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NATASHA ROMANOFF

Parada no corredor, encaro a parede dos chapéus que meu pai costumava usar quando ia cuidar das terras, e que depois foram usados pela minha mãe. É como se fosse uma coroa da nossa família, nós nunca falamos quem herdaria, porque jamais imaginaríamos que seria cedo demais. Muito menos que seria eu, aos vinte e dois anos, que se tornaria a responsável por minha irmã caçula de dezessete, pela nossa floricultura e pelo rancho, porque estou órfã e isso me fere profundamente.

Logo que enterrei minha mãe, me disseram que o luto é inevitável quando se ama muito alguém. É a frustração de ter o afeto interrompido misturado com nostalgia e saudades, e que até ameniza com o tempo, mas nunca deixará de sentir, porque o sofrimento faz parte de amá-la intensamente e acredito que seja a mais pura verdade, principalmente quando se vai de forma revoltante e dolorosa, como foi o caso dela.

Pôr esses chapéus significa muito, ao menos para mim, sempre encarei que quem o coloca na cabeça é o provedor da casa, o responsável supremo da nossa família, que mantém tudo de pé funcionando. Talvez seja a sensação que meus falecidos pais me causavam ao vê-los usando enquanto cuidavam das nossas plantações de flores, para se proteger do sol forte que faz pelas bandas de cá até hoje.

Apesar de agora ocupar esse papel, mais cedo do que gostaria, não sei se sou digna de usá-lo. Perder minha mãe poucos anos após meu pai é um baque que eu ainda não assimilei e acho não nunca irei, até porque tem apenas um mês desde a sua partida. Agora somos eu e minhas irmãs, umas pelas outras como sempre fomos, mas de uma forma diferente.

Prefiro acreditar que esse mundo já não andava bom o suficiente para pessoas boas como eles, assim dói menos.

Geralmente minha vida não costuma ser melancólica dessa forma, pelo contrário, éramos uma família feliz, companheira e afetuosa; não que ainda não sejamos, mas não é como antes, porque sempre terá a sensação de falta, de que está sobrando espaço.

Agora não sou a que recebe colo, e sim a que oferece, e o peso das incertezas me apavora ao pensar em não conseguir dar conta das coisas como eles conseguiam.

Com Carol oficialmente fora de casa, que espero que não volte tão cedo, já que isso significaria que sua tentativa de "felizes para sempre" falhou, me torno a escolhida para ocupar esse espaço agora vago, e continuar a fazer o que fiz durante os longos e cansativos meses, ou seja, dar continuidade aos negócios da família, mas com a responsabilidade e a consciência de que não é passageiro e que nem terei a sensação de estar à espera de uma volta que não acontecerá, apesar de ainda ter expectativa de que ela pode chegar a qualquer momento, mesmo sendo impossível.

Papai sempre me dizia que, apesar de todas nós mexermos com as plantas, era a mim que via à frente de tudo e quero honrá-lo, assim como mamãe, que praticamente deu a vida para isso.

Tem poucos dias que Carol, minha irmã mais velha, escutou seu coração e os meus conselhos e foi embora em busca da sua felicidade após uma cena digna de novela de reconciliação com seu noivo. Já sinto sua falta, mesmo sabendo que ela ter ido foi a melhor escolha que fez para si mesma, e sei que está sendo bem cuidada nesses momentos difíceis.

Já me sentia doente só em perceber seu jeito cabisbaixo pelos cantos, apenas chorando sem encarar ninguém, com vergonha de algo que sequer foi culpa sua.

Nada me deixa com a consciência mais em paz do que saber que ao menos uma de nós poderá ter dias amenos após tanta tragédia, e minha irmã merece e precisa muito desse cuidado. Se me sinto perdida e destruída com as perdas recentes, imagina ela, que tomou dois baques de uma só vez.

We farmer's arms | romanogersOnde histórias criam vida. Descubra agora