the sandman (morpheus, dream of the endless)

━ prologo, "a escuridão"

Erebus encara a si mesmo, refletido na água obscura. As longas asas de penas escuras planam o corpo masculino palmos acima do extenso mar que nunca tem fim. Ele está respirando, dentro e fora, ritmicamente e de maneira pacífica. No entanto, o olhar em seu rosto inexpressivo demonstra a perturbação interna do ser. 

O senhor dos sonhos, o perpétuo Morpheus ━ um nome em tantos outros ━, não estava no mundo onírico. Os seres que lá vivem já estavam sentindo o desequilíbrio nascer e se instalar, o reino desabava sem seu monarca e seus súditos ━ os seres que lá vivem ━ estavam em completo desespero.

Mas, nem todos.

Os pesadelos, e surpreendendo a todos, alguns sonhos, escaparam do mundo onírico. Assim, por afiliação, a Morpheus. Os leais ao senhor dos sonhos ficaram indignados com tamanho desleixo. Um deles é Erebus.

Corinthian encara a presença silenciosa, agachada em uma pose contemplativa planando sobre as águas, envolta das imensas asas. Ele suspirou, desviando o olhar, então ao inclinar a cabeça para o lado, o pesadelo assobia; chamando a atenção do outro.

Erebus olha para Corinthian.

“Olá irmão.” Ele cumprimenta.

Corinthian sorri de lado e da maneira mais sugestiva ele acena para o outro pesadelo. “Então.” Ele posta-se no dique ao lado direito do Erebus. “Vem ou não? Não perguntei duas vezes.”

O pesadelo encara seu igual, Corinthian ━ as imensas asas de Erebus estremecem. Ele desvia o olhar de seu irmão, levantando-se da pose agachada em reflexão, para caminhar até o outro pesadelo.

Corinthian usa óculos escuros, usa uma roupa jovial que combina com sua aparência animalesca. Erebus é um elemento estranho ao lado do irmão; com sua palidez doentia, olhos fundos e vestes que se propagam com as sombras.

“Onde você vai?” Erebus questiona.

O pesadelo que reflete a humanidade sorri largo, arqueando a sobrancelha, abrindo os braços: “Temos o mundo inteiro, irmãozinho. Podemos ir a qualquer lugar! Não precisava ficar preso━”, ele torce os lábios em desgosto. “Aqui. Neste lugar.”

“Aqui, este lugar é o nosso lugar, Corinthian.” Erebus estabelece e o pesadelo a sua frente resmunga, suspirando. “Preciso esperar o nosso senhor chegar. Ele voltará, irmão. Fique aqui, espere comigo.”

O ser alado segura as mãos de Corinthian, entrelaçando com as suas. “Nosso senhor Morpheus está em algum lugar, mas ele voltará. Ele nunca nos deixaria━”

Corinthian salta suas mãos esguias das de Erebus. “Ele iria me desfazer, meu caro irmão. Não faça essa cara quando estou falando a verdade.” Ele aponta para si mesmo: “Se Morpheus voltar, eu não terei paz.”

Erebus fica angustiado.

“Eu não posso deixá-lo, irmão. Por favor…” Erebus não entendia pelo que implorava ━ melhor, por quem ele implora. “Quero ir━”

“Ora, essa. Então venha! Porra Erebus, quer saber de uma coisa? Morpheus não voltará.” O pesadelo havia finalmente perdido a paciência com o ser como ele. “VOCÊ ME ESCUTA? ELE NÃO VOLTARÁ!”

Corinthian gargalha sob o olhar incrédulo de Erebus. “E eu estou tão bem por isso, nunca me senti tão livre ━ porque Morpheus não voltará. Ele não vai.”

“Como tem tanta certeza?” Com essa pergunta, o pesadelo se calou.

O ser alado pareceu chegar em uma conclusão: Corinthian sabe mais do que aparenta tentar não saber. Ele semicerrou seu olhar planando com suas asas até descer sobre o dique, ao lado do irmão.