Os invasores quebraram as pernas de Severino e amarraram seus braços. Thiago estava ao lado de Alice e Amélie com uma pequena faca em punho, eles estavam em severa desvantagem. Ao redor deles aquele povo de pele negra apontava suas lanças em sua direção formando um circulo ao redor do trio. Quando perceberam que Severino estava imobilizado eles começaram a gritar: "A lu Bìlísì". Eles batiam suas lanças contra o escudo fazendo ecoar um som forte de tambor pelo acampamento. Um dos homens que não estava no circulo parou para encarar Alice e Amélie nos olhos, ele parecia ponderar o que faria com elas, mas ao ver Thiago levemente abaixado perto de Alice ele apontou para o jovem e começou a gritar algo que ninguém entendia, um dos homens que estava no círculo se aproximou dele e tentou agarrar o braço mas Thiago balançou sua faca tentando expulsá-lo, dois outros homens saíram do círculo e seguraram Thiago pelos braços enquanto o primeiro que havia se aproximado desferia socos e pontapés nele.
Amélie cobriu o rosto com as mão e Alice encarava aquilo sem expressão alguma. Um pouco longe se escuta o grito de uma mulher: "Me solta!", Maria da Glória se debatia tentando se livrar do agarre de um dos homens. A Mãe se aproximou do circulo e os homens abriram espaço para que ela passasse, se aproximando de Thiago tocou suas feridas e aplicou uma pasta sobre elas. Mãe se virou para os homens e os encarava com um olhar severo, como se possuisse alguma autoridade sobre eles. Do meio dos homens um deles se aproximou dela e disse:
-- Eu saúdo a Ialorixá. Por que a senhora desapareceu daquele jeito?
- Tenho meus motivos. Inda sim, querem vir mata gente importante pra mim?
-- Não sabíamos que este assentamento era seu. Mas por que abrigou o Demônio?
-- Já disse, agora pega eles e leva pra o Quilombo, e ai de quem macucá minha minina. - ela olha na direção de Alice e Amélie – Essas duas tão comigo também. Leva elas junto. E não façam mais mal a Severino, o bichin já sofreu muito.
Os homens quebraram o círculo e amarraram Alice e Amélie, a Mãe e Maria da Glória seguiam livres ao lado dos homens, quase como se estivessem sendo escoltadas.
O dia surgia no horizonte e o sol começava a banhar a terra com sua luz, aparentemente a escolta caminhou a noite inteira, ao subirem uma pequena colina o grupo avistou uma muralha feita de madeira, alguns de seus captores falarem algo em sua própria língua, a Mãe caminhava na frente da escolta conversando com um homem no que poderia ser a língua Iorubá, Amélia desejou ter estudado aquele idioma. Ela se aproximou de Alice e perguntou a ela o que era aquela luz durante o ataque ao acampamento, ela respondeu :
-- Aquilo foi o meu dom. Todo ser humano possui um dom, ele é o que a sua alma deseja fazer, pode se considerar que é a manifestação do seu destino, sua missão nessa vida. Um dom pode se manifestar de diversas formas e cada pessoa possui apenas um dom. O meu é aquela luz, ela serve de inspiração para aqueles que estão ao meu redor e cura as feridas daqueles que são banhados por ela. No começo eu ficava muito cansada quando usava meu dom, mas com o tempo eu me acostumei e agora posso usá-lo 3 vezes antes de precisar de um descanso.
O grupo entrou na cidade. Havia diversas casas feitas de barro e madeira e diversas pessoas caminhavam em todas as direções. O homem que liderava o grupo virou-se para os soldados e disse algumas coisas em sua língua com isso o grupo foi dividido, Severino Maria da Glória e Thiago foram levados para outro local enquanto Alice, Amélia e a Mãe foram levadas para um edifício alto adornado com estátuas de diversos homens e mulheres com aspecto solene, Amelie logo intuiu que seria o palácio deles ou ao menos onde o chefe da vila ficava. O interior era adornado por peles de animais e seis colunas sustentavam o andar superior. Ao fundo ficava um trono feito de arenito e ossos, o trono era elevado por uma pequena escada de três degraus, Amélia ficou desconfortável com aquilo não gostava de ver coisas mortas, sentada no trono estava uma mulher com um manto feito de pele de onça pintada, ela portava uma lança branca e encarava o grupo com um rosto sério. Ao lado da mulher, estavam dois guardas, cada um deles era no mínimo 20 centímetros mais alto que qualquer um naquela sala. A Mãe se aproximou e fez uma longa reverência, o que fez a mulher se levantar do trono, ela desceu as escadas e ajoelhou-se no chão diante da Mãe, os guardas do trono também se ajoelharam.
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Sabril - A Terra Vermelha
PertualanganUma ficção inspirada na região nordeste brasileira, onde um cangaceiro possuído por um demônio é obrigado a enfrentar seus medos quando uma menina do sul implora sua ajuda para encontrar alguém de seu passado que lhe infligiu grande dor.