Tinta de polvo

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O bingo da sorte estava vivendo seus melhores momentos. Ah, e como!

Izuku sentia-se reluzindo feito ouro. Era como se, de alguma forma, todos os pedidos que fizera no templo, em todas as viradas de ano de sua vida, começassem a se realizar.

Absolutamente nada abalava sua felicidade e seus pensamentos, que se mantinham focados em Katsuki. Ainda que tropeçasse na rua a ponto de quase arrancar a unha do dedão, bastava ele olhar para qualquer canto, e um sorriso brotava em seus lábios; afinal, Great Explosion Murder God Dynamight, o herói número 1 do país, estava — graças a Deus — estampado em cada parte da cidade.

Não era novidade nenhuma Dynamight ser o responsável por animar Izuku de várias formas, e isso desde sua estréia no heroísmo. Ter contato com qualquer coisa relacionada a ele gerava um momento de leveza carregada de gratidão. Não importava se o dia dele havia sido uma merda, certamente seu humor iria até o céu só de ver Dynamight na TV ou na internet.

Como seu símbolo da vitória poderia não ser, também, seu símbolo da sorte? A aura dourada de Katsuki transcendia o azar bizarro de Izuku, e nunca sequer foi a intenção. Era como se Katsuki fosse a princesa Aurora em alguma realidade paralela em que, diferente da moça do conto original, foi abençoado por todas as fadas.

À noite, quando se despediam com um boa-noite acompanhado de um coraçãozinho laranja ou verde, Izuku deixava a mente, temperada com uma pitada de paixão, viajar. Acabava por contemplar diversos cenários estranhos e aleatórios envolvendo Katsuki — isso inclui o devaneio da Bela Adormecida. Ele também poderia ser o baú do tesouro no fim do arco-íris, assim como o trevo de raríssimas quatro folhas nascido no pico da mais alta montanha de alguma ilha inacessível por aí.

Fazia tempos desde que ele esteve tão apaixonado. Óbvio que ter sentimentos por Katsuki foi tão evitável quanto desviar de rachadura em calçada, mas a diferença era: Izuku não fez a mínima questão de tentar evitar. Normalmente ele seria receoso, entraria em uma análise complexa sobre os próprios sentimentos, pediria opiniões, até faria pesquisas na internet, tudo para ter certeza; feito isso, pensaria se valia o risco de levar o milésimo fora da vida.

Mas com Katsuki era diferente, porque ele demonstrou interesse primeiro — sem nem conhecer Izuku direito —, porque ele dizia que era o maior sortudo só por ouvir um áudio de Izuku falando um bocado de besteira no fim do dia. Porque sim.

Izuku andava tão alegre que fazia parecer até que não sofria mais nada no dia a dia. Sero percebeu, a mãe também. No entanto, tudo continuava como antes. Na segunda-feira, um carro passou por ele e jogou tanta água que parecia um tsunami; na quarta, choveu mais que o normal da época e estava tudo bem até que o guarda-chuva novinho dele se abriu inteiro no meio da rua, e só se viu Izuku correndo de um lado para o outro tentando pegar o bendito; na sexta-feira, ele teve uma crise de tosse seca e aleatória no meio de um seminário solo da faculdade, que teve até de ser adiado, mas o mico já estava pago no débito.

Depois dos ocorridos, Izuku se apressava em mandar um áudio para Katsuki contando tudo, com um tom cheio de humor, como se aquilo tudo fosse apenas um detalhe. E, para ele, era mesmo. Ser engolido por um buraco na rua, atolar o pé na areia, ter o guarda-chuva levado pelo vento, ou o chinelo pela água do esgoto, tornava-se uma grande besteira se comparado a receber uma ligação de Katsuki na madrugada. Ouvir, com exclusividade, sobre o dia dele, sobre o parecer pessoal do herói envolvendo várias questões importantes. Tudo isso era muito mais incrível.

Eles também partilhavam opiniões muito parecidas. Embora estivessem conversando há pouco mais de duas semanas, não se viram desde o buraco. Falavam muito sobre a expectativa de um novo encontro, e Katsuki até mencionava planos para muito em breve, quando retornasse de uma cidade mais distante.

Midoriya Izuku, o sortudoOnde histórias criam vida. Descubra agora