𝐂𝐇𝐀𝐏𝐓𝐄𝐑 𝐎𝐍𝐄

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𝐕𝐈𝐍𝐇𝐎,
𝐂𝐇𝐎𝐑𝐎
𝐄 𝐕𝐄𝐋𝐇𝐎𝐒 𝐀𝐌𝐈𝐆𝐎𝐒

𝙋𝙖𝙛
   Acordo com o barulho,sento na cama,coçando os olhos,tentando assimilar daonde veio aquele
som.

Meu pai,meu pai caiu,denovo.

Saio correndo do quarto,quase tropeçando no jarro de barro empoleirado no corredor.

   E ali esta ele, espatifado no chão,o copo de vinho junto dele,consigo ver pequenos cacos entre os rejuntes do piso mal colocado.

   Não é culpa dele,juro que não, ele sofre de depressão e acaba se embebedando como válvula de escape,acontece que afogar suas mágoas em poças intermináveis de bebida alcoólica nunca é uma boa ideia.

  Não é fácil para ele,eu sei disso,posso ver quando sua cabeça se levanta precariamente, e seu olhar,antes perdido,encontra o meu,sinto sua dor em cada átomo de meu corpo.

   Logo vem a vontade de chorar, lágrimas caem apressadas, limpo as rápido, torcendo para que os efeitos da bebida tenham o permitido não notar meu estado.

   Porém assim que me viro novamento,vejo que os olhos dele estao iguais aos meus,marejados,ameaçando desabar a qualquer momento.

   Meu pai chorando?Nunca vi ele chorar, pelo menos não na minha frente.

   A não ser uma vez,quando perguntei,
perguntei sobre ela...
minha mãe.

   O pai nunca tocou muito nesse assunto,mas sempre fez de tudo para que eu me sinta completamente confortável tendo apenas ele como parente,lembro que com 7 anos ele construiu meu quartinho só meu,ele é bem simples mas eu o valorizo com todo meu coração,as paredes amarelas,os livros espalhados por todo o quarto,a escrivaninha que foi meu primeiro presente de aniversário,aos meus 12 anos,junto de "𝘾𝙤𝙢𝙤 𝙚𝙪 𝙚𝙧𝙖 𝙖𝙣𝙩𝙚𝙨 𝙙𝙚 𝙫𝙤𝙘𝙚̂ "um livro que eu queria muito na época,mas meu pai não havia conseguido achar na blibioteca.

   Meu pai trabalha na Medicea Laurenziana,a blibioteca construida por michelangelo,nós adoramos aquele lugar,sinceramente acho que no fundo meu pai prefere este emprego do que algo que realmente dê dinheiro,é o único lugar que ele parece ficar genuinamente feliz.

Todos o conhecem por lá,sempre deixando alugarem mais livros,fazendo recomendações e conversando com leitores sozinhos.

Eu tambem vivo por ali,fiz alguns amigos até,logo na esquina da blibioteca fica a minha cafeteria favorita,sempre que posso estou por aqueles cantos lendo todo tipo de gênero enquanto como pão doce fresquinho e bebo café puro,não gosto de adocantes,nunca gostei,meu pai tambem não,vive dizendo que tira a essencia do café,e eu concordo.

   Somos melhores amigos,ando bem triste em ver ele neste estado,eu sei que ele não tem culpa,nunca teve,não temos dinheiro para acessar nenhum tipo de ajuda psicológica profissional,trabalhando de domingo a domingo,só há duas opções:ou cuidar melhor de si, ou pagar minha escola.

Não há nada que Remus valorize mais que educação, todo dia tenho de acordar 5h da manhã para conseguir pegar o transporte até o centro de Roma, estudo em uma escola particular bilíngue que oferece ensino médio técnico, a escola é realmente cara e a prova para bolsa só dá direito a 50% de desconto,mas graças a meu pai conseguimos arcar com os custos.

