4 | Formatura

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O despertador tocou pela primeira vez as sete naquela manhã, meu corpo dolorido não me deixava levantar ou qualquer outra coisa.
Quando já estava quase na hora no almoço me senti aliviada para tomar um banho e comer algo, ainda pensando em como faria essas marcas sumir antes de hoje à noite.

Levantei com o corpo pesado, o espelho mostrava minha bochecha um pouco inchada e as marcas roxas pelas minhas coxas e braços.

Apesar de Alex repugnar meu pai e a presença dele, de alguma forma eu o amava. Eu sabia que se encontrasse ele pelo meio da casa escutaria algo como "Eu te amo", "Você está bem?", "Precisa de algo?"
Todas as vezes depois de me bater, todos os dias seguintes eu acordava com um presente, um pedido de desculpas por um ato repetitivo e sombrio, e por mais ingênuo que isso possa parecer, eu o perdoava. Porquê ele é meu pai, eu não posso odiar-lo.

Passei a mão por entre os seios, procurando alguma marca por lá e fui surpreendida com ele chamando meu nome.

— Querida, como você está? — Perguntou.
E sempre foi assim, isso não mudaria agora.

Fui clara ao responder, a voz calma, não mais a voz de choro de quando eu tinha treze anos. A situação se normalizou tanto que não fazia sentindo fazer birra agora.
— Estou bem, pai. Vou me trocar e já saio — Ele assentiu.

Peguei o telefone e disquei o número de Ayumi, Maya ela e eu havíamos combinado de se arrumar juntas antes da limousine chegar.

— Lissa! — Atendeu.

— Tudo certo pra hoje? — Perguntei, minimamente cansada agora.

— Sim! — Respondeu animada — Chego aí com May em quinze minutos.

— Certo. Não surtem quando chegarem aqui. — Falei antes de desligar.

— O que? Surtar por — Desliguei.

Fui até o closet separei o vestido e peguei uma das melhores bases dos meus itens de maquiagem, a base saint laurent. Eu raramente usava.
De acordo com as blogueiras que costumo acompanhar pelas redes sociais essa era a base do momento entre a sociedade multimilionária da América.

Vinte minutos depois, as garotas estavam no meu quarto chocadas com as marcas no meu corpo e de alguma forma eu tentava explicar sem que elas surtassem.

— Primeiro se acalmem e parem de achar que eu vou na polícia ou sei lá onde, meu pai me dá o dinheiro que eu preciso pra viver caso tenham se esquecido, fora que eu to acostumada, isso já aconteceu antes e já aconteceu com frequência, eu o amo mesmo tendo temperamento difícil — Comentei com pressa.

— E nunca pensou em nos falar? Eu sei que todo mundo tem problemas, Lissa, mas isso foge muito dos limites ético e jurídico, é crime. — Falou Maya, indignada.

— Vocês sabem quem são os advogados, sabem quem são os amigos do meu pai? Não tentem me dizer o que é lei ou não quando se trata dele.

— Você deveria pelo menos contar a psicóloga — Disse Ayumi.

— O que eu preciso é da ajuda de vocês para apagar essas manchas e depois, talvez um salão, se realmente gostam da minha amizade vão fugir desse assunto e me ajudar.

— Mas estamos tentando te ajudar... — Ayumi falou sentando ao meu lado.

— Exatamente, nós estamos tentando — Concordou May.

— Não quero que me ajudem com isso, apenas tratem de me deixar gostosa — Falei sorrindo.

[....]

As seis horas, nós estávamos prontas.

Sam não havia mandado sinal de vida, eu nem se quer sabia se ele estaria lá hoje. Perguntei aos garotos, mas não havia sinal dele em canto algum.

Me olhei no espelho do saguão, May e Ayumi estavam lindas, Dean e Alex ainda não tinham chegado e provavelmente encontraríamos com eles lá dentro. Olhei a minha volta, procurando algum sinal do meu namorado, ele não estava lá.

Maya estava deslumbrante no vestido azul, o decote realmente realçou seus seios e combinou com a cor clara da pele. Se eu não a conhecesse, diria que é da realeza.

Ayumi com sua seda sexy e ousada não parecia nada com a menina ingênua que eu conheci anos atrás, ela não tinha mais o rosto de quem não entendia nada do nosso país, ela agora parecia uma mulher com todas as promessas pagas a sociedade, alguém capaz de construir um império começando do zero.

Minha aparência por tanto já não era das melhores, apesar de conseguir cobrir com maquiagem oitenta por cento das marcas no corpo, minha bochecha desinchou e o vestido longo realçou a beleza fria que encontrava-se em mim. Os olhos verdes que puxei do meu pai destacavam-se com o vermelho em meus lábios, dando a sensação de que a garotinha de treze anos que apanhava, era agora independente e forte.

Não que seja mentira, ela ainda está lá, escondida, com medo de todas as frustrações e gritos que ouviu durante noites sombrias no escritório do pai. De alguma forma ela estava feliz por me ver desse jeito, e eu estava feliz por ela ter superado tudo.
A garotinha de treze anos não sumiu, mas me fez forte.

Caminhamos as três até o hall de entrada, as flores brancas e verde água decoravam a porta por onde passamos. Vi Hanna Scott olhando do palco para Maya, a raiva explodindo perante as expressões.

Procurei Sam entre os meninos, ele não estava lá, Dean por sua vez com a postura reta e o smoking preto encontrava-se entre os caras do time. De repente lembrei de onde conhecia aquele rosto, lembrei do cara da boate, eles eram iguais. Os cabelos escuros, preto por assim dizer, olhos azuis profundos demais para ser mentira, claro demais para não ser considerado um oceano, as expressões centradas e indistinguíveis. O cara da boate é a cópia do meu melhor amigo.

De repente senti minha visão turva, meu pai e Alex estavam na minha frente.

— Olá meninas — Cumprimentou ele.

Alex beijou minha testa, abraçou Ayumi e pegou a mão de Maya, apresentando-a a meu pai.

— Você está linda senhorita Storm, é um grande prazer conhecer a namorada do Alex, estou intrigado de como alguém como você iria se envolver com meu filho — Falou, ironizando ao fim da frase.

Ayumi estava colada em mim, sabendo o que meu pai havia feito comigo, Maya com um sorriso forçado se obrigou a dizer:

— Seu filho é muito especial pra mim, e obrigada pelo elogio senhor Ross, é bom conhecê-lo.

— Alex e eu já estamos indo. Vocês estão realmente lindas — Disse antes de sair.

Senti Alex pegar minha mão, um ato simbólico entre nós, passava confiança.

— Alissa Ross — Ouvi o diretor chamar meu nome.

As meninas sorriram e eu subi ao palco, Dean me olhando com orgulho quase me deixou corada.

Eu havia preparado um discurso pra hoje mas lembrei que ficou em casa, então teria que ser no improviso.

— Boa noite — Falei, o microfone alto demais — Hoje, depois dos melhores anos da minha vida, falo com convicção, obrigada! Por todos que estavam ao meu lado em cada momento, momentos que se fizeram únicos. Obrigada aos professores por me apoiarem tanto nos estudos, e não se esqueçam do diretor, o senhor Filips — Todos da plateia sorriram — ele é uma figura!Obrigada pelos excelentes anos e pelo apoio de todos. Vocês foram necessários para o meu futuro. — Terminei o discurso e peguei o diploma, um sorriso amarelo estampado no rosto.

Sam estava lá, me olhando de cima a baixo. Ele não estava sorrindo, e muito menos com orgulho.

— Samuel Chterpensque — Chamou o diretor.

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