Você é igual a minha namorada (II)

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Samantha estava um porre. A última vez que ela ficou assim foi quando a professora de Música disse que ela apenas decorava algumas notas do baixo. Hoje, quando me aproximei para lhe dar um selinho, quase senti a fumaça sair do seu nariz. E eu não entendi o porquê, não até ver seu olho fuzilar a irmã quando ela passou para dentro do refeitório.

– Emília – ela berrou, como se chamasse uma serviçal.

A menina olhou para os lados envergonhada e veio até a nossa mesa de braços cruzados.

– O que foi, Samantha?

– Por que você não avisou que a mamãe estava vindo passar o final de semana aqui? – disse indignada.

– Eu só soube ontem a noite. Ela disse que queria comemorar com a gente.

– Comemorar o que?

– Samantha, domingo será aniversário dela – revirou os olhos.

Ok, talvez Samantha seja uma péssima filha.

– Eu não quero que ela venha.

– É só um final de semana, Samantha, por Deus.

– Eu e a Andi estávamos planejando uma viagem – esbravejou irritada, o que fez Emília me olhar.

– Fala com a mamãe, então – Emília sorri descarada, causando em Samantha um efeito quase enlouquecedor.

Ela se levanta da cadeira com rapidez, avançando em direção a irmã, mas eu a seguro, e logo Clara aparece para me ajudar. Emília dá um passo para trás, mas ainda sustenta o sorriso vitorioso.

– Eu odeio você! Odeio! Queria que você tivesse morrido naquele parto!

– Samantha, chega! – Guto puxou a menina para si. No impulso, ele e Clara a tiraram do refeitório, passando no meio do alvoroço criado.

Olhei atordoada para Emília. O sorriso já não estava mais em seu rosto, ela parecia paralisada, até despertar de si. Balançou a cabeça friamente e foi se servir na cantina como se nada tivesse acontecido. Jana sentou perto de mim boquiaberta.

– Cara, as gêmeas são sinistras.

– É, elas são – falei, ainda observando Emília agora interagindo naturalmente com Sebas na fila.

Sinistras.

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– Vamos ter que cancelar a viagem – Samantha entrou com tudo no meu quarto, assustando não só a mim como a Jana.

– Boa noite para você também, Samantha – minha amiga sorriu, se arrumando na própria cama e colocando fones de ouvido.

– Boa noite! – se aproximou de mim, sentando ao meu lado na cama – Você viu o que ela fez? A Emília?

– Você disse que queria que ela tivesse morrido – engoli o seco.

– Eu não menti – encarou as unhas pintadas de marrom.

– Não acha que isso é pesado demais?

– Qual é? Virou jurídico dela? – cruzou os braços abaixo do peito.

– Eu só estou dizendo que é algo pesado de se dizer... Especialmente para a própria irmã.

– Eu nasci primeiro, sabia? Perfeitamente bem. Quando foi a Emília, faltou oxigênio ou sei lá o que, mas ela quase não respirou. Passou vários dias na UTI. Eu não preciso de hipocrisia, minha vida teria sido muito mais fácil se ela não tivesse nascido.

– Samantha, essa é a coisa mais egoísta que eu já ouvi sair da boca de alguém.

– Que merda está acontecendo com você? Você sempre me ouviu falar dela e agora fica defendendo.

– Nada, eu só... Quero te entender. Você é minha namorada e eu sei pouquíssimas coisas sobre você.

Não deixava de ser verdade.

– Ah, Andi, esse papo de novo? – revirou os olhos.

– O que aconteceu entre vocês, Samantha? – insisti, ela me olhou por alguns segundos, mas vacilou. Depois, jogou seu corpo sobre o meu e sorriu maliciosa.

– Você perde muito tempo com bobagem – e me puxou para um beijo. E eu aceitei, claro.


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Três dias depois, Emília me procurou. Eu estava na sala de música, ensaiando o solo da bateria quando ela chegou e coçou a garganta para eu notar a sua presença.

– Você toca bem – comentou ao chegar perto da bateria.

– Você nem imagina o quanto – sorri maliciosa e ela bufou.

– Ok, vou falar antes que eu me arrependa – bateu as unhas verdes no caderno lilás que tinha nos braços – A professora de biologia conversou comigo sobre a sua situação e ela disse que você precisa de uma ajuda especial.

– Também não é assim... – respondo ofendida.

– É assim sim, na última aula você respondeu que quem criou a teoria evolucionista foi Aristóteles.

– Cara, que diferença faz? É burrice mesmo assim...

– Senhor – resmungou.

– O que você veio me dizer, Lambertini?

– Alo, eu uso o Alo – reclamou.

– Claro que usa, Alo – corrigi cínica.

– Enfim, ela pediu para eu te ajudar. Disse que os outros meninos podem não ter paciência para ensinar o básico do básico – mordeu os lábios – e ela me avaliou muito bem na eleição de capitã, então não posso recusar.

– Então, você basicamente está me usando para fazer média com aquela... – me interrompe.

– Sim, e se você não tirar um oito, vai ficar muito feio para mim – me entregou duas folhas de papéis com uma tabela em cada – Por isso, aí está nosso plano de estudo. Vamos estudar todos os dias, das quatro às cinco, no meu quarto. Não gosto de atrasos, se você demorar mais de cinco minutos, irei fazer outra coisa e você fica sem a matéria.

– Eu tenho ensaio da banda na quinta, nesse horário.

– Metade da sua banda não já saiu do colégio?

– Sim? Mas a gente ensaia virtualmente...

– Que caos – ela balançou a cabeça – Bom, tenho certeza que eles vão entender, já perderam a Batalha das Bandas por causa da sua reprovação, não vão querer que fique mais um ano aqui.

– Tá, tá.

– Começamos amanhã, cunhada! – falou a última palavra em português e saiu.

A queda do céu é onde começamosSeparados por mil milhas e polosOnde os mundos colidem e dias são escuros

Skyfall - Adele

Ametista - EndiOnde histórias criam vida. Descubra agora