Família e seus medos

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Santana ficou da janela de seu quarto tentando decifrar todos os movimentos, através de sombras, o que realmente estava acontecendo na casa vizinha. Em vão. Ela via figuras paradas, depois indo de um cômodo ao outro e depois, paradas em pé mais uma vez. Era angustiante. A mãe de Brittany até então, sempre a tratava bem quando via a garota, e já a elogiou por ensinar Brittany matemática e espanhol. Então, por que será que ela nem um "oi" por educação, falou?!.
Com o celular em mãos, discou o número de Brittany, mas caiu direto na caixa postal. E de novo, e de novo. Porra, não era possível.

O número chamado encontra-se desligado ou fora da área de cobertura ...

As batidas de seu coração ficaram mais intensas quando as luzes se apagaram. Era só o que faltava. Nenhum movimento. Nada vinha do outro lado. Nada. O tempo pareceu até mais frio, mesmo com o calor que havia feio.

(...)

- Mãe... - Brittany dizia as palavras com o coração choroso. Nunca havia visto sua mãe tão transtornada daquela forma. A maneira como ela lhe olhava, era como se fosse repugnante, um ser desprezível, olhar que filho nenhum deve receber daquele que diz amar incondicionalmente. Seus olhos azuis, se enchiam de lágrimas vendo a mãe ir de um cômodo ao outro com fúria.

- Eu não acredito Brittany, sinceramente, logo você, uma boa menina fazendo essa sem vergonhice. Aonde foi que eu errei, diz pra mim. Por que, Brittany?

- Mãe... - As palavras morriam antes mesmo de chegar em sua boca. O que iria dizer para mudar aquele cenário? Poderia dizer algo? Existia ao menos, algo para se dizer?.

- Eu já sei de tudo. TUDO. Já sei dessa safadeza que você está fazendo com essa garota. - Dona Amélia sentia o sangue ferver em suas veias. Como a sua garotinha, única filha, estava beijando outra garota? Isso só podia ser um pesadelo. O que ela fez para merecer isso? Sempre foi uma boa mãe, deu do bom e do melhor a Brittany, nunca deixou faltar nada. Aquilo só podia ser safadeza, má influência, encosto, qualquer coisa. - Eu sabia que tinha algo errado nessa amizade de vocês. Sabia. Coração de mãe não se engana. - Passou a mão em seu rosto, ainda desacreditada - Eu sabia, sabia... Essa coisa de ficar pegando na mão o tempo todo, abraçando, grudada nessa menina... O que deu nessa sua cabeça, Brittany?

- Mãe, eu gosto da Santana... deixa eu... - Brittany sentiu os dedos da mãe marcarem seu braço branco quando ela o segurou, sacundindo-a, para frente e para trás, furiosa.

- Não fala uma merda dessas. Não fala. Você não gosta de ninguém. Meu Deus, não é possível. É castigo, só pode ser, castigo comigo. Que pecado cometi para ter que passar por isso. - Os olhos azuis, encaravam incrédulos a mulher mais velha a sua frente. Como sua mãe poderia achar que isso era sobre ela, e não sobre o sentimento que existia entre as duas jovens? Não tinha nada a ver com a mãe e sim com a jovem Pierce.

- Para com isso, por favor. - Brittany ouviu a porta da sala se abrir, junto dela, veio a voz do pai, informando que havia chegado, como faz todas as vezes ao chegar do trabalho. Seu coração se encheu ainda mais de desespero. Não sabia qual seria a reação do pai. A incógnita estava formada.

- Marido - Gritou Amélia - Charlie, vem aqui, pelo amor de Deus.

- O que aconteceu, Amy? - Os passos do senhor de meia idade se tornaram mais rápidos ao quarto da filha. O que será que poderia ter acontecido?

- Sua filha. Sua filha, essa sem vergonha. - Charlie chegou perto de Brittany que estava amoada sentada na cama nesse momento, com os braços vermelho em volta da cintura. Seus olhos em um tom triste, as bochechas rosadas demais, denunciando o choro. - Eu tenho até vergonha de dizer. Sinceramente, que vergonha eu tenho.

- Tany... - O apelido que apenas Charlie chamava a filha, faz a garota soltar um suspiro, um fio de felicidade. Ela amava quando seu pai a chamava assim. Amava. - Me conta, o que está acontecendo?

- Essa garota...

- Amélia, por favor, deixa ela falar. Por favor. - O silêncio se instalou por segundos, pela primeira vez.

