02. O peão turrão.

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P.O.V - JOSÉ ANTÔNIO.

Enquanto a chuva caia lá fora eu era obrigado a acalmar Maria Joana que odiava com todas as forças daquele meio metro de gente o barulho da chuva. Ela se encolhia no meu colo e fechava os olhos com força a cada trovão, tremendo feito uma vara verde.

- Joana, a chuva não vai te pegar não - tentei pela décima vez. - Ela tá lá fora e a gente aqui dentro.

- Vai entrar - pirraçou. - Vai sim.

Minha filha tem apenas três anos e é muito inteligente para essa idade, fala mais que vitrola quebrada. Descobri que seria pai no susto quando uma mulher chegou na porta da casa com um pacote nos braços dizendo que a menina era minha.

Quase caí duro para trás ao ver aquela coisa tão pequenininha me encarando com seus olhos verdes da cor do pasto após os dias de chuva.

- flashback, três anos atrás.

Era a quarta vez que o bezerro pintado pulava pras bandas do João Gomide, e lá ia eu atrás do bicho como em todas as outras. Quando estava colocando meu chapéu na cabeça uma batida desesperada na porta me fez enrugar a testa, não estava esperando visita.

E os pião entram pela cozinha nos fundos.

Minha mãe apareceu para abrir a porcaria que não parava de fazer barulho e fui junto só pra garantir que não era problema.

- O Zé tá? - perguntou para minha mãe com a voz nervosa, ao me ver respirou fundo. - Tenho que falar com você.

- Pois fale - mandei a encarando. - Algo errado?

Já tinha visto ela uma vez e dormido com a bendita, não esperava ver ela nunca mais. Ela olhou para minha mãe e eu não falei nem um mísero "a"

- É sua - falou por fim, estendendo um bebê enrolado nos panos. Foi como se eu tivesse dado tela azul, pois encarei aquela coisinha pequena por longos segundos.

- Do que cê tá falando? - questionei cruzando os braços. - Essa criança não é minha, não.

- Pois eu lhe digo que é - insistiu. - A menina é sua filha.

- Pela mãe - Elvira bradou. - Zé?

- E quem garante isso? - refutei. - Que eu me lembre você trabalha numa currutela.

Seja lá qual o nome da quenga revirou os olhos e empurrou a menina para os meus braços com brutalidade, fazendo com que aquela coisinha pequena começasse a chorar, balancei ela de forma automática e encarei a desgraçada com fúria.

- Já viu quenga engravidar de qualquer um? - perguntou seca. - Ela é sua.

- Como você mesma disse - comecei ríspido. - É uma quenga, abre às pernas para meio mundo de macho. Quem garante que essa menina é minha filha? A sua palavra não me vale de muita coisa.

Minha mãe deu uma risadinha sem graça e continuou assistindo a discussão como uma boa velha fofoqueira.

- É sua, Zé - sentenciou. - A escolha também.

- Do que cê tá falando, desgraça?

- Vai ficar com essa menina ou eu vou dar pra Gertrude criar - avisou ríspida. - É sua escolha.

- Dê a essa Gertrude, a menina não é minha filha.

- Gertrude vai criar a menina até ela fazer doze anos - explicou e eu fiquei mudo. - Depois bota ela na currutela e ela que se vire no mundo, não vou ter filho não.

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