Prólogo

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Quando eu era pequeno, sempre dizia para todo mundo que jamais ia namorar. Meninas só davam dor de cabeça, e pessoas apaixonadas pareciam mais idiotas que o normal. Eu que não ia me tornar uma delas.

O problema é que eu cresci e acabei não me tornando um bobo apaixonado, mas tive uma baita dor de cabeça ao me envolver com uma garota que estudava na sala ao lado. Talvez eu devesse ter seguido os ideais do Tom de nove anos de idade, ele parecia bem mais sábio do que eu me sentia agora.

Maldita hora que aceitei namorar com Mikaela Borges. Se eu soubesse que esse relacionamento só me renderia dor de cabeça e um par de chifres, não teria dito a porra de um sim naquele dia, apenas a mandaria procurar outra pessoa para exibir aos seus seguidores do Instagram, já que ela se importava muito mais com eles do que comigo e com o nosso relacionamento.

Soltei um suspiro, irritado por ter sido um completo idiota e alcancei o maço de cigarros no bolso. Aquela parte da estação estava praticamente vazia por ser muito antes do horário do primeiro trem. As poucas pessoas que se encontravam por lá, porém, não tiravam os olhos de mim, o que me fez me sentir pior do que já estava.

Bem, não é todo dia que elas se deparam com um jovem de mais de 1,80m, cheio de tatuagens, cigarro na boca e com a aparência de quem acabara de ser atropelado por um caminhão de mudanças. Eu devia estar muito patético para um grupo de estranhos me olhar daquele jeito.

Eu já tinha fumado dois cigarros e meio quando deu o horário do trem, e as pessoas que surgiram do nada começaram a embarcar. A maioria delas eram turistas querendo ir de Mariana para Ouro Preto, não eram como eu, que só queria dar uma volta para esquecer Mikaela e o que ela fizera comigo.

Entrei no trem e fiquei debruçado em uma das janelas enquanto o restante dos passageiros entravam. Meu hálito e roupas fediam fumaça, mas, como o vagão onde me encontrava estava praticamente vazio também, não me importei com isso. Os incomodados que se mudem.

Continuei debruçado na janela e pensando em tudo que me ocorreu na última semana. A raiva aumentava cada vez mais conforme me recordava da traição de Mikaela.

Eu não a amava, era mais uma atração do que amor propriamente dito. Contudo, embora tivéssemos problemas no relacionamento e visões diferentes sobre o mundo, acho que eu merecia mais respeito do que isso. Ela podia ao menos ter terminado comigo antes de dar para o primeiro blogueirinho que conheceu.

Ainda irritado, me afastei da janela e acabei esbarrando as costas contra alguém que acabava de entrar no vagão.

— Desculpa — dissemos ao mesmo tempo.

A garota parada diante de mim tinha um semblante cansado, as olheiras abaixo de seus olhos castanhos denunciavam uma possível noite em claro.

— Foi mal, estou um pouco aérea hoje... — Ela bocejou, arrumando os cachos do cabelo.

Achei graça da situação, por um momento, me esquecendo da irritação que me levou até aquele trem turístico. Eu quem havia esbarrado nela, por que ela pedia desculpas?

— Dia ruim? — perguntei não sei por qual motivo.

Acho que eu só queria esquecer os meus problemas, mesmo que fosse com a ajuda de uma estranha de jardineira xadrez e tênis coloridos.

— Bota ruim nisso... — Suspirou, física e mentalmente cansada. — Minhas amigas me deixaram sem carona e, para piorar, acabei dormindo na cadeira da rodoviária e perdi a merda do ônibus. Nada de novo sob o sol. — Ela gostava de falar pelo jeito. — Enfim, vou me sentar antes que eu durma em pé no meio do corredor. Desculpe mais uma vez pelo esbarrão.

Antes que eu pudesse fazer algo além de sorrir de canto, a garota que não devia ter muito mais de dezoito seguiu direto para o fim do vagão e usou o espaçoso assento do trem para cochilar. Resolvi me sentar também, já que estávamos prestes a sair da estação e me virei algumas vezes para trás durante a viagem.

Eu só conseguia ver os tênis coloridos de rosa, lilás e roxo para fora dos assentos e não consegui evitar a risada por isso. Ela já havia perdido o ônibus porque cochilou na rodoviária, como conseguia dormir no trem com tanta tranquilidade?

Voltei a olhar para frente e só desviei meus olhos para a garota no final do vagão quando paramos na estação de Ouro Preto. Dessa vez, porém, ela não dormiu demais como na rodoviária. A menina desembarcou antes de mim e ainda sumiu entre as pessoas que por ali transitavam antes que eu sequer pudesse lhe perguntar seu nome.

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