– Você está diferente.
Mikasa negaria a afirmação de Jean se pudesse, mas ele falava a verdade. Tudo nela diferia do que sentia e do que era há apenas alguns dias, e sequer sabia explicar o quê – a única coisa da qual tinha certeza dizia respeito ao capitão ser o responsável por todos os nós em seus pensamentos.
– Você também.
Ele sorriu, caloroso e gentil; a fitou um pouco sem graça e coçou a nuca antes de finalmente responder.
– Que bom que finalmente notou.
Nunca disfarçou o interesse que nutria pela moça, nem a esperança óbvia com o rumo do assunto. Tanto, que a morena se apressou a delimitar.
– Nada mudou entre nós, Jean.
– Mudou sim. Você agora me vê.
A garota ficou atônita quando ele pegou sua mão entre as dele e acariciou absorto; o contato era bom, a ponto de permitir que continuasse e em certa medida, até retribuísse. E embora ele estivesse certo – agora possuía plena consciência dele – ainda assim, era de uma maneira fugidia, leviana.
– Mas não do jeito que você quer...
O olhar antes caloroso assumiu uma certeza desconcertante.
– Esquece o que os outros esperam. Deixa acontecer o que você sentir que deve.
Aquelas palavras tiveram efeito hipnótico e a um só tempo, libertador; experimentou pela primeira vez a sensação de estar no centro das próprias preocupações, submetida apenas ao próprio julgamento.
Permitiu que ele chegasse perto o suficiente para que as respirações se misturassem, confundissem; a proximidade a deixava nervosa, mas de uma forma agradável – um embrulho que começava no centro e se espalhava pela pele como uma corrente que acordava cada poro.
Tentou relaxar quando Jean se aproximou, mas seu corpo inteiro reagiu dando um passo para trás, negando o contato antes que percebesse racionalmente o que acontecia.
Detestou o suspiro pesado de decepção do rapaz; seria tão fácil se pudesse corresponder, e de certo modo, até correspondia ao seu afeto, mas não a ponto de permitir que a tocasse, apesar de sentir-se atraída.
– Jean...
– Quem sabe um dia não muda de ideia? Têm mudado tanto...
– Gostaria de mudar.
O desembaraço dele a aliviou, sem saber que na verdade só tinha aprendido a disfarçar o quanto as repetidas recusas o machucavam.
– Já é um começo, ser escolhido pela sua cabeça.
Riu com o peteleco que ele deu em sua testa e devolveu um suave empurrão, encostando-se na parede fria, ponderando sobre os últimos anos.
– Era tão mais fácil antes quando a gente nem tinha tempo pra pensar...
– E agora você tem?!
– Modo de dizer...
Riu do espanto dele, disfarçando a real apreensão que a pergunta despertou: sim, tinha muito tempo para pensar, não só o dia todo, mas também as madrugadas insones, todas dedicadas ao capitão.
Conseguia compreender claramente a diferença entre o que sentia por Eren – uma lealdade construída sem que percebesse, um afeto possessivo muito mais ligado a convivência e ao medo da perda – e a natureza do que começava a nutrir por Levi.
– Sem chance, Mikasa. Te conheço, e você não mudou do nada. Me conta o que tá acontecendo.
– Não é nada, já disse.
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The wall
FanfictionLevi construiu ao longo dos anos uma muralha ao redor de si, uma barreira que parecia intransponível até Mikasa encontrar a primeira rachadura.