Casebre

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Não importa como eu observasse, Natsuo e Shoto olhavam para S/N como uma intrusa, com exceção de Fuyumi, na qual se apressou em deixar a mais velha confortável. Mas Shoto parecia diferente, ele não tirava os olhos da loira ao meu lado, olhando-a com seu olhar acusatório, como se esperasse que ela desse um movimento falso para tira-la da casa.

Por insistência minha e de Fuyumi, a loira havia ficado para o jantar, mas recusou incansavelmente quando a pedi para repousar lá. 
Com a desculpa de o horário de minha patrulha chegando, acompanhei a menor até sua casa, mas senti meu peito apertar ao ver aquela pequeno casebre em um local humilde. O odor forte da rua preencheu minhas narinas, as fazendo arder, a rua escura, onde nem mesmo a luz do luar podia alcançar, tínhamos que cuidar onde pisávamos, caso contrario, poderíamos cair nos degraus incessantes.

- Eu não consigo acreditar que você mora nesse casebre. - Resmungava.

O espaço pequeno no qual ela chamava de lar, o teto era baixo, o que tornava difícil para que eu ficasse em pé, as paredes continham marcas fracas de mofo, nas quais não se removiam sem um tremendo esforço, o leve cheiro de tinta e graxa podia se sentir entre as paredes, mostrando que mesmo depois de anos, ela jamais havia abandonado sua paixão por peças de metal, a cozinha era embutida no pequeno cubículo no qual ela carinhosamente apelidou de sala, os moveis eram um pouco surrados e velhos, haviam três quartos nos quais ela havia me proibido de entrar. Atiçando minha curiosidade.

Oferecendo-se para fazer um chá, pude vê-la andar pela única parede onde era sua cozinha. Seu corpo pequeno era adaptável para o pequeno imóvel, ela balançava levemente o corpo, no ritmo de uma música inaudível. Mas eu não conseguia deixar de perceber o fraco cheiro de um perfume de madeira queimada, era um perfume fraco e um pouco masculino, como se dissesse que um homem estivera ali à pouco tempo.

- Você mora sozinha aqui? - Com a minha pergunta, ela enrijeceu o corpo, mas logo disfarçou, trazendo duas canecas com o liquido quente.

- Sim, me desculpe se a casa não for muito do seu agrado, eu não a limpei bem nos últimos dias, não esperava que traria visita. - Justificou.

Não pude evitar de sentir um aperto no peito ao ver o sorriso triste em seu rosto. Eu sempre quis que ela tivesse uma vida feliz, em uma casa aconchegante, imaginando os nossos netos de fios dourados e avermelhados correndo pela casa.

- S/N, deixe-me arranjar uma casa melhor para você. - Pedi ao vê-la se sentar em minha frente, na pequena mesa de centro, onde nem mesmo ela conseguia arranjar uma posição para as pernas. Minhas palavras pareceram choca-la por pequenos instantes, mas logo ela balançou, repetidamente, a cabeça de forma negativa. - Por favor, ou então eu posso deixar um andar na agência, ou uma sala pra você na minha casa, mas você não pode ficar nesse lugar, não iria me surpreender se uma infestação de ratos ocorresse por aqui.

- Eu sei que esse não é o melhor lugar, nem a casa ou o bairro, é um pouco fora de mão, longe da estação, sei que não é muito confortável, mas é o suficiente pra mim. 

S/N sempre foi assim, de maneira humilde, não era ambiciosa, não buscava mais do que o necessário, não buscava ser valorizada ou ser aprovada pelos outros, conseguia se adaptar aos ambiente de forma fácil, conseguia se lidar sob pressão. Sempre foi assim que ela demonstrou, mas todos sabiam o desespero que ela tinha ao ficar em lugares apertados, ao sentir um peso grande em seus ombros, ou a forma como ficava apavorada quando estava perto de um prazo para suas coisas.

- Então deixe-me te oferecer um emprego, um melhor de qualquer que tenha agora, um na agência, você sempre foi ótima com engenharia, tem um dom, você poderia muito começar um curso. - Ela fitava a pequena mesa gasta enquanto me ouvia, ela não retrucava ou concordava, apenas absorvia tudo. - Eu posso convencer o Nezu a te dar uma vaga como professora na U.A., tenho certeza que ele vai concordar, todos os professores lá sabem o quão boa você sempre foi durante o colegial.

Tais palavras fizeram com que ela deitasse seu corpo na mesinha, não consegui me segurar ao levar as mãos para seu cabelo, continuavam sedosos e macios.

- Enji, eu não sei se tenho a mesma capacidade de antes, já faz tempo que eu não mexo com mecânica. - Respondeu, suas pálpebras se fecharam ao sentir meu toque em sua cabeça e não consegui não admira-la.

- Eu tenho certeza que você consegue fazer tudo e muito mais do que você fazia. Pense sobre isso, mas hoje, deixe-me levar até um lugar onde possa descansar melhor.

Em resposta, ela apenas assentiu com a cabeça, o sono a abateu em poucos segundos, podia ver suas costas se erguerem a cada inalar, sua respiração sutil e o modo como seus labios ficavam entreabertos me deixavam encantado.

- Eu te amo, minha querida, então deixe-me cuidar de você no tempo que me resta. - Sussurrei.

Cuidando para não acorda-la enquanto deixava os copos na pia e a pegava em meus braços, pude sentir uma pequena dor em meus braços, me relembrando das queimaduras e os machucados não tratados em meu corpo.

Levei-a pelos céus, no maior silêncio em que conseguia, pousando em frente à um hotel no centro da cidade, senti a loira se contorcer ao sentir a luz bater em seus olhos.

- Desculpe, eu acabei te acordando.

- Onde estamos, Enji? - Foi a primeira coisa que ela disse ao ver a recepção decorada.

- Em um hotel, eu disse que iria te deixar dormir em um lugar mais confortável.

Ela me olhava desentendida enquanto a colocava no chão, ela pareceu procurar em sua mente o momento em que havia concordado, vagando atrás de mim em seu modo automático, a guiei até o elevador, onde ela me olhou com seu olhar acusador.

- Eu estava quase dormindo! Não era para levar a sério!

- Tudo que você fala eu levo a sério. - Respondi, aproveitando o elevador vazio e abraçando-a por trás, ela não se moveu quando passei meus braços em seu cintura e repousei minha cabeça em seu ombro. - Será apenas hoje, amanhã, depois de amanhã e todos os dias subsequentes.

- Enji, eu não...

- Você pode. Eu sei que pode e sei que quer também. S/N dê uma última chance para nós, eu sei que vamos conseguir ficar juntos, independentes do que acontecer.

Dessa vez, me escolha!Onde histórias criam vida. Descubra agora