Capítulo 2

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São Paulo era o exato oposto da cidade em que nasci: grande, barulhenta e cinza. O lobo abaixo da minha pele não estava feliz com a poluição, mas ficou curioso com a quantidade de pessoas novas e cheiros diferentes. Não percebi o quanto estava acostumado demais à rotina e precisava expandir meus horizontes.

Durante o dia, eu e Davi tentamos chegar perto do local do último assassinato, mas ainda havia perícia pela área. Por isso, teríamos que esperar a segurança da noite. Ficamos em um flat perto do bairro Santa Ifigênia, em uma parte mais comercial que não teria tanto movimento à noite com as lojas fechadas. Soava como um bom plano, porém, aquela cidade nunca dormia.

— Seria legal algo assim no The Wolf.

Davi parou junto a dois rapazes que dançavam na rua, em uma batida que convidava a nos mexer junto com eles. Era uma boa ideia, afinal, tínhamos um público cativo que nunca mudava, estava conosco há décadas e ficariam por muitos anos. Meu irmão estava certo, poderíamos inovar o nosso bar. Joguei algumas notas no chapéu dos garotos. Dinheiro não era um problema para nós. Além do The Wolf, que era uma noitada cara para os vampiros que o frequentavam, fazíamos o serviço de detetive particular. Seres sobrenaturais não eram baratos de se contratar.

Enfiei as mãos nos bolsos, mas não por frio. Escondi as unhas grossas e negras de lobo, Davi preferia fazer isso com as dos pés. Não gostava, pois algumas vezes havia furado o sapato por causa delas.

"Meia noite e está todo mundo na rua ainda", reclamei em pensamento, impaciente.

Uma das vantagens de ser lobisomem era a capacidade de se comunicar com os membros da alcateia, desde que estivessem com uma parte do corpo transformada e dentro de um raio de cem quilômetros. Ainda bem que podíamos direcionar e/ou bloquear quem ouvia o nosso pensamento. De outro modo, estaríamos traumatizados com declarações românticas — e sacanas — dos nossos pais o tempo todo.

"A esta hora eu estaria correndo incógnito entre as casas e ninguém notaria. Quando os humanos deixaram de ser diurnos?", concordou.

A retórica morreu quando vi uma ruiva alta em um vestido vermelho que chamou minha atenção. Se não houvesse um assassino à solta, iria atrás dela. Lembrar disso me trouxe de volta para o que importava.

"A gente devia se separar e procurar por vampiros, um deles pode ser o nosso alvo".

Davi concordou, realmente seria uma estratégia melhor. São Paulo era grande e precisávamos cobrir um terreno maior. A boate estava lotada, com muitas pessoas dançando e uma música alta que incomodava os meus ouvidos sensíveis. Nunca fui humano, então o mais perto que cheguei de ser fraco ou ter os sentidos comuns era nos dias de lua nova. O lobo ficava abafado, praticamente inacessível, mas eu ainda tinha a porção vampira em minha linhagem.

Meu pai era um dhampir — um mestiço de humano e vampiro — antes de se tornar o alfa. Ou seja, apenas o seu lado humano virou lobo e eu herdei essa linhagem mista, tornando-me um híbrido como ele.

A lua nova me afetava, mas não debilitava, como acontecia com Davi e mamãe.

Por isso, não fazia ideia de qual seria a sensação da fragilidade e de temer a morte. Era difícil manter em mente que não era invencível, que poderia ser morto, quando isso era uma realidade abstrata demais para ser levada a sério.

— Primeira vez aqui? — Uma garota voluptuosa com cabelos cacheados roxos e cara de quem não via sol há muito tempo se apoiou em mim, sem permissão.

Ela me encarou com olhos inebriados de desejo, suas roupas tinham o cheiro de fumo, o que não era estranho, muitos ali possuíam o mesmo aroma.

— Como sabe?

(AMOSTRA) Valknut - o legado do alfaOnde histórias criam vida. Descubra agora