A velha da casa lá embaixo

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Famosas no imaginário popular por suas lendas e façanhas. Durante toda a vida, uns juram ter visto uma ou duas, outros juram ser bruxos ou bruxas já outros acreditam fielmente que pertenceram a família de uma, mas quem poderá saber. O que é sonho e o que é ilusão? Até onde sua mente é capaz de distinguir o que é real e o que é sobrenatural? Quem poderá saber. Fato é que há relatos e, se há relatos há no mínimo um pingo de veracidade, assim como toda e qualquer história já contada. Lendas não surgem a partir do ponto zero, logo: se alguém contou, alguém viu ou ouvir falar. Mesmo que a informação chegue destorcida ao longo dos anos.

Em cada canto do mundo há relatos sobre bruxas ou coisas que partam para o lado sobrenatural. Em todos eles há uma semelhança, independentemente do idioma falado ou da crença local. O que o leitor irá ler aqui hoje à partir dos capítulos seguintes destes contos é de fato verídico - ou pelo menos fora contado de maneira verídica.

Nilópolis, meado dos 80's. Havia pouca energia elétrica ou quase nenhuma, isso poderia variar bastante do local onde o infeliz nascera., mas neste caso em especial a luz elétrica era mínima. Poucas eram as casas que dividiam vizinhança por metro quadrado. Quintais enormes protegiam os casebres miseráveis que ali se viam com cercas vivas de arame farpado para dar o mínimo de proteção ao suado pedaço de terra. Pastos enormes se estendiam a longas distancias com bois portadores de chifres absurdamente grandes e vacas fornecedoras de leite fresco; cavalos, cães, gatos, uma bela variedade de pássaros e até mesmo cobras rondavam por ali.

Por entre o matagal que crescia de modo desenfreado, caminhos sinuosos de barro ligavam um terreno ao outro. Durante a noite era-se possível observar estrelas que brilhavam a milhares de quilômetros de distância acima em um céu limpo e livre da poluição luminosa e urbana. Aqui e ali, longe e tímida, uma chama ardia em uma lamparina ou lampião a óleo. Fumaças tímidas subiam aos céus enquanto os viventes de cada casa preparavam as miseras refeições noturnas. A noite era linda de se ver, crianças corriam soltas a brincar de pique e aprontar travessuras infantis livres de perigos que pudessem tirar suas vidas. Ou talvez não?

Começou de maneira sutil até que se tornou algo de tamanho assombroso. Certo dia uma criança saiu para a escola - o que de fato era raro naquele tempo e região - e não retornou. A polícia fora acionada mas nada se resolveu, grupos de busca foram postos a procura pois muito se especulava que devido a quantidade enorme de mato com caminhos e trilhas que podiam se dividir em duas e se perder em labirintos sombrios, a criança pudesse ter se desviado de sua rota habitual. Outros ainda diziam que enormes cobras poderiam tê-lo engolido vivo ou que talvez pudesse ter caído no córrego de águas fétidas que corria ali perto. Mas havia o outro lado, o lado que sussurrava a palavra bruxa no ouvido de mães temerosas enquanto mexiam suas panelas cheias de feijão a beira de uma janela com vista infinita para o mato alto e misterioso. De uma criança passou para duas, de duas crianças desaparecidas passou para cinco e assim o caos se instalou.

Gritos subiam aos céus em total desespero. Mães inconsoladas choravam o desaparecimento de suas crianças. O local que outrora era palco de fogueiras enormes onde se podia ouvir uma boa história, agora era deserto e temeroso, isso porque a palavra de uma pessoa se tornou a palavra de todos. Certa vez um sujeito comentara que vira tal senhora fazendo práticas suspeitas aos pés de uma arvore, disse também que vira tal senhora acendendo fogueiras depois da hora grande e, que ainda vira tal senhora passeando por entre o matagal durante a madrugada vestida inteiramente de cinza e com o rosto encoberto por um véu acompahada de um bode preto. Aquilo fora o suficiente para que todas as pessoas também passassem a ver algo.

O inferno começou. Gargalhadas ecoavam pela noite perturbando o sono de quem ousava pregar os olhos. Pés ligeiros e pesados pisoteavam os telhados de cerâmica a muito roídos e furados aqui e ali. Viam-se sombras paradas em frente as janelas de ripas estreitas sob o clarão da lua. Breves toques nas portas de madeira - por muitas vezes escoradas por pedaços grossos de "pernas-de-três - e do lado de fora o som irregular de uma respiração asmática e cansada. Nomes eram chamados por vozes sem dono e gritos longínquos chegavam com o vento. Misteriosamente um enorme bode preto começou a rondar a região, uma besta com olhos cor de mel e dentes tortos sempre expostos. Galinhas, patos, cães e gatos apareciam mortos de forma brutal, os corpos sem cabeça ou com os pescoços quebrados não apresentavam uma única gota de sangue.

Podia ser o mais intenso verão, mas sempre havia uma tempestade de vento ou muita chuva. As pessoas daquele lugar estavam assombradas, muitas não conseguiam mais sair de suas casas para trabalhar; o medo estava instalado. Quando a lua apontava no céu, todos já haviam feitos suas refeições noturnas e apagado suas luzes com o medo instalado em seus estômagos. Olhos, mas não somente de crianças, espiavam ansiosos por debaixo das cobertas esperando não ver ninguém os observando por entre as ripas de madeira de suas janelas - mas secretamente ansiando por verem algo para que assim pudessem ter o que contar a seus vizinhos. Com os cabelos por vezes em pé e os pés sempre cobertos por seus lençóis velhos e furados pois o frio parecia nunca ter fim durante a noite. Tremores e febres vinham e iam deixando um sentimento de agouro profundo. Medo.

Certa noite um rapaz que se mostrara mais corajoso do que os outros, saíra com pés silenciosos para buscar água no poço de seu quintal e logo tivera a sensação de que alguém sussurrara em seu ouvido, uma voz arrastada e mórbida, olhe para a casa lá em baixo. O tremor desceu-lhe espinha abaixo e quase escorreu quente por suas pernas. Não tinha coragem para tal, mas a curiosidade era maior. Olhou. Viu o ligeiro vulto surgir por cima do bambuzal sair voando trepada em uma vassoura. Largou o balde que havia puxado com tanto sacrifício e correu para dentro de casa batendo a porta as suas costas com os olhos arregalados em total horror. A voz não saia e por mais que sua mãe perguntasse o que havia acontecido apenas lágrimas  desciam de seus olhos, esses voltaram-se para a janela entreaberta do pequeno cômodo e lá estava ela, encarando-o com olhos arregalados e antigos e dentes arreganhados em um sorriso faminto.

Depois do terrível acontecimento a senhora que vivia na casa lá embaixo nunca mais fora vista. Terríveis eram as acusações contra a mulher, mas todas sem provas concretas.

De fato a velha da casa lá embaixo tinha lá seus mistérios, pois em sua casa foram encontrados objetos misteriosos tais como plantas ressecadas, animais empalhados e até mesmo ossos roídos que não se sabia dizer a origem.

O que quer que fosse feito ali naquele casebre, tivera seu mistério levado junto com a velha que ali morou.

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