Estiagem

A sela

Sua princesa estava no chão desacordada por culpa dele e nem estando longe, ele não deixava de fazer o mal a essa mulher. O capetinha estava longe e a noite estava perto demais. O corpo dele estava frágil, mas mesmo assim ele tentou levantar o corpo dela para levar até um lugar e usou a sela para e os panos para manter aquecida do frio da noite.

Sua princesa é linda como os sonhos dele o faziam recordar. Cada noite no sereno, cada fome e cada solidão valeram a pena porque ela parecia bem e o filho deles também. Apesar que alguns relatos de Antero deixaram o coração dele apreensivo. Zé lucas de nada tinha prometido. Os dois eram tudo que importava. Até agora ele não sabe como o Deus ou Capeta ainda o levaram porque nada mais fez sentido depois daquele dia. Ele só era um pobre homem vagando e sentindo saudades. Trindade já não tinha mais o cramulhão e estava só até nisso, mas ainda sentia ela o chamar em alguns momentos, mas ele sabia que era melhor o silêncio.

-Você não deveria estar perto dela, Trindade. Essa vida não lhe pertence....

Uma voz já conhecida por ele fala pelas suas costas enquanto ele tenta fazer um fogueira para afastar os animais. Era o antigo amor dela e era o antigo Zé Leôncio.

-Por que não venho da família não é mesmo?

-Você abriu mão dela, Trindade. Até hoje você paga por seus pecados e não deveria nem estar por perto.

-O lugar onde fico sem caça por perto ou senhor Leôncio quer que eu morra de fome também? Só a alma não é o suficiente.

Trindade tira forças para olhar de frente o velho que estava quase tão animalesco como ele mesmo. Eles tentaram criar uma ligação sendo eles partes do pantanal, mas o ancião sempre esquecia que ele não tinha patrão.

-Eu sei que foi na sede para deixar algo para ela

-Irma pensa que eu estou longe ou morto ou que eu sou um delírio. Foi um pequeno presente.

-Para confundir as ideias dela com o marido dela. O presente que você pode dar a ela, você já deu. Não lute contra seu destino, homem.

-Dei para seu filho também, não é? Depois que seu pai me levou a crer que tudo que nos uniu foi um pacto com esse capeta e ele nem a deixou me paz.

-O aviso está dado, Xeréu. Todo mundo tem seu destino e você está novamente atrapalhando o dela.

-O dela ou dos Leôncios?

-Ela é uma Leôncio e Antero também. Nunca se esqueça disso e agora você é um resto de homem que deveria sair dessas terras que ninguém o quer por aqui. Viveram dez anos sem, viverão cem.

-Você não vai ajudar? Afinal, não é propriedade de sua família....

-Não me teste, excomungado. O cavalo vai avisar de onde ela está e logo vai acordar. Melhor rastejar de volta para teu canto.

-Quem é o cobra é o senhor..

-E não se esqueça, faço tudo para proteger minha família de tipos como você.

O velho patrão some sem rastros e Trindade tenta controlar seu ódio por ser obrigado a obedecer. Não que ele tivesse alguma condição de estar com eles, mas voltar a não ver seu filho já era algo cruel demais para ele. Claro que ficar sem ela também. O amor era raiz forte dentro dele. Ao tocar a testa de Irma, ele nota que ela está com febre e usa o resto de ervas que tinha em sua sacola improvisada para fazer uma antiga medicina dos povos da fronteira.

-Trindade...Trindade...volta ..não me deixa...

O delírio dela mostra que ele foi longe demais e logo acordaria. Então ele se esconde por perto para a vigiar até aparecer alguém. Como o previsto, Irma logo abre os olhos confusa e principalmente pelas ervas em sua testa e a fogueira. Não foi uma fantasia. Era real.

-Trindade??? Trindade???

Ela sente dor mas consegue levantar. A escuridão da noite impediu que Irma encontrasse quem ela procurava, a quem ela procurou por dez anos...

-Aparece, por favor. Eu te peço, Trindade. Eu lhe vi com as crianças. Eu lhe vi com nosso filho. Você me odeia tanto assim?

O desespero começou a bater e a voz dela aumentou de tom. Logo Irma estava tomada de raiva pelo o eco de suas.

-EU SEI QUE VOCÊ ESTÁ AI, EU SINTO QUE ESTÁ! PODE DEIXAR, NÃO VOU COBRAR NADA DE VOCÊ. SÓ QUE, SEU CRETINO, ESTÁ ABALANDO MINHA MENTE...

Irma sente que isso não foi de grande ajuda e procura se acalmar para ser a sensata até demais que sempre foi.

-Olha, eu vi que você estava ferido. Se não cuidar disso, você pode piorar. Por favor,em nome de tudo que vivemos. Me deixa eu lhe ver de perto....

Os olhos dela se enchem de lágrimas e o orgulho desceu junto enquanto ela só mumurrava "por favor"...

-Meu peito pesa em saber do seu estado. Logo você sempre tão arrumado e seguro..Não precisa ser assim. Olha, você nem precisa voltar para sede nem nada. Só me deixa cuidar de você...Eu posso deixar algo para você se cuidar, mas por favor, pense em me ver...

O desespero dela é interrompido por Jove chegando com Tibério com muita preocupação em suas feições.

-Tia,a gente ficou louco atrás de você! Quando seu cavalo voltou sozinho e sem sela...

-O cavalo se assustou com algo e eu perdi ele de vista...

-Mas a dona se machucou?

-Não, só esperei o dia amanhecer.

Algo nela indicou que seria melhor esconder deles o encontro quase encontro com Trindade.

-O vosso marido está louco atrás de ti. Até pensou em cancelar tudo e vir para fazenda, mas a gente imaginava a senhora estaria por aqui pelo que os pirralhos falaram.

-Meu irmão estava estranho,tia. Aconteceu algo?

-Nada,Jove. Eu só quero voltar e ver meu filho.

Mas antes de ir ela se vira para pegar a sela para o Tibério recolocar em seu cavalo e só escuta bem fraco: "Obrigado, Princesa "

Ela queria chorar pela frase novamente ouvida, mas precisava se manter para os dois homens.

Ao chegar próximo da fazenda ela nota quatro cachorros que ainda não tinham e pergunta sobre eles para seu site.

-Ah são para farejar alguns bichos e as meninas adoram. Eu dei o nome de The Beatles.

Irma pensa que com uma certa pena e esses rapazes do pantanal, ela pode começar a que ela se animou de chamar plano "I wanna hold your hand"..

Depois de um banho, Irma vai dormir cantarolando a canção e a esperança entra em sua alma...

"When I touch you I feel happy inside"

Ela dorme se sentindo viva e adolescente enquanto no riacho Trindade sente que deve evitar os impulsos do amor