Moments

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"Mãos silenciosas
A voz é entorpecida
Tento gritar fora os meus pulmões
Mas isso torna as coisas mais difíceis
E as lágrimas escorrem pelo meu rosto
Se nós apenas pudéssemos ter essa vida por mais um dia
Se nós apenas pudéssemos voltar no tempo"

Já havia completado três semanas que eu estava na casa de (s/n) e a nossa convivência se tornava cada vez melhor. Íamos juntas as consultas e muitas vezes andávamos no parque por algumas horas enquanto conversávamos mais sobre o nosso passado.

Apesar de nunca termos concordado com isso, evitávamos falar sobre o acidente.

(S/n) era uma pessoa extremamente simpática e carinhosa com quem gostava, eu a observava sempre que saía da consulta com sua psicóloga e encontrava a sua cunhada. Ela tem um sorriso fácil e cativante, gostava de toques e abraços, às vezes beijava a testa dela e se despedia sempre com dois abraços apertados.

Se despedia de todos os funcionários da clínica que acenavam felizes para ela, e, sempre que eu a via fazer isso subia uma vontade de sorrir. Era como se (s/n) sorrisse para mim também e eu me contagiava com sua alegria. Eu sentia também um leve tremor em minha barriga e minha mãos ficavam trêmulas por alguns segundos.

E eu não fazia ideia do que seria, pois nunca havia sentido isso.

(S/n) estava muito melhor emocionalmente e psicologicamente, depois que voltou para a terapia, ela tem conversado mais e evitado em ficar tão reclusa. Já eu, era um processo lento, porém eu sentia algumas mudanças significativas acontecer em mim.

Sentia-me com mais energia e disposição, eu ajudava com as tarefas da casa mesmo que (s/n) reclamasse para que eu não fizesse nada. Mas me sentia bem, útil em fazer essas simples tarefas.

Eram essas pequenas coisas que eu não conseguia fazer em minha casa e me sentia tão vazia, constantemente.

Agora, eu e (s/n) estávamos lendo livro em sua varanda no final da tarde com uma xícara de chá ao nosso lado, pois não podíamos tomar café. Ela lia um livro de fantasia enquanto eu lia O que o sol faz com as flores, de Rupi Kaur.

Era rápido porém me tocava de forma tão intensa, como se eu fosse ela a ter passado por tudo aquilo. Mas também sei que me sinto representada em seus versos, pois perdi alguém que nunca pensei que ia partir.

Nunca estamos preparados para perder alguém ou para partir, mesmo sabendo que isso é natural da vida humana. Até nos repreendemos se pensamos em algo relacionado a morte. Pode ser a nossa cultura na qual estamos inseridos ou até mesmo a ligação que temos para com tal pessoa. A resposta se torna simples e fácil, não estamos preparados para a morte, nunca estaremos.

E só nos deparamos quando perdemos, por isso existe os cinco estágios do luto.

A negação e o isolamento é a primeira dela. Negamos que tenha acontecido e nos afastamos daqueles que nos fazem lembrar de alguma forma daquela pessoa ou até mesmo por eles quererem que sigamos em frente.

O segundo estágio é a raiva. Por que isso deveria ter acontecido? Por que eu fiquei aqui ao invés dela? Se o motorista não tivesse bebido ela estaria aqui!

E ficamos com raiva de todos, da justiça, dos nossos familiares e da nossa fé. Acreditando que o criador seja o culpado pelo o que aconteceu.

A barganha é o terceiro. Se ela voltar, eu serei mais paciente, menos ciumenta e mais companheira. Se for um sonho, quando eu acordar serei uma nova pessoa.

Logo em seguida vem a depressão, a sensação de que ao sentir tudo, nada mais importa. É como se um buraco tivesse aparecido e sugado tudo aqui dentro, sugado minhas emoções, vontades e deixado só a tristeza, o medo e a raiva. E você percebe que tá tão absorta nos momentos que teve juntos que viver em lembranças se torna o refúgio da realidade.

Diphylleia Grayi {Camila/You}Onde histórias criam vida. Descubra agora