Num belo dia ensolarado em Paris, a cidade da luz, o cenário era simplesmente deslumbrante. Deitado confortavelmente na mesa da sacada, o aconchego do momento se fundia com a magnífica paisagem que se desdobrava à minha frente. Que belo dia para não fazer nada, Sophia corre pela casa brincando com seu novo amigo Oliver, o cão. Suas risadinhas ecoam pela casa junto com os latidos estridentes de Oliver, que dizem ser um border collie. É uma tarde de sábado, as crianças brincam e se divertem na rua mas Sophia não, prefere ficar o dia todo em casa com esse maldito cão bobo, ela já está crescida foram longos sete anos ao seu lado, lembro como se fosse ontem Benjamim seu pai me encontrara em um bosque, não me lembro da minha antiga família ou se eu já tive um lugar para chamar de meu, diante disto, conheci meu novo lar, um apartamento no centro de Paris, ao entrarmos lembro-me de ver Eva pela primeira vez, ela tinha um sorriso acolhedor, ao olhar em seus olhos senti meu pequeno coração bater forte, fixando seu olhar penetrante em Benjamim, Eva indagou com curiosidade de onde ele tirou aquele gato. Com serenidade, Benjamim lhe respondeu, explicando que não pôde simplesmente abandonar o pobre felino desamparado no jardim da Torre Eiffel. Naquele instante, uma calidez peculiar envolveu-me, uma sensação inconfundível de pertencimento e aceitação, como se naquele breve diálogo eu tivesse encontrado o meu verdadeiro lar.
Não demorou muito para que Sophia surgisse; no início, tudo era sereno e tranquilo, mas logo ela trouxe consigo um adorável cão, Oliver. Embora tenha interrompido a paz que reinava, confesso que até gosto dele. Afinal, ele me proporciona um pouco de tranquilidade, permitindo-me passar o dia todo na minha janela observando o movimento ao redor. Ao cair da noite, chega o momento em que saio de casa. Tive um descanso bastante agradável hoje; logo, só retornarei na manhã seguinte.
A noite cai e começo minha jornada, visito sempre os mesmos lugares marcando meu território e protegendo minha família. O primeiro lugar que passo é a imponente Torre Eiffel, minha jornada começa na base, onde os turistas se reúnem para admirar a grandiosidade dessa estrutura icônica. Começo a explorar os jardins bem cuidados, deslizando por entre as pernas das estátuas decorativas que adornam os arredores. Volto para casa e percebo que logo amanhecerá. Agradeço por Sophia já ter partido para a escola. Tiro uma bela soneca e quando me dou conta já está na metade da tarde. Benjamin está trabalhando e Sophia está estudando, as vezes me pergunto para onde levaram Eva, não pude ver o que fizeram com ela quando a colocaram em uma caixa grande com roupas brancas, ainda posso sentir a tristeza de vê-la assim, não sei o porquê mas sinto que nunca a verei novamente, Sophia era somente uma garotinha mas pude ver a tristeza e melancolia em seu olhar, pobre de minha garotinha. Toda a família se reuniu naquele dia, todos choraram e tomaram chá menos Sophia, ela olhava fixamente para sua mãe enquanto deslizava sua mão em meu pelo, Benjamin chorava e perguntava aos céus como iria cuidar de uma garotinha sozinho. Quando senti a primeira gota cair em meu pelo minha única reação foi olhar para cima e lá estava ela, Sophia havia derramado sua única lágrima, nunca me esquecerei daquele fatídico dia.
Mais uma noite cai, minha rotina noturna se inicia, hora de explorar, marcar território e arranhar alguns turistas. Vou então até o jardim da torre, algo não me parece certo no dia de hoje, uma estranha brisa traz consigo um odor diferente. No ar, flutua uma fragrância irresistível, doce e cítrica ao mesmo tempo. É como se um buquê de frutas maduras e suculentas tivesse se misturado delicadamente com a doçura encorpada de flores frescas. Decido investigar, ando pelo campo em direção a essa coisa; nunca passei por esses lugares. Estou no Bosque de Bolonha; este bosque não pertence ao meu território. Não quero problemas, mas estou tão perto. Entro cada vez mais a fundo no bosque. Ao entrar, sinto uma nostalgia como se conhecesse esse bosque há décadas. Ao me aprofundar cada vez mais no bosque, sinto um frio que me faz arrepiar todos os meus pelos. Vejo uma árvore gigantesca; suas raízes são maiores que as dos humanos. Sinto que não deveria estar ali. Mesmo com algo me dizendo para ir embora, decido ficar. Ouço um galho se quebrar e vejo sair um ser metade mulher e metade cabra que caminha sobre duas longas patas. Corro para trás e me escondo em uma moita de galhos secos.
Esta misteriosa criatura não está me seguindo; nem mesmo parece me notar. Penso em sair dali o mais rápido possível, mas sinto uma curiosidade gigantesca me cercar. Porém, prezo pela minha vida; tento sair dali sem ser notado, fazendo quase nenhum barulho. A cada passo que dou, sinto que ela vai me ouvir e me devorar. Sem prestar muita atenção, acabo quebrando um galho. Ela gira suas orelhas em direção à moita onde me escondo.
- Será que ela me ouviu?
Me pergunto, mas antes mesmo de obter resposta, ela salta da raiz e pula em direção a um buraco vermelho. Eu nunca tinha visto aquilo antes; não sei o que é, mas definitivamente não é uma humana nem um animal. Corro dali o quanto antes, passo por umas flores que têm um cheiro nostálgico que me deixa imóvel por um tempo. Esse cheiro...
- Era o primeiro cheiro de Benjamim?
- Não, era o cheiro de quando eu era um filhote.
- Então foi aqui que ele me encontrou?
Volto para casa cheio de lembranças vagas e confusas, dúvidas incessantes e uma confusão em minha cabeça. Não consigo parar de pensar em coisas do tipo:
- Por que aquela brisa me levou até o bosque?
- O que era aquele ser?
- Para onde ia aquele buraco?
- Por que eu senti meu cheiro nas flores?
Esses pensamentos não saem da minha cabeça; decido voltar para casa. Chego e vejo Sophia na janela. Ela e seu pai parecem animados; acho que é alguma comemoração humana. Fogos iluminam o céu; está nevando lá fora. As luzes brilham como vagalumes; acho que é o Natal. Vou dormir; afinal, essa madrugada foi uma das mais estranhas das minhas sete vidas.
Sinto uma imensa gratidão por vocês lerem esse capítulo, espero que tenham gostado da forma como escrevo, dos minuciosos detalhes e do mistério que prometo desenvolver bem. Peço que votem e comentem o que acham que irá acontecer no segundo capítulo.
<3

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Arlequim
FantasíaA jornada de um gato a procura de sua amada. Ao longo dessa jornada o gato Arlequim irá fazer amigos novos e descobrir coisas sobre seu passado, irá descobrir que a vida não é só onde estamos, mas também para onde vamos.