Capítulo 2

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Eu entrei em desespero. Não sabia o que fazer e meu corpo simplesmente entrou em choque, eu congelei.

- Menina, você ouviu? - A mulher que estava distribuindo a senha perguntou parecendo genuinamente preocupada. - A última senha era a da menina que estava na sua frente. Mas você ainda pode assistir a mesa, aquilo é só para os autógrafos... Tá tudo bem? - Então eu olho para ela e concordo com a cabeça, então a moça me deixa sozinha.

Me encosto em uma estante e, sem querer, vejo ultima garota que conseguiu a pulseira. Ela está com uma calça preta solta, uma blusa branca com algo que eu não conseguia ler de longe e calça um all star preto cano longo. Mexia o tempo todo no seu cabelo preto bem liso, tentando joga-lo pra trás, enquanto falava no telefone.

Se ela não fosse tão bonita eu estaria puta com ela.

E foi olhando pra ela que eu tive a ideia mais louca da minha vida (só não sabia se isso seria bom ou não).

Juro que eu não tinha a intenção de parecer uma stalker que estava perseguindo essa garota pela livraria, mas quando ela parou de andar e olhou pra mim sei que era isso que acontecia. Seus olhos pareciam num misto de raiva e curiosidade, enquanto o resto do corpo parecia tenso.

- O que você está fazendo? - A menina perguntou irritada. - Tá com algum problema comigo, porra?

- N-não - Respondo nervosa.

- Posso saber porquê você está me seguindo igual uma louca então? Perdeu alguma coisa?

- Depende do que você considera perder.

- QUÊ? - Ela pergunta um pouco alto demais, atraindo atenção pra nós duas.

- A gente pode conversar em algum lugar menos lotado?

- Você é uma louca que estava me perseguindo e agora quer me levar pra um lugar vazio? Tô com cara de idiota, garota?

- Eu juro que não sou uma louca!

- É exatamente o que um louco diria.

- Ok, calma. - Falei e me abaixei para poder mexer na minha mochila e pegar meus livros. - Tá vendo? Sou só outra fã da Lia. Uma que precisa de uma ajudinha.

- Você tem um jeito péssimo de pedir.

- É, eu não sou a melhor pessoa pra lidar com outros seres humanos... Mas então, podemos conversar?

- Ok. Tem tipo uma lanchonete no segundo andar, a gente pode pedir alguma coisa e sentar lá, tô com fome mesmo.

- Vamos então. - Concordo me levantando.

Seguimos para o lugar que ela indicou e dei graças a deus por estar mais vazio do que o restante da livraria. Ela pediu uma coxinha e um guaraná, enquanto eu fiquei com um café. Enquanto nosso pedido não chegava finalmente comecei a observar a decoração do local.

Como a Lia é nacionalmente conhecida por conta dos seus livros de romance young adult e new adult com protagonismo LGBTQIA+, em todos os cantos da livraria havia bandeiras da comunidade, pôsteres de livros com representatividade (tanto os da Lia quanto alguns outros) e cartazes com as hashtags "Leia com Orgulho" e "Não Vai Ter Censura".

Tudo estava perfeito, cada cantinho era mais apaixonante do que outro. Mas eu já sabia a sensação de segurança e paz que esse ambiente me gerou é o que vai me marcar pro resto da vida. Porque a partir daquele momento eu nunca mais duvidaria que eu estou sozinha nessa luta contra a intolerância que nos cerca no dia a dia.

Eu sempre lembraria desse momento, da quantidade de pessoas aqui. E saberia, do fundo do meu coração, que nós continuaríamos lutando, resistindo, e no final venceríamos toda essa guerra.

- Seu café vai esfriar. - A garota na minha frente me trouxe de volta a realidade. Nem mesmo tinha visto os pedidos chegarem. - Mas enfim, reparei que não sei seu nome ainda.

- Cecília, mas pode me chamar de Cecí. E o seu?

- Acho que ainda prefiro te chamar de doida, se você não se ofender. - Ela brinca e eu nego com a cabeça, fazendo a menina abrir um sorriso. Instantaneamente soube que faria de tudo pra poder ver esse sorriso pra mim de novo. - Show. Eu sou a Pietra.

- É um prazer... - Falo sorrindo e dou um gole no meu café, depois de colocar um pouco (vários saquinhos) de açúcar.

- Mas então, o que você tanto precisa?

- Da sua pulseira. - Vou direto ao ponto.

- Nos seus sonhos, só se for. - Pietra volta a ficar com raiva. - Eu entrei antes na fila. Sinto muito, mas ela é minha. Na verdade, não, não sinto não. - Ela tenta levantar mas eu seguro sua mão para impedir.

- Por favor me escuta. - Peço e ela volta a sentar, mas ainda de cara fechada. - A Lia mudou minha vida. Eu sei que é totalmente clichê falar disso, mas é verdade, eu juro. Foi com seu primeiro livro que eu me entendi e aceitei como bissexual, com o segundo eu tomei coragem de contar pra minha mãe. E se isso não for suficiente pra você, saiba que com isso minha mãe finalmente tomou coragem de ficar com a pessoa que ela ama. Então, por favor, eu preciso ver essa mulher.

- Olha, isso é incrível, de verdade. Mas ela é muito importante pra mim também e eu quero vê-la tanto quanto você. Se hoje meus pais me aceitam como eu sou foi por conta dos trabalhos dela na tv colocando pessoas LGBT fora do estereótipo que nos obrigavam a estar. - Ela respondeu eu foi então que eu me dei conta que eu realmente não ia encontrar com a Lia e o quão patética eu estava sendo. Não tinha jeito. Todas as pessoas que estão aqui a amam tanto quanto eu e não iriam simplesmente aceitar me dar a pulseira.

- Ei, não precisa chorar também... - Pietra novamente me traz de volta a realidade. A menina tinha trocado de cadeira, se sentando em uma ao meu lado. Não satisfeita ainda secou a lágrima que rolava pelos meus olhos e pegou na minha mão. É possível estar se sentindo tão triste que chega doer por um motivo e ter um gay panic ao mesmo tempo? - Olha, se você quiser eu posso pegar seus livros e pedir pra ela autografar. Sei que não seria a mesma coisa, mas pode ser?

- Obrigada. - Respondo vendo uma luzinha no final do túnel.

Algo me dizia que aquela não seria a última vez que essa garota seria minha luz.

Foto: https://pin.it/7BO7Sf2

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