizer que não veio de um simples acidente, como um cisco.

Detetive de LágrimasOnde histórias criam vida. Descubra agora