Capítulo I

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Querido diário, cheguei a conclusão de que minha vida é melhor quando estou dormindo. O despertador vai tocar a qualquer minuto e eu só queria poder congelar o tempo pra dormir infinitamente, já que mal preguei os olhos essa noite. Passei a madrugada lendo A seleção, o tipo de livro em que você entra na fantasia e parece que é a personagem principal. Adoro livros assim, que me façam viajar nas entre linhas. Mas agora ele acabou e eu voltei á realidade.

Hoje era só mais um dia comum, um dia longo e entediante como os programas da tv num domingo. Era exatamente assim: eu acordava as 6:15 da manhã - ou pelo menos tentava já que na maioria das vezes eu durmia tarde e perdia a hora. A música do meu alarme era bem animada e quando a coloquei imaginei que eu levantaria no maior pique, dançando como num comercial de margarina e etc, só que não aconteceu bem assim, na verdade eu tinha que me controlar pra lembrar que o celular era meu melhor amigo e lidar com o impulso de jogar ele na parede quando ele tocava e voltar a dormir como um urso no inverno. Bom... Onde estávamos? Ah sim, depois de enrolar o máximo possível embaixo das minhas cobertas infantis, eu cambaleava pela casa como uma zumbi. Minha mãe sempre tentava me forçar a comer alguma coisa, mas eu nunca comia nada de manhã, era tipo a única hora do dia em que eu não sentia fome. Sério, eu era magra de ruindade.

Eu odiava a minha escola, estudava lá desde os sete anos e sinceramente não suportava mais olhar as paredes de lá e muito menos as pessoas, acho que eram as lembranças ruins desse lugar. Eu estou no último ano do colegial, finalmente! Pensei que esse ano nunca chegaria.

Eu sentava na penúltima cadeira e era horrível pra enxergar a matéria da lousa ou pra interagir com alguém, mas quem disse que eu queria? Mal podia esperar para o sinal tocar, eu só queria que as aulas de matemática acabassem logo, sempre fui péssima com números e diferente do que você deve achar, eu não sou nerd e estou bem longe de ser, na verdade sempre suspeitei que tivesse algum défice. Minhas notas estavam como meu dinheiro, zerado. Nunca fui muito boa em guardar dinheiro, sempre gastava em coisas inúteis. Bom, não coisas totalmente inúteis, fast foods não são inúteis, graças à ele eu ganhei uma bela de uma gastrite, umas celulites e uns quilinhos, mas mesmo assim ele me faz ser uma gorda feliz.

Os ponteiros do relógio pareciam andar para trás, era a única desculpa aceitável para demorar tanto para chegar o horário da liberdade.

Em cada aula, eu sentia os olhares, ouvia os murmúrios, as risadas, os bilhetes passando de mão em mão, as canetas escrevendo fervorosamente nas folhas de papel arrancadas. No fundo eu sabia que eu era o assunto.

E ai voltamos para o início, lembra quando eu disse que minha vida era melhor quando estou dormindo? Eu não estava brincando. No meu quarto, com as minhas cobertas infantis, com o abajur ligado pelo meu medo de escuro, meus desenhos repetidos e meus livros.

A aula de filosofia era minha favorita, na verdade era uma das poucas que segurava minha atenção por mais de dez minutos. Não que eu não quisesse prestar atenção nas outras, mas como eu disse uns parágrafos acima, devo ter algum défice. Não pensem que era por que ele era bonito ou algo do tipo, é que a aula era diferente, interativa, informal e isso a tornava fodasticamente legal. Eram cinqüenta minutos de aula que mais pareciam cinco. Hoje o tema era a estética, uma coisa que não me agradava muito.

- A feiura e a beleza são conceitos criados pelo homem. Tudo depende do gosto de cada um: para uns, uma pessoa pode ser linda e, para outros, ser horrível. Se vive hoje em dia em uma sociedade comandada em grande parte por uma ditadura de padrão de beleza. Mas é tudo uma questão de modismo, não é que esse determinado tipo seja de fato mais bonito ou feio. Em outras épocas, outros tipos foram considerados bonitos e os atuais, foram considerados feios.

- A Dakota é coringa, feia em tempo contínuo. - alguém sussurra e a classe toda cai na gargalhada olhando pra mim.

Fingi não escutar embora minhas lágrimas implorassem pra escorrer pelo meu rosto. Respiro fundo. O sinal que anunciava o intervalo toca e a única coisa que ouço são os gritos, os passos e as cadeiras arrastando no chão. Guardei todo meu material, joguei a mochila nas costas e quando estava prestes a sair da sala meu professor me chamou.

- Dakota, pode ter certeza, aquilo que a gente planta, a gente colhe, de um forma ou de outra. Não estou te incitando a desejar o mal dessas pessoas, nem a se alegrar com seus sofrimentos, mas é fato: o que se planta, se colhe. Eu tenho pena dessas pessoas, por sua má formação de caráter, que a qualquer momento as pode derrubar. - ele disse.

Não sabia o que dizer então apenas coloquei um fraco sorriso na cara e saí praticamente correndo daquele lugar. Entrei num dos banheiros e encostei-me na porta atrás de mim e por ela fui deslizando até encontrar o chão. Dobrei os joelhos e afundei meu rosto neles. Você deve saber o que vem depois. Uma palavra: lágrimas.

As pessoas achavam que eu não tinha coração ou um ponto fraco, mas cada palavra que saia da boca deles me machucava sim e muito. Eu tenho sentimentos embora nunca mostre por achar que são uma fraqueza e no fundo são mesmo.

DakotaOnde histórias criam vida. Descubra agora