Aware

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Anitta's POV

Aware (adj.): o gosto agridoce de um momento transcendente.

Sob meus pés, o atrito das rodas do carro com o chão, fazia com que eu sentisse levemente a vibração ressonando pelos saltos de meu sapato, atingindo meus pés quase imperceptivelmente. Meus sentidos nervosos e aguçados ativaram tal sensibilidade em meu corpo que eu podia sentir as pequenas dobras do volante do meu carro, encaixarem-se nas minhas digitais.

A via interestadual 90 (I-90) permitia a velocidade mínima de 110 km/h longe de perímetros urbanos e àquela altura, com o velocímetro do carro marcando 140 km/h a pelo menos trinta minutos desde que eu e Manu saíramos de Boston em direção à pequena cidade de Southampton, eu já tinha certeza que pelo menos cinco multas por excesso de velocidade estariam na mesa do meu escritório na semana seguinte.

- Se você continuar indo a essa velocidade, vamos chegar em Southampton ainda para o café da manhã. – Manu falou, tirando a perna esquerda de baixo da coxa direita, colocando os dois pés, apoiados no painel do carro. – E pelo que eu me lembre, fomos convidadas para o almoço, maninha.

"Once upon a time, I was falling in love, but now, I'm only falling apart'', a música soava alta nos alto falantes do carro, do jeito que Manu gostava de ouvir.

"E agora eu estou apenas caindo aos pedaços", repeti mentalmente o que a voz feminina cantava e aquilo incomodou-me de uma maneira muito pessoal, a tal ponto que pisei ainda mais no acelerador do carro.

- Por que não troca de música? – Perguntei com calma aparente para Manu.

Minha irmã, que apontava o celular para a estrada, fazendo um vídeo para algum dos aplicativos que costumava usar, desviou os olhos para mim e pausou o vídeo sem ao menos olhar para a tela.

"There's nothing I can do, a total eclipse of the heart", a voz feminina continuava soando alta e dramática pelos alto falantes do carro e foi quase irônico o quanto aquela tonalidade em sua voz poderia exprimir tudo o que eu sentia, mas jamais seria capaz de expressar por mim mesma.

- Eu tenho uma proposta melhor. – Ela falou, sentando-se normalmente pela primeira vez desde que havíamos saído de Boston, enfraquecendo o volume da música, com o controle do som. – Você para de pisar nesse acelerador como uma louca, conversa comigo sobre o que aconteceu no Boston Common ainda agora e eu prometo que a gente pode colocar aqueles jazz de trezentos anos antes de Cristo que você gosta de ouvir.

Dei um sorriso involuntário que poucas pessoas no mundo além de Manu conseguiam arrancar de mim, ao perceber a preocupação de minha irmã com a velocidade do carro e com os meus sentimentos, que ela havia percebido terem sido abalados de alguma forma, muito embora eu fosse boa em omitir substancialmente minhas emoções.

Perguntei-me o que teria me denunciado... O excesso de velocidade? A pressa em sair do Boston Common e ir antes da hora combinada com Manu para Southampton? Minha expressão me denunciara em algum momento? A conexão sanguínea com minha irmã a fizera sentir meu desconforto?

- O que acha? – Manu insistiu, mostrando-me que estava com o dedo no botão de desligar, do som.

Desacelerei o carro gradativamente e aliviei a força com a qual apertava o volante.

- Na verdade, o jazz surgiu no século XX depois de Cristo, em New Orleans, entre os anos de 1910 e 1915, quando foi oficialmente considerado como ritmo musical. No ano 300 antes de Cristo, a humanidade havia pouco saíra dos domínios de Alexandre, O grande, que havia morrido 23 anos antes e escutavam...

- Anitta!!!!! – Minha irmã exclamou, olhando-me com um misto de choque e incompreensão. – Esse não é o tipo de informação necessária. – Manu desligou de vez o som, deixando o carro em completo silêncio, afinal. – As vezes eu fico em dúvida se você fala essas coisas para fugir dos assuntos sérios ou se você fala sério.

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