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Capítulo 1 - Cháos

Nova York para New Hills, ESTADOS UNIDOS.

01 a 30 de dezembro de 2020

Como era insuportável,

Olhar para as ruas a qual correu com tanta euforia, buscando ser mais rápida que a mudança de cores dos sinaleiros, através da janela do hospital. Não podia evitar culpar o mundo por manter os carros agitados enquanto a prendia em uma cama, obrigando-a a se lembrar em cada segundo que passava, sobre que agora suas mãos eram inúteis.

Certo dia, tinha se achado tão grande quanto os prédios perdidos na neblina que cobria Nova York, devido ao clima frio de inverno. Talvez, tenha realmente sido. Agora, essa imagem de si mesma parecia uma miragem no horizonte.

Dos canais de televisão que costumava a aparecer, tornou-se apenas uma espectadora entre todas as pessoas que viviam na grande cidade. Diana observava a sua insignificância como nunca o fez. Odiava o cheiro de antisséptico, do som das rodas rolando pelo chão liso e do tilintar do metal na bandeja que as enfermeiras carregavam, porém, odiava muito mais a troca dos curativos que corriam desde entre seus dedos até os cotovelos.

Revelavam os pontos que selaram seus sonhos.

Não era capaz nem de lavar os próprios cabelos sem auxílio, mesmo tendo dado o seu máximo para alcançar toda a independência que pudesse. Ninguém a ensinara sobre como poderia se reerguer quando todas as coisas que planejara fossem por água abaixo, sobrando praticamente nada.

E quem, de toda a plateia que um dia a assistiu, foi até ela para vê-la?

Das diversas pessoas que esperou, nenhuma apareceu. Apesar de gostar de estar sozinha na presença da coisa que mais amava, sempre odiou a solidão e no momento em que mais precisou da companhia de alguém, não a teve.

A sua recuperação custou o fim do seu primeiro ano do ensino médio por completo. Diana acreditou que ainda que estivesse deixando o lugar o qual dedicou um longo período de sua vida e amou cada detalhe com todo seu coração, não haveria nada nele que fosse notar sua ausência.

Seus responsáveis, altamente ligados ao prejuízo causado à filha, tomaram como decisão sua emancipação, preparando um local confortável para ela morar fora de Nova York, longe da mídia e de problemas.

Sozinha.

Finalmente, ao receber a autorização médica para adentrar o avião, o fez com os próprios pés, já que não estava abdicando mais nada de toda forma. Depois de algumas horas cortando as nuvens no ar, percebeu o quão imenso era o oceano por baixo de si, repleto de ondas revoltadas. Quando desceu em New Hills, foi recebida por uma equipe contratada por James, homem que um dia chamou de pai.

Foi levada cuidadosamente até a casa a qual moraria pelos próximos anos. Após passar pelos portões vitorianos da entrada, o carro percorreu uma longa estrada entre o jardim até chegar, enfim, na estrutura moderna, com paredes em cimento queimado e vitrais pretos.

— Seja bem-vinda, Diana. — Uma mulher, por volta de seus 45 anos, disse assim que a notou descendo do veículo. — Meu nome é Anne. Pode contar comigo para o que precisar.

Seus olhos azulados eram tão brilhantes, que a mais nova não pode não os invejar, embora fossem de tons idênticos aos dela. Os cabelos loiros da sua ajudante estavam perfeitamente presos. É claro que Diana sabia que aquela que a recebeu aguardava ansiosamente por uma resposta, mas infelizmente, a deixou incorrespondida.

Não importava para onde fosse, nunca mais se sentiria em casa. Em seguida, deixou com que os outros funcionários guiassem sua mala até o interior, tirando os sapatos antes de subir os pequenos degraus da sala, arrepiando ao toque frio de seus pés com o chão de mármore branco.

O cheiro de café fez seu estômago ficar enjoado.

— Quando fizer café, Anne... — Virou a cabeça levianamente sob o ombro, avisando para a figura feminina que a seguiu. -- Abra as portas e as janelas para não deixar o cheiro abafar a casa.

— Como quiser.

A adolescente subiu as escadas que a guiavam em direção aos quartos. Logo no segundo andar, pôde ver pelos vidros que davam visão ao mar mais à frente, como a chuva tomou conta do pequeno município. Dessa vez, não se deu o trabalho de ficar admirando, indo direto para a cama e se entregando ao sono.

Se não obrigasse a si mesma a comer, possivelmente fosse apenas dormir, pulando até mesmo etapas de sua higiene básica. Sentia-se exausta demais para isso. Seu corpo era inútil para merecer atenção e cuidados, na sua cabeça.

No entanto, diariamente, Anne preparou pratos diferentes e a incentivou a se levantar. O fez insistentemente, independentemente do quão raro era conseguir reações advindas da garota.

Como Diana fazia fisioterapia em casa, não saía daquele pequeno cômodo. Também sentia quase nenhuma vontade de se aventurar entre as construções de tijolo feitas sob as colinas, as quais coloriam todo o local. Musgos se esgueiravam pelos muros e as ruas de pedras, traziam similaridade aos levantamentos feitos na Itália.

A sensação de vazio impregnava nas paredes de seu ser e putrificavam sua alma, de forma a esvair qualquer resquício de vida do seu âmago. Toda sua beleza, reforçada pelos traços delicados de seu rosto, os tons que se combinavam, foram encapuzados por um período de melancolia intensa.

Era comum escutar pela soleira da porta, a qual se esgueirava em dias levemente alegres, conversas sobre sua desistência e como tinha se entregado para o que chamavam de depressão. Às vezes essas palavras eram mais altas que os murmúrios dos resquícios de si, que diziam incessantemente:

"Eu ainda estou viva. Eu vou sair daqui."

Vez e outra, numa tarde de segunda feira, tentava passear pela faixa de areia estendida para além de sua casa, onde o mar encontrava a terra. Vez e outra, numa tarde de sexta feira, a sua cama abrigava seu corpo para até o anoitecer do dia seguinte.

Os primeiros dias da semana ganharam uma rotina mais comum, enquanto as de sexta, foram virando hábitos ruins agarrados aos seus calcanhares, que os chutavam para longe de si.

E aqueles murmúrios se tornaram cada vez mais altos.

"Eu ainda estou viva. Eu vou sair daqui."

BAD GIRLS like GOOD BOYSOnde histórias criam vida. Descubra agora