Enchi mais uma vez a taça com o vinho tinto que ela tanto gostava e dei um gole generoso; porém, o sabor adocicado não me agradava tanto.
Andei a passos largos até o quarto e deixei a taça em cima da cômoda. Se Sakura estivesse aqui, me bateria por causa disso. Ela ficava irada com as marcas de copo na madeira escura, e eu achava aquilo uma grande besteira, porém era fofo o bico que ela fazia, retorcendo os lábios, quando estava brava.
Tantos detalhes que parecem sem importância na hora que acontecem, mas quando tudo se acaba, eram neles em que pensávamos.
Essas pequenas coisas eram as mais dolorosas de se lembrar depois de perder alguém, pois, na verdade, eram elas a essência de um relacionamento. O que fazia aquela pessoa única e especial.
Peguei o vestido verde-musgo do guarda-roupa e cheirei, tinha o aroma de amaciante, e não do perfume dela; frustrado, dobrei ele de qualquer jeito antes de colocar na caixa de papelão.
Fui tirando peça por peça do armário, reparando nas roupas separadas por cor, era uma mania irritante dela, que agora eu sentia falta. Fechei a caixa cheia, dei mais um gole no vinho e passei para a próxima. Amanhã de manhã, antes de ir para o trabalho, levaria elas para a casa da mãe de Sakura.
Depois de terminar de empacotar todas as coisas dela do quarto, era a vez do banheiro da suíte, cheio de produtos de beleza que ela nunca precisou. Esvaziei as gavetas com suas maquiagens e tirei todos os produtos de cima da pia, colocando tudo em uma caixa pequena.
Peguei o perfume favorito de Sakura e levei ao nariz, a saudade que eu sinto do cheiro dela diariamente era insuportável. Abri o frasco e borrifei no ar aquele aroma de flores com alguma coisa cítrica, respirei fundo e fechei os olhos.
Eu podia imaginar ela aqui, nossos corpos se tocando, minhas mãos passeando por sua pele macia, distribuindo beijos em seu pescoço e colo, esfregando o nariz e sentindo aquele cheiro do perfume misturado ao cheiro único dela. Apertei com força o frasco na mão sentindo uma mistura de sentimentos, raiva, amor, tristeza, culpa, desejo, saudades.
Coloquei o perfume dela no lugar, decidido a ficar com ele, seria uma tortura, mas eu ainda não estava pronto para me despedir do aroma dela.
Fechei as abas do papelão e coloquei a caixa debaixo do braço. Quando passei pelo quarto peguei a taça de vinho vazia, larguei a caixa junto com as outras na sala e fui para a cozinha.
Deixei o cálice na pia, peguei a embalagem da pizza vazia na mesa e joguei na lixeira da cozinha. Estava cheia e a lembrança de Sakura reclamando disso veio fresca na minha mente, ordenando que eu colocasse o lixo para fora, e que já tinha falado isso uma centena de vezes. Ela sempre teve esse jeito imperativo, desde a faculdade, mesmo sendo senpai dela, a garota sempre retrucava minhas falas e me corrigia na frente de qualquer um. Mandava e desmandava em todos os veteranos e os calouros tinham medo dela.
Demorei para me apaixonar por ela. No começo, achava Sakura insuportável, até começar a perceber todos os seus encantos. Em como ela estava sempre disposta a ajudar os outros, mesmo não conhecendo a pessoa; na risada gostosa e convidativa, que te fazia rir junto com ela; em como se esforçava até o limite em qualquer tarefa. Sakura tinha uma memória excepcional e qualquer coisa que você perguntasse para ela, sobre o que já tínhamos estudado na faculdade, a garota sabia responder tudo de prontidão.
Descobri que ela era extremamente tímida quando se tratava de romance depois que a chamei para sair. A garota corou dos pés à cabeça e ficou extremamente nervosa com o nosso primeiro encontro. Até que ela relaxou e voltou a ser a Sakura de antes, porém mais carinhosa e apaixonada. Também me fez entender todas as suas fragilidades e medos, além de conhecer suas inúmeras qualidades, defeitos e sonhos. Sakura deixou que eu a visse inteira, plena e vívida, e eu retribuí.
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Pra te fazer lembrar de mim
FanfictionTantos detalhes que parecem sem importância na hora que acontecem, mas quando tudo se acaba, eram neles em que pensávamos. Essas pequenas coisas eram as mais dolorosas de se lembrar depois de perder alguém, pois, na verdade, eram elas a essência de...