Olivia

Capítulo 3 - As Vozes daqueles que observam.

 - Jamie, você deveria ir na frente - sugiro mais uma vez, as pontas dos meus dedos roçando levemente atrás do meu corpo.

- Olivia, minha querida - ele suspira girando os calcanhares para ficar de frente para mim - Já expliquei que não posso te seguir em todos os locais do castelo.

- Acho que o capitão Seyfert está lá dentro... - Continuo como se não tivesse percebido a recusa.

- Ele foi convidado a comparecer ao café da manhã - Jamie pontua, a voz elevando algumas oitavas como se quisesse destacar que eu sabia muito bem a diferença entre uma coisa e outra.

- Estou te convidando agora.

Jamie revira os olhos e eu volto a encarar as portas maciças decoradas com ouro a minha frente, reprimindo um ofego frustrado. A coisa toda me intimida, com o seu tamanho e grandiosidade que se faz reconhecida pelos detalhes dourados incrustados com cuidado em sua superfície. Não tínhamos uma porta dessas em Ibhere. Não que eu já tenha passado muito tempo por lá, na verdade, ontem foi a única vez que vi o palácio fora de fotografias, e por conta do momento solene, meus pais não me concederam uma tour, essa seria marcada para depois que eu fosse apresentada como princesa de Hedóxia.

Bem... A fortaleza de Valorian, onde realmente cresci, tendo apenas as pessoas que foram destinadas a zelar pela minha segurança para comemorar os marcos do meu desenvolvimento, sempre pareceu mais um depósito cinza, nada parecido com a opulência e cores reveladas a cada novo corredor do castelo de Atália. Lá eu nunca pude sentir o calor do sol, as janelas sempre deveriam estar trancadas, cortinas fechadas, talvez por isso eu seja tão fantasmagoricamente branca.

Nunca tive contato com a corte de Ibhere, nem tenho certeza se papai já chegou dar a alguém um aviso prévio de que eu existia, às vezes ele próprio parecia esquecer isso. Mas eu me sentia confortável em estar com as pessoas que sempre cuidaram de mim, continuo lembrando como sou grata por mamãe não ter cedido e me deixado levar todos eles para o dia da minha apresentação, ao contrário, estariam mortos agora. Me pergunto onde estão e se já estão vindo ao meu encontro.

A pobre Marlene, que cuidava de todos os aspectos físicos relacionados à minha pessoa, desde a alimentação até as inacabáveis e torturantes aulas de postura, reclamava diariamente sobre problemas nas juntas como quem não quer nada além de passar uma informação sobre o seu estado. Já sinto falta do seu mau humor matinal e me preocupo com sua segurança. Também almejo desesperadamente pelo retorno do tutor Fitzpatrick, nunca percebi que nutria um apego por ele, agora penso em fazê-lo meu conselheiro, ele me ensinou tudo que sei, certamente saberá como me guiar nessa situação. Divago sobre sua saúde e sua idade já avançada, ele nunca revelou quantos anos realmente tinha, mas sei que estava lá quando papai ascendeu ao trono, então posso presumir. Ele conseguiria correr se os homens de Phyron tentassem caçá-lo? Ele aguentaria a travessia a pé até chegar ao reino de Santera?

- Você deveria pelo menos entrar, nem que por um breve momento - volto a insistir, pigarreando antes de utilizar um tom mais sério e formal - Checar se está tudo seguro.

- Eu já teria feito isso se achasse que existe alguma ameaça - Jamie encerra, parecendo ofendido - Mas você está segura aqui.

- Eles vão sussurrar novamente - confesso meus reais temores em voz baixa para que apenas Jamie possa ouvir. Minha voz falha, deixando transparecer mais do que eu gostaria - Como fizeram ontem ao me verem saindo do escuro.

- Sussurrariam mais se eu te acompanhasse - ele contra-argumenta gentilmente, prestando mais atenção em mim - Diriam que pareço com o inimigo - quando o avalio, confusa sobre quais características está se referindo, ele aponta para os cachos que pendem de sua cabeça - Sou um cabeça vermelha. Provavelmente passaram o restante da madrugada conspirando sobre como eu mesmo arquitetei todo um plano e infiltrei pessoas de Phyron para dentro de Hedóxia.