   "Seu futuro é tudo pra mim S/n,abrirei mão do que for preciso para dar a você todas as oportunidades do mundo de provar o quanto você é capaz,você tem um futuro brilhante pela frente minha menina,e eu estou muito orgulhoso de você,sempre estive"

   Essa frase foi realmente muito importante pra mim,e eu simplesmente nao consigo descrever o quanto eu o amo,farei de tudo por ele,inclusive recatá-lo do chão,varrer os cacos de vidro espalhados pelo piso encardido e procurar pelos armários de dobradiças rangentes algum pano que possa secar o que foi derramado no chão.

   Sinto sua mão sobre as minhas quando me inclino as lajotas tentando limpar aquela bagunca.

   " Deixa que eu limpo"diz com a voz embargada ainda denunciando seu estado.

   "Deixa comigo pai" digo empurrando-o levemente em direção ao pequeno sofá,"descanse um pouco"acredito que o mesmo teria relutado,todavia parecia tao desconsertado que duvidei da capacidade do mesmo de dar qualquer sinal de aversão.

   Conforme passava o pedaço de tecido o liquido era absorvido, meu pai me olhava do canto da sala, não sei se sabia o que estava vendo,mas acredito que sim.

Joguei o trapo molhado no cesto do banheiro e voltei para meu pai, largado no sofa, o rosto vermelho, a marca das lágrimas nas bochechas, as olheiras cada vez maiores.

   Suas condições eram deploráveis.

   Não deu mais para segurar, comecei a chorar, as gotas d,água corriam como numa cachoeira,ou talvez um maremoto, incessantes, mas verdadeiras, lágrimas de puro sentimento, de pura dor, as lágrimas que caem ao ver a pessoa que você mais ama no mundo incapacitada de dizer uma sequer palavra.

   Com a visão turva, tudo que pude ver foram suas pálpebras se abrindo lentamente, como se estivessem com receio de ver a cena a sua frente.

  Fechei os olhos, não queria ver mais nada, só queria chorar, botar pra fora, sentir tudo, não tenho medo de sentir.

   Após mais alguns soluços e um mar desaguado, senti sua mão  em meu ombro,de início mole e frágil , depois cada vez mais forte, apertando levemente meus ombros, se segurando ali, como se sua vida dependesse disso.

   Podia ver, mesmo com os olhos fechados, podia sentir no sue toque, todo peso que carregava nas suas costas, toda dor e mágoa de perder todos os amigos, de perder os pais, de perder minha mãe.

   Pesado,muito pesado, suas mãos estavam pesadas, mas não me apertavam forte, como se fosse um pedido de socorro, um pedido que deveria ser forte, mas vinha de uma pessoa que não tinha mais nenhuma força, o som de uma voz falhada, caída, a beira da perdição "so-socorro" juntas de um coro frágil e debilitado passaram- se por minha mente, sei que meu pai nao havia dito nada, mas se pudesse,  se não tivesse medo de como eu reagiria, teria se expressado dessa forma.

   O som estridente do telefone se faz presente, meu pai se assusta por um momento, tenta ignorar, parece pensar por um momento, larga meus ombros e anda apressado até a plataforma, do nada, parecendo revigorado de alguma forma, tento entender mas a clareza nao se faz presente, como pode? A minutos atrás mal conseguia se manter em pé, ou será que meu choro foi tão longo assim?A ponto dele ter tempo de pôr a cabeça em ordem?

Não acho que ele saiba o que esta fazendo, parece desesperado, preocupado, como se soubesse que alguma coisa estava prestes a acontecer, e que devia atender aquela chamada a todo custo.

   Ao tirar o telefone da plataforma vi sua mão levantar quase em camera lenta e vacilar quando o aparelho foi posto próximo ao ouvido, pude escutar um barulho, um ruído, a voz de alguém, provavelmente um homem, abafada pelo ouvido de meu pai, tenho a impressão de ter visto sua espinha arrepiar,consequentemente a minha também, no mesmo momento ouvi um sussurro baixo...supreso...um nome familiar lhe escapou dos lábios.

   "Sirius...!?"

   Falou meu pai em um muxoxo inacreditado.

𝐘𝐎𝐔 𝐅𝐄𝐄𝐋 𝐋𝐈𝐊𝐄 𝐇𝐎𝐌𝐄'ʜᴀʀʀʏ ᴊᴀᴍᴇs ᴘᴏᴛᴛᴇʀOnde histórias criam vida. Descubra agora