- Pai, eu... - As lágrimas voltaram a descer pelos seus olhos, rolando bochecha abaixo - Eu gosto... - Mais uma vez as palavras morriam. Tinha medo de contar, medo de perder seu lugar de proteção. Olhou dentro dos olhos do pai, buscando coragem e então, se lembrou dos olhos de Santana. Os olhos castanhos sempre davam força, era seu porto seguro. Tudo parecia melhor ao olhar aqueles olhos lindos, e quente. - Eu amo a Santana. Estou apaixonada por uma garota.

Charlie não sabia como reagir, enquanto Amélia chorava e sentia raiva, proferindo coisas absurdas a serem ouvidas. A questão, é que sua filha, sua Tany, estava apaixonada por uma garota. Qual seria seu posicionamento como pai?. Justo ele que sempre quis esse título, ser pai. Lembrou-se da gravidez e de quando Brittany nasceu, a alegria que sentiu ao segurá-la pela primeira vez, nossa, nunca será possível descrever. Achou que estivesse preparado pra tudo, já havia passado por fraldas sujas, choros de madrugada, idas ao hospital, remédios, vacinas, tudo o que uma criança traz consigo na bagagem de ser criança e seus cuidados. Até o primeiro beijo, Charlie passou com êxito, mesmo morrendo de ciúmes. Mas agora, sua filha estava no auge da adolescência, apaixonada por uma garota. Preparou-se para um genro e recebeu, uma nora?. Isso era difícil de lidar.
Tentou puxar o ar e manter-se sã, para não magoar a filha mais do que ela aparentava estar. Não sabia como agir ou o que dizer, porém, precisava ser o que sempre foi. Precisava ser o pai de Brittany.
Levantou-se da cama, ajeitando sua calça social no corpo, ainda abalado com tal confissão feita.

- Filha, eu agora não sei o que dizer.

- Como não sabe, Charlie ela é sapatão.

- Pelo amor de Deus, Amélia. O que você quer que eu faça? Ponha minha filha na rua? Dê uma surra de cinto? Tranque ela no quarto. O quê? Me diz. - Seu tom de voz se elevou - Ela é minha única filha e dependendo do que fizermos, vamos perdê-la, talvez para sempre.

- Eu não quero uma filha sapatão, Charlie.

- Então vai virar as costas pra sua única filha? É isso? Vai virar as costas para a filha que você diz amar.

- E você vai apoiar essa sem vergonhice? É isso o que vai fazer?

- Eu não quero perder a minha FILHA. - Brittany não queria ver os pais brigando. Era a primeira vez que ambos se comportavam assim. Nunca, nunca em toda sua vida viu os dois levantarem a voz uma para o outro e agora, estavam brigando pelas escolhas que ela própria fez.

- PAREM DE GRITAR VOCÊS DOIS. Por favor. - Sua voz saia embargada de choro - Eu não quero vocês brigando. - Os dois a olharam - Mãe, para de me chamar dessas coisas, por favor. Isso não vai mudar nada, só está me machucando. E não briga com meu pai. Chega. Por favor. - O choro soluçado foi presente nas três figuras que preenchiam o quarto. Charlie a abraçou forte, e Brittany pode sentir as batidas de seu coração.

- Vamos para a cama, Amélia. Vamos... vamos dormir. Amanhã é outro dia e conversaremos melhor. - Seus lábios foram em direção aos fios loiros, dando um beijo. - Hoje ninguém aqui está com cabeça para nada.

- Brittany - A voz dura de sua mãe, fez Brittany tremer o corpo, ainda no abraço de seu pai - Essa conversa ainda não acabou. - Suspirou - Pegue seu gato e fique com ele aqui no quarto. Ele anda pegando as bitucas de cigarro do seu pai e derrubando o cinzeiro com isso. - A garota então notou Lord Tubbington passando pela perna da mãe, indo em direção a perna do pai.

- Até amanhã Tany... - Seus pais saíram desligando a luz, deixando-a no breu de seus pensamentos. Seu pai falar o apelido antes de sair, poderia significar algo bom. Essa era a esperança. Seu corpo deitou sobre a cama, com a roupa que havia chegado da festa, encolhido. Deixou-se chorar. O medo de seus pais se  afastarem, de afastarem Santana, de tudo virar de ponta cabeça crescia a cada minuto que o ponteiro do relógio marcava. Seu coração batia de forma doída no peito. Ela não queria nunca se afastar de Santana. Nunca. Isso não poderia nem ser cogitado. Santana era o amor da sua vida, sua primeira garota e única. Não poderia perder aqueles olhos castanhos. Nem que fosse preciso fugir dali, isso, ela fugiria pra onde fosse, só para não ficar sem Santana.

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