III.

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Meu coração estava acelerado. Era difícil dormir assim, sozinha, depois de toda a emoção que eu senti. Minha cabeça voltava e eu conseguia ouvir a voz com o sotaque carregado daquele homem no meu ouvido. O cheiro forte de álcool e a força que ele apertou meu pulso eram quase reais naquele momento. 

Eu de verdade não sabia para onde deveria ir, o que deveria fazer... Tinha tantos sonhos e planos que dependiam desse emprego. Dallas não era uma cidade exatamente pronta para o que eu tinha em mente, para o que eu sabia fazer e eu não poderia parar de trabalhar com as coisas da minha área. Lembrei dos anos de faculdade em que eu relutei muito pra tentar ser considerada pelo menos boa. Todos os trabalhos que eu me virei pra fazer e o meu sonho de ser redatora em uma agência na Europa. Trabalhar com o que eu amo pelo mundo.

Sentada na ponta daquela cama mexia o copo com uma pedra de gelo e ouvia o vidro estralar. Era um som bonito que combinava com o silêncio do quarto.

Na minha cabeça, pensamentos rondavam sobre minhas escolhas. Haviam tantas pessoas acima de tudo o que eu era capaz de fazer, por que eu não conseguia sonhar mais baixo e viver com o potencial da mediocridade que eu sabia ter? Ri pensando que nem sendo stripper eu seria boa, já que começaria a rir assim que tirasse a roupa. Garçonete eu provavelmente quebraria as garrafas e comeria os pedidos. Professora eu não teria um pingo de paciência.

Dei uma gargalhada alta, sincera e sem me importar com nada. Eu estava sozinha e livre ali. As lágrimas começaram a rolar e o riso cessou. Agora o choro era mais dolorido. De olhos fechados e com a cabeça baixa, ouvi a porta abrir e um corpo colidir com o meu.

— Você tá bem... — A voz de Milles era um sussurro e seu corpo me apertava mais forte. — Você. Você tá bem, amor. Você tá livre.

Ele beijou o topo da minha cabeça e me apertou com ainda mais força, como se fosse capaz de espremer toda a dor que eu sentia naquele momento. A ideia de Milles me botando num grande espremedor de frutas e me transformando num suco amargo e com uma cor feia me fez gargalhar. Ele se afastou sorrindo e me olhou.

Ah, ali estava... Aquele sorriso lindo que só Milles Verstappen tinha.

— Você já bebeu bastante, meu amor — Ele disse segurando o riso.
— Imaginei você me espremendo e me transformando em suco. — Disse tentando não rir.
— Um suco? Do que você seria, Hannah? — Ele disse tentando ficar sério.
— Da fruta mais gostosa que existir. — Me joguei pra trás caindo na cama.
— Você seria um suquinho de morango bem gostoso mesmo.
— Eu seria, e gostaria muito que você bebesse agora...
— Esse whisky pra ficar igual a você? — Ele disse me encarando.
— É, esse whisky... — Falei desapontada e fechei os olhos.

Minha cabeça girava e eu ouvia os passos do Milles pela casa. Me virei como se estivesse dormindo e acho que ele acreditou. Ele parou do lado da cama, senti seus olhos me encarando e o peso do seu corpo na cama. Era como se fosse o meu segurança.

— Acho que preciso de uns dias de férias... — Falei baixinho.
— Você precisa dormir mesmo — Ele disse antes de pousar um beijo no meu ombro.
— Sabe, Milles... Eu acho que isso precisava acontecer mesmo. E a culpa foi minha de prolongar e ser desse jeito. Eu poderia ter me planejado e...
— Hannah, nada nessa história é culpa sua. Você poderia sim ter saído antes mas provavelmente a reação do Sr. Alfredo seria ruim também. — Me virei e sentei pra olhar meu melhor amigo.
— Eu não sei fazer mais nada além de escrever, Milles. — Disse com um sorriso triste.
— Hannah, você é boa em tudo o que se propõe a fazer. Eu morro de inveja da sua coordenação motora, da sua dicção, da sua facilidade pra lidar com pessoas e de tudo o que você faz. Você é minha inspiração, Montoya!

Analisei sua expressão antes de fazer qualquer movimento. Não conseguia tirar os olhos da boca desenhada e bonita que Milles tinha.  Os olhos dele estavam escuros naquele momento e eu não sabia ler seus traços, nunca o vi daquela forma. Foram 10 segundos de energia e olhares que pareciam infinitos. Chegando a ser doloroso. Uma gargalhada surgiu de dentro da minha garganta e eu senti o alívio tomar todo o meu corpo.

Mistake | writervichOnde histórias criam vida. Descubra agora