Policial Rubem Furtado

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Edifício número 876, apartamento 401. Apartamento aparentemente sujo, paredes desgastadas por mofo e móveis de segunda mão. Proprietária negra, 25 anos, seu nome é Lorraine. De acordo com vizinhos, uma prostituta pouco problemática. Lorraine foi encontrada com suas roupas desgastadas, parcialmente queimadas, mesmo a autópsia não concordando totalmente com a ideia de que a indivídua foi queimada ou algo parecido. 

Vizinhos dos apartamentos 402, 405, 407 e 410 disseram que faz alguns dias que o apartamento tem cheirado muito mal. Pergunto se é cheiro de algo específico, pois o cheiro de gente morta é forte e são poucos aqueles que sabem como é. Para minha surpresa, a vizinha do 402, Rosa Galvão, uma velha de cabelos ruivos pintados e mãe de um moleque aparentemente retardado (uma de suas pernas era falha e seu rosto era torto para a direita) me conta que não lembrava de nenhum cheiro específico mesmo tendo trabalhado em um necrotério e um crematório. 

Já me encontro a 3 horas no apartamento. O cheiro parece merda batida com leite azedo. Dois de meus assistentes estão checando o apartamento. Carlos, um dos incompetentes que acabo de citar, conta mais uma novidade. Melhor, duas.

-Rubens, posso falar com o senhor?

-Óbvio, é para isso que estou aqui. Seu animal. 

É necessário tratar esses arrombadinhos assim. Nessa forma, você se torna homem. Homem, quando esculachado, fodido pelos outros, realmente vira homem. Não lendo essas merdas de Machado e Dostoievsky. Quando entrei na polícia, trabalhava como assistente de perícia. Um dia, antes de começar o trabalho, o delegado Castro, que adorava cheirar coca na hora do café da manhã (não estou falando de 10 da manhã, eram 7. 7 da manhã e ele cheirando 2 carreirinhas longas de pó branco puro). Depois da cheirada rápida dentro do escritório, Castro abre a porta e me chama gritando. 

-Rubens, seu merdinha de cavalo, tem um trabalho para você aqui. 

Eu não abria a boca. Fui criado sabendo que quando tu abre a boca para falar qualquer merda, sua chance de dar merda aumenta 100%. E quando tu fala puto, vai para 150%. Não vou nem falar a porcentagem de quando tu bebe whisky vagabundo. 

Entro na sala do Castro. Reparo no momento que ele senta, que seus sapatos estão sujos de barro, ou alguma merda parecida. Castro senta, de terno e com aquele sapato sujo. Castro apoia seus pés sujos de merda em cima de sua mesa, que acaba de ser limpada. Com seus cabelos grisalhos,  de terno acinzentado e sapatos caros, sujos de lama, Castro me lembrou algum mafioso que acaba de enterrar algum delator do tráfico de maconha para as bichas do posto 9, em Ipanema. Pela vestimenta, meio mal e meio veado, um gangster de Copacabana? Quase Leme? Só de lembrar, me da vontade de pegar uma tora de madeira, tacar fogo e inserir naquele cuzinho apertado, cheio de pelo enrolado com caspa. Ardendo aos poucos, em pequenas chamas. Credo, que delícia. 

-Rubens...-Fala o cuzinho em chamas, olhando para mim de cima para baixo e de baixo para cima.- Tenho um trabalho para você.

-Claro.- Como eu era cabaço.- Onde é o serviço? Senhor. 

-Aqui mesmo.- Castro bota os dois pés na mesa, com aqueles sapatos sujos bem na minha fuça.- Pegue o lenço da mesa, e limpe a lama dos meus sapatos. 

Eu, como uma boa putinha iniciante, fui pegar um lenço que se encontrava no centro de sua mesa nova e brilhante. Quando pegava o lenço, preto e leve, olhava para aquela mesa, e ficava de pau duro pensando como deve ser bom cheirar naquela porra de mesa. Nossa, que vontade de arrancar a cabeça desse veado e misturar com o pozinho mágico e dar uma cheirada. Preciso voltar a realidade, que estou apenas pegando um lenço e o passando no sapato de um delegado bicha.  

-Limpe bem.- Dizia Castro, enquanto eu limpava seus sapatos com um lenço, que era menor que a minha mão.

Castro me olhava limpando seus sapatos da Mr.Cat e colocava uma de suas mãos, lentamente, dentro de sua calça. Castro batendo uma, olhando para mim, um subalterno, com formação superior, limpando seus pés com um lenço que serve para limpar óculos. O sangue esquenta, mas nunca me esqueço dos 150%. Nunca. 

A Máscara OniOnde histórias criam vida. Descubra agora