Capítulo 3

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— Vai sair daí ainda hoje? — Davi bateu na porta. — Esse barulho de água escorrendo a noite toda tá me dando vontade de ir ao banheiro.

— Vá mijar na puta que pariu! Da próxima vez, eu fico bebendo e você se joga no rio!

Agarrei outra barra de sabão e voltei a esfregar meus braços. O odor do Tietê não saía de mim, estava sutil, mas ainda se encontrava ali. Havia bebido uma garrafa inteira de sangue do nosso suprimento para tirar o gosto ruim da boca e considerei seriamente arrancar a minha pele para começar de novo.

Meu irmão gargalhou da minha revolta. Me transformar também não havia resolvido, não éramos como cobras, que trocavam de pele. A nossa era remodelada, mas continuava sendo a mesma constituição. Minha mãe costumava dizer que era o mesmo de vestir uma camisa dupla face.

Homem e lobo eram dois lados de uma mesma moeda.

Ouvi a porta da frente batendo, Davi devia ter saído para comer fora ao invés de preparar algo na cozinha. Menos de uma hora depois, retornou com uma oferta de paz.

— Trouxe perfume francês.

Não usávamos nada disso por causa do olfato sensível. Preferíamos o cheiro natural de cada um, que tinha a nossa própria fragrância. Relutante, aceitei o presente. Davi estava certo, era melhor do que ter o odor da poluição impregnado em mim.

— Minha nossa, você está vermelho! Quando disse que queria arrancar a sua pele, não achei que estava sendo literal. Vista-se, trouxe sanduíche de mortadela do mercado municipal.

Jogou uma camisa em mim assim que abri a porta com a cintura envolta em uma toalha. Em questão de segundos, eu me curei diante dos nossos olhos. Com a comida em mãos, o sanduíche enorme parecia ter sido feito mesmo para a fome de um lobisomem, espalhamos o material que tínhamos em cima da mesa. Mapas e reportagens, Davi fez careta pelo aroma forte do perfume, mas não disse nada.

— Sabemos que ele estava carregando dois corpos — relatei, anotando no caderno. — Izzy estava certa, não é humano. O que sabemos sobre as vítimas?

— Idades entre vinte e vinte e cinco anos, loiras de pele clara e porte atlético, mas sem serem muito fortes ou magras demais, bonitas com narizes delicados e olhos azuis. Fora as características físicas, não havia nada em comum. Garçonete, modelo, fisioterapeuta, estudante e secretária. Ouvi um grupo de amigos comentando o caso em um restaurante. O amigo de um conhecido de uma delas disse que tinha ficado com a segunda vítima uma semana antes da morte.

Batuquei os dedos enquanto mastigava uma mordida generosa.

— Ele sai durante a noite, escolhe uma mulher que se encaixe no padrão e a segue para sequestrar depois, quando ninguém estiver olhando. Por que mudou o padrão e pegou duas?

— Talvez não tenha mudado, não sabemos se ele fez isso nos outros.

Davi deu de ombros.

Não fazia sentido algum. O que aconteceu com a outra? Como não ficou rastro algum? Ninguém desaparecia do nada.

— Vamos investigar mais a fundo, talvez ainda haja alguma pista.

Dois meses se passaram desde o primeiro assassinato, dificilmente restaria algo para ser analisado. Combinamos de Davi tentar a sorte na delegacia, Izzy havia passado o contato de um policial que poderia facilitar para nós, caso tivesse acesso aos arquivos do caso. Ela colaborava com eles desde a época em que era uma dhampir.

Eu iria para os pontos onde acharam os corpos, já que meu olfato era o melhor. Primeiro, no entanto, passaria em uma floricultura, queria descobrir qual flor era o perfume que senti. Não havia ninguém no fundo do rio e nenhum outro corpo foi encontrado. A garota poderia ainda estar viva. Talvez fosse algum ritual de preparação e ela se tornasse a próxima vítima.

(AMOSTRA) Valknut - o legado do alfaOnde histórias criam vida. Descubra agora