Capítulo único

13 5 1
                                    

"Ultimamente eu tô escutando esse som aonde quer que eu vá, como um 'tick, tick tick...', como uma bomba relógio de um filme cafona de segunda ou de um desenho animado antigo, o pavio foi aceso, o ponteiro marca cada segundo enquanto o pavio queima, e queima, e queima, até que, de uma vez..."

— tick, tick... BOOM!


Peter 3 está fazendo 28 anos.

Talvez essa tenha sido a festa mais animada e mais desanimada desde sua maioridade.

Não entenda errado, ele não poderia ser mais grato pela presença da tia May e dos amigos que fez nos últimos anos de faculdade, mas não pôde evitar que sua mente desassociasse para outros lugares.

Em que momento deixou que sua vida como Peter Parker se tornasse a secundária?

Olhando para o bolo — com um desenho do Pica-Pau dizendo "minha nossa nossa nossa!", longa história —, para os presentes coloridos, para aquelas garrafas de bebida que seus amigos levaram escondidas, todo barulho alto demais e as luzes brilhantes demais, ele se sentia assistindo a vida de outro, como se fosse intruso na própria narrativa.

Talvez fosse a ausência de algumas das pessoas que o fizeram ser quem é hoje; seus pais, tio Ben, Harry...

Gwen.

Quão patético era de sua parte, uma década depois e não se deu o luxo de superar as perdas. Ainda olhava toda a noite para as imagens em seu celular como se fossem seu bem mais precioso, apenas traços de momentos que sabia que se perderam com o tempo e se apagavam cada vez mais da sua memória, não mais pareciam recentes, não mais soavam realistas.

E quando seu apartamento se esvaziou, no meio da madrugada, e o que o sobrou foram apenas os últimos pedaços de bolo e meia garrafa de Coca-Cola, Peter se deu ao luxo de procurar nos armários mais duas velas novas para acender.

Em tal escuridão, as chamas eram belíssimas.

Peter se permitiu fingir que seus sentimentos ruins viriam a ser como elas: fortes mas passageiras.

— Feliz aniversário, Peter um e Peter dois — ele sussurra ao assoprar as velas.

A noite ainda não estava no fim, e em meio à sua patrulha da madrugada, sentindo o vento leve do verão nova-iorquino ao pegar velocidade em suas teias, ele sentiu que talvez um dia viria a encontrar um lugar em sua própria vida novamente.

[...]

Peter 2 está fazendo 41 anos.

É passando por cima do fluxo incessante de pessoas na Times Square e olhando para uma grande tela iluminada com a data e hora do dia que ele se lembra.

Dez de agosto, seu aniversário.

Quando você chega no lado ruim dos trinta, a data deixa de ser tão memorável, mas o costume sempre faz algo aquecer seu coração ao ver o dia chegar no calendário.

— Homem-Aranha! É o Homem-Aranha! — gritou uma criança, animada, chamando a atenção de sua mãe ao apontar para a pensativa figura em elastano que descansava na ponta de um prédio.

O garoto acenou para ele, e ficou eufórico quando o herói acenou de volta.

Em breve faria um ano desde os acontecimentos mais loucos de sua vida. Mais de vinte anos como Homem-Aranha não o prepararam para viagens multiversais, mas cá estava ele, ainda com as costas doloridas por conta da facada que recebera do Duende Verde na estátua da Liberdade.

Contagem regressivaOnde histórias criam vida. Descubra agora