Noite após noite Mikasa foi para a mesma clareira após acordar de seus pesadelos – agora mais intensos e sempre tendo o oficial como protagonista –, e em nenhuma das vezes o encontrou.
Sabia que ele ainda treinava em algum lugar pois via os nós dos dedos sempre machucados, as mãos calejadas por mais que durante o dia se limitasse às tarefas administrativas, as olheiras profundas que agora entendia perfeitamente de onde vinham.
Inconscientemente, procurava o homem e cada pequeno detalhe que denunciasse suas escapadas durante a madrugada, e Levi já havia notado a atenção que recebia da subordinada.
Brigou com Hange pelo que supôs ser ordem da mulher para que a garota o seguisse e vigiasse até mesmo durante o dia, e quando a Comandante negou séria e resoluta, admitiu que talvez só estivesse sugestionado.
Simplesmente não tinha cabimento achar que a moça o vigiava.
Apesar dessa conclusão flagrava os olhares agora frequentes e furtivos, mal disfarçados; o aspecto constrangido dela e as bochechas coradas quando encontrava seu olhar por poucos segundos antes que ela desviasse, as marcas arroxeadas crescendo ao redor dos olhos denunciando a falta de sono.
Os movimentos estavam mais lentos, o reflexo tardio e a atenção completamente comprometida, além do aspecto cansado. Precisava colocar um fim em qualquer que fosse a preocupação da garota antes que prejudicasse sua saúde.
A chamou no gabinete improvisado em um dos cômodos e mal esperou que se acomodasse antes de constatar incisivo, sem desviar a atenção dos papeis que examinava.
– Você não tem dormido.
Atônita, Mikasa demorou alguns segundos para reagir à situação, provocando a impaciência do oficial.
– E então? Vai me dizer qual é o problema?
– Só tenho dormido mal.
Levi a fitou por cima dos relatórios, percebendo imediatamente que mentia. Passou a mão irritado pelo cabelo, frustrado por não conseguir entender a peça-chave de seu esquadrão.
Era basicamente uma adolescente como os outros, por que entendê-la era tão difícil quando os demais se abriam no menor dos diálogos? Conhecia bem Sasha, Jean, Connie e até mesmo Armin, mas toda sua sagacidade parecia nula quando se tratava dela.
– Por qual motivo?
– Insônia, acho.
Convencido da própria incapacidade de arrancar a verdade, decidiu apenas resolver o problema imediato: a condição física da oriental. Ela que lidasse com os próprios demônios.
– Passe na Hange e peça algo para dormir. Quero que essas olheiras sumam o mais rápido possível.
Voltou para seus relatórios sentindo a energia hostil direcionada a ele.
– Não vou tomar nada pra dormir!
Quase sorriu ao ouvir a objeção da moça: podia não compreender como ela pensava e conhecer pouco de quem era, mas previa como ninguém suas reações. Encostou na cadeira e cruzou as mãos sobre a barriga, aproveitando a expressão aborrecida da garota.
– É uma ordem, soldado.
O movimento chamou a atenção para as mãos feridas; subiu o olhar até fixar nas olheiras que ele exibia, profundas e antigas.
– E por que você não toma?
Foi prazeroso ver uma faísca quase imperceptível cruzar os olhos antes imperturbáveis, um efeito que só tinha visto Hange conseguir em uma conversa banal – sabia que já tinha tirado o capitão do sério, mas apenas em situações de risco.
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The wall
FanfictionLevi construiu ao longo dos anos uma muralha ao redor de si, uma barreira que parecia intransponível até Mikasa encontrar a primeira rachadura.