Capítulo 3

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Eu acho que poderia dormir para sempre se não fosse esse despertador velho me avisando pela sexta vez que está na hora de acordar. Descobri um novo defeito para somar com os que já conhecia, eu claramente não era uma pessoa matutina, mas eu precisava levantar chequei no relógio e....

— Droga, droga, droga. Ótimo jeito de começar o dia de trabalho — praguejava enquanto pegava a primeira calça jeans ao meu alcance e vestia.

Mal dá tempo de me vestir, escovar os dentes e passar uma água nos fios eriçados que sempre se embolam no topo da minha cabeça. Noto a roupa da festa, e quando me olho no espelho quase desmaio, a maquiagem estava um horror, checo novamente o horário em desespero, me atrasar significaria explicações que eu não queria dar, minha cabeça reclama um pouco e eu pego dipirona na gaveta do armário da cozinha depois volto para o banheiro e faço o possível com o tempo que tenho, esse com certeza é meu recorde de arrumação, pesco uma banana, com cascas quase negras, sobre a mesa e saio correndo.

No caminho percebo minha mãe na sala, ela está com os olhos fundos, não parece ter dormido muito bem a noite, não fala comigo, nem parece me notar, só fica ali encarando o nada com uma xícara de café na mão e um cigarro na outra então finjo que não a noto também e saio depressa porta a fora.

A ideia a princípio era correr para o Café, mas minha sandália aperta os dedos e tem um salto pequeno que não me permite andar tão abertamente quanto gostaria. Em pensamento fico repetindo um mantra pedindo que Marli não me visse chegar, mas lá está ela sorridente recebendo algumas encomendas nos fundos quando me aproximo, então imprimi o meu tom mais descontraído e disse:

— Desculpe o atraso chefa!

Ela olha para mim com aqueles olhos puxadinhos que ficam minúsculos quando abre seu sorriso doce e maternal e diz:

— Não se preocupe pequena, vá lá em cima e ponha o uniforme. — Eu a olho confusa, pois sempre usei minhas roupas para ajudar na cozinha, mas ela lê as entrelinhas dos meus pensamentos como sempre e explica. — Agora que está me ajudando no salão precisa de roupas melhores né? Espero que sirva em você, é quase inadmissível o quanto é magrinha, fiz bolo de banana e deixei um pedaço em cima da mesa, precisamos alimentá-la melhor, cuidarei disso enquanto a tenho aqui.

Sorri para ela bem mais tranquila por não ter que passar por explicações que seriam mais vagas do que deveriam e segui suas instruções grata. Nunca pensei que poderia conhecer alguém como Marli, sempre doce, nunca teve filhos e nem se casou. Os pais vieram para o Brasil assim que se casaram e ela nasceu aqui, viveram tempos muito difíceis, mas ela sempre esforçada e inteligente ajudou os pais a abrir o café e depois da morte dos dois assumiu os negócios e estava tocando tudo muito bem.

O dia foi mais tranquilo do que esperei, já estava mais acostumada com a correria de servir as mesas e ajudar também no balcão, Ana veio me ver toda preocupada, mas pedi para que não comentasse nada no café, ela concordou desde que mais tarde eu lhe contasse detalhes sobre meu primeiro beijo, coisa que eu não queria muito fazer.

Fechamos um pouco mais cedo e eu resolvi correr para casa o mais rápido possível, quando abro a porta encontro as luzes apagadas e o que deixa difícil saber se minha mãe está dormindo, ela tinha odiado a ideia de eu começar a trabalhar, depois da formatura eu tinha passado seis meses em casa sem conseguir trabalho e ela reclamava todos os dias por ter que me sustentar, dizendo que ela não tinha mais idade para isso e tudo o mais que ela sempre joga na minha cara. Mas quando falei com Marli e ela me ofereceu o trabalho e contei para minha mãe feliz, ela me disse que não era para eu ir trabalhar, que precisava de mim em casa e eu quase cedi, mas eu não podia abrir mão de tudo, então apesar dos protestos dela comecei a trabalhar.

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⏰ Última atualização: Jun 06, 2022 ⏰

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