Parte 4

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Aquela quarta-feira estava se arrastando mais lenta do que deveria.

E o fato de que mais uma sexta estava chegando e com ela aquele mesmo sentimento de ansiedade com a ideia de ver David de novo não me tranquilizava nem um pouco. Porém, ao contrário das anteriores — com a expectativa de provocações sujas e insinuações torturantes e sensuais — eu só conseguia experimentar o tipo de ressentimento mais destruidor que existia. Durante toda aquela semana não houveram mensagens, nem ligações porque bloqueei o número dele, e sempre que eu saía à noite com a minha moto passava muito longe do bairro dele indo cada vez mais distante da minha zona para conseguir acalmar os pensamentos. Passei a precisar ficar muito mais tempo sentindo o frio cortante da madrugada para não voltar àquele momento na porta da casa.

Os lábios da loira encostando nos dele e as mãos dela roçando na gravata desamarrada jogaram por terra os momentos de prazer febris que ele me proporcionou. Agora era só tortura, era só aquela queimação no peito que me fazia querer chorar nos momentos mais inoportunos. E não era diferente naquela tarde, três sextas-feiras depois do sábado desastroso quando entrei no escritório de Cindy Holland, uma das produtoras executivas de Stranger Things e diretora criativa da Netflix. Apesar dela confiar muito mais em mim do que nos outros delivery boys que contratava para levar os roteiros que milhares de pessoas matariam para ler antes do lançamento, a verdade era que eu não queria nem pensar em entrar na sala do David outra vez. Só a ideia fazia meu estômago doer e minha garganta fechar.

— Eu sei que você me pediu para não entregar mais para lá, mas essa é de suma importância — Cindy me disse quando me sentei num dos sofás da sala dela.

A produtora colocou uma mala lacrada sobre a mesa com uma expressão muito séria e compenetrada antes de dizer:

— Esse é o contrato oficial e revisado do David para a quarta temporada da série e eu só confio em você para entregar. Do jeito que a terceira temporada acabou, eu não posso arriscar que a notícia da renovação dele se espalhe e você é a pessoa mais discreta que eu conheço.

Apertei os olhos ao ouvi-la.

A terceira temporada de Stranger Things havia sofrido um adiamento que havia preocupado os fãs e minhas suposições sobre o roteiro e a alta exigência de discrição na entrega dos papéis me fizeram pensar que algo importante aconteceria nos próximos episódios. Era uma grande responsabilidade.

As palavras dela eram sinceras e todos os dias eu agradecia pela confiança que tinha no meu trabalho. Eu entregava para diversos lugares: Lojas de vestidos caros, sex shops, produtores que queriam discrição em seu trabalho, até presentes de maridos para amantes! Tudo porque eu era discreta, ágil, excelente no que fazia. Já tinha ouvido aquelas frases antes, mas daquela vez era muito mais complicado.

— Eu agradeço muito a confiança que você tem em mim, Cindy. De verdade — comecei apoiando os cotovelos nos joelhos, só de falar aquilo eu já me sentia exausta psicologicamente —, mas por favor mande outra pessoa.

A sra. Holland esboçou uma reação de estranheza.

— Aconteceu alguma coisa? — Cindy perguntou, direta e reta. — Já é a terceira sexta-feira que você recusa entregar para esse endereço.

Senti um frio subir pelo abdômen. Se qualquer um desconfiasse do que havia acontecido seria o meu fim! Ninguém contrataria uma delivery girl que transa com os destinatários, era completamente anti-profissional e eu só pensei nisso depois que a merda estava feita. Bolei a melhor desculpa que consegui, mesmo sabendo que não seria nem um pouco convincente.

— É que... É uma responsabilidade grande demais e eu tenho medo de fazer merda. Quer dizer, é um contrato oficial da Netflix! Isso não requer um comboio armado ou algo do tipo?

Kinky Friday - Uma fanfic de David Harbour.Onde histórias criam vida. Descubra agora