6 - Vingança

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Ela não se atreveu temer. Em meio aos arbustos, encarou o enorme muro um pouco mais a frente. As sombras das altas árvores lhe escondia com perfeição das vistas dos guardas, tanto dos que se encontravam diante dos portões quanto dos que faziam suas rondas noturnas. Aguardava o sinal que ajudaria-a a entrar.

Por semanas teceu seu plano, ainda com o espírito perturbado por sentimentos impuros. Revolta a movia, mas vingança a motivava com ainda mais vigor. Não dormia direito há muitas noites. Tinha constantes pesadelos com o corpo de Diná estirado na sarjeta, sangrando, os relinchos dos cabelos soavam fantasmagóricos de um jeito assustador junto aos gritos dos guardas exigindo a retirada do corpo da senhora. Aquela imagem nunca deixaria sua mente. Então sabia que nunca obteria paz se não buscasse vingança pela morte precoce e injusta da mulher que tanto amou e lhe teve consideração.

Seu pé dava indícios de sua impaciência, e toda vez precisava se lembrar de não batê-lo contra os cascalho debaixo de si para não chamar uma atenção indesejada. Precisava manter-se em sua inquietude e ansiedade. Planejou tudo com meros mínimos detalhes, não deixaria que nada lhe tirasse sua tão aguardada hora do acerto de contas.

Tinha noção do quão perigoso e suicida aquilo era. Caso fosse pêga, a pena de morte lhe soaria como a menor das penitências, se tivesse sorte. Ainda assim, não ligava. O que tinha a perder, afinal? Nenhum parente possuía. Sua mãe a abandonou ainda jovem, envergonhada de sua condição genética e de como todos as tratavam. Não tinha marido - o que também não era do seu desejo, tampouco gosto - ou pretendentes que lhe quisessem, muito menos. Era indesejada. Mesmo com toda a beleza negra que possuía, de pele marrom, cachos pesados, e corpo esguio e forte, nenhum homem - ou mulher - lhe direcionava qualquer olhar com segundas intenções. Sua condição de mulher amaldiçoada lhe fadava a solidão.

Sendo assim, se a consequência por buscar vingança pela morte de Diná fosse morrer, o faria de bom grado e cabeça erguida, sustentando sua honra e orgulho.

Uma agitação entre os homens armados a fez despertar para o início de seu plano. Viu os guardas correrem, abandonando seus postos, gritando ordens e sendo instruídos uns pelos outros, e sorriu consigo mesma.

Segurou com firmeza o punhal que levava na cintura, a postos. Seu coração acelerado na caixa torácica a deixava ciente de que a adrenalina já corria por seu sangue.

Mentalmente, contou os segundos que regressavam um minuto e esperou. No ato em que alcançou o primeiro e último número, viu uma claridade se fazer presente no meio do muro de pedras.

A passagem realmente existia.

Correu para a direção, se movendo entre as sombras, tomando os devidos cuidados para não ser vista desapercebida por algum guarda que possivelmente possa ter ficado para atrás, e viu o vão no meio do muro aumentar de tamanho suficiente para um corpo espremido romper.

Encontrou a mulher que lhe ajudou desde o início do outro lado, fazendo-lhe um sinal agitado com a mão para que se apressasse. Dando uma última olhada ao redor, certificou-se de que não estava sendo observada ou seguida e se infiltrou entre a passagem. A mulher lhe abraçou assim que a teve consigo do lado de dentro, feliz por terem conseguido êxito até ali, mas também tratando de verificar se ela levava algum ferimento no corpo.

Deu-se por satisfeita ao não encontrar nada na rápida checagem, e se viu mais feliz ainda ao ter seu abraço retribuído.

Juntas, devolveram os tijolos para seus respectivos lugares, encaixando-os até que nada fosse visto do outro lado. Recebeu da empregada uma roupa de serviçal, composto unicamente por uma túnica suja e esfarrapada, com alguns rasgos e em tom marrom cor de lama. Eram essas as vestes dos serviçais, um ótimo disfarce para qualquer intruso.

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