O relógio de parede da pequena sala estava prestes a dar as 9 horas da manhã, mas Júlia já estava acordada havia algum tempo. Sentada à mesa da cozinha, olhava fixamente para o calendário, cujas datas vermelhas lembravam-lhe o peso de uma realidade difícil de ignorar. O atraso no aluguel já passava dos oito meses e, apesar das promessas e dos esforços, ela não tinha o dinheiro necessário para regularizar a situação.
— Frederico, por que você sempre faz isso? — resmungou, ao ver o gato negro e peludo pular sobre a mesa, desajeitado, espalhando papéis. Ele olhou para ela com aqueles olhos amarelos, como se estivesse avaliando suas escolhas de vida, e se acomodou sobre a pilha de contas atrasadas.
Era como se o animal soubesse que as coisas não iam bem. O gato tinha sido seu único companheiro constante nos últimos meses, o único que não a julgava pela bagunça que sua vida se tornara.
Ela suspirou profundamente, tocando a pele de Frederico, que ronronava suavemente. O barulho da campainha interrompeu o momento de paz. Seu coração disparou. Ela sabia quem estava do outro lado da porta.
— Senhor Bahiense... — murmura, segurando o maço de chaves. O homem, dono do prédio e também do seu pesadelo diário, vinha buscar as respostas que ela não tinha.
Júlia se levantou lentamente e foi até a porta. A campainha soou novamente, mais insistentemente. Abriu a porta, encontrando o rosto de Senhor Bahiense, com sua expressão carrancuda e postura rígida.
— Bom dia, senhorita Júlia. Acho que não preciso me apresentar novamente, não é? — disse ele, com a voz grave, cheia de autoridade. Ele era um homem de estatura média, cabelo grisalho e uma barba malfeita. Sua postura era a de quem estava acostumado a controlar tudo ao seu redor.
— Senhor Bahiense, eu... — Júlia tentou falar, mas as palavras ficaram presas na garganta. Ela sabia que nenhuma desculpa seria suficiente. A situação estava crítica.
— O senhor Bahiense não quer mais desculpas, menina. Quero ver o dinheiro ou o apartamento será desocupado imediatamente. — Ele estendeu o braço em direção a ela, como se oferecesse um ultimato. — Você sabe que já passei da paciência, não é? O senhor Frederico parece confortável aqui, mas a dona deste imóvel está em dívida com a lei, e se não pagar, terá que ir embora.
Júlia mordeu os lábios, sentindo o pânico crescendo em seu peito. As palavras que ela sempre temia ouvir estavam sendo ditas, e tudo o que ela conseguia fazer era tentar não chorar. Ela se viu sendo levada por uma mistura de raiva e medo, sem saber o que mais poderia fazer para reverter a situação.
— Eu... — Júlia engoliu em seco. — Eu só preciso de mais uma semana. Uma semana para conseguir. Eu vou conseguir.
Bahiense a olhou com desdém, como se já tivesse ouvido aquela promessa antes, muitas vezes.
— Uma semana? Eu já dei a você mais tempo do que merecia. Não tem mais prorrogação. A última chance foi dada, agora, é hora de tomar uma decisão. Se não me apresentar o valor até o final da semana, sairá do apartamento. Sem mais conversas.
Júlia sentiu um frio gelado na espinha enquanto o senhor Bahiense se afastava, indo embora com os passos pesados que ecoavam pelos corredores do prédio. Ela ficou ali, com a porta semiaberta, observando sua figura desaparecer no final do corredor.
O que faria agora? Onde conseguiria o dinheiro? Desesperada, olhou para Frederico, que a observava calmamente. Em meio ao caos, ele parecia ser a única coisa que ainda fazia sentido.
Mas e a casa? E o aluguel? A última chance estava prestes a se esvair, e ela não sabia por onde começar.
O que restava a fazer, além de correr contra o tempo e encontrar uma saída para o abismo que sua vida parecia ter se transformado?
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Por Acaso Amor
RomanceDizem que quando rimos sozinhos por alguém, significa que você encontrou a pessoa, aquela pessoa! Demorei muito pra entender meus sentimentos, mas você trouxe tanto caos para minha vida que pensei que nossos mundos não estavam destinados. Eu estava...