01 | Estagnada (exatamente onde você me deixou)

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Boa leitura!

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Havia momentos na vida em que eu gostaria de desaparecer. Simples assim, como a poeira da calçada que eu varria diariamente antes do senhor Hong abrir sua loja de conveniência, ou as pétalas de cerejeira que voavam até sumir de vista durante a primavera. Hoje, com certeza, não houve um momento do dia em que eu não desejasse simplesmente sumir.

E ainda nem é o fim do dia, do expediente, e, muito menos, do pote gigantesco de rámen que Park Do Yoon come lentamente. Muito, muito lentamente.

Eu o observo do caixa, atrás do balcão de cerâmica e sentada em um banco de madeira desconfortável, onde masco um chiclete de melancia — já sem gosto — fazendo todo barulho possível, pois sei que isso o incomoda. Eu só queria que isso fosse suficiente para ele ir embora.

Park Do Yoon e eu namoramos por longos quatrocentos e vinte e seis dias — um ano e dois meses, para ser mais exata. Nós estudávamos na mesma escola e costumávamos pegar o mesmo ônibus para voltar para casa. A conveniência dos encontros diários fez com que nos aproximássemos rapidamente, mesmo que ele fosse uma classe acima da minha e um ano mais velho, consequentemente. O pedido foi feito no final de mais um dia letivo, quando eu encontrei abrigo da chuva inesperada que caía, em um dia de maio, embaixo do guarda-chuva transparente que Do Yoon carregava consigo.

Fomos um casal feliz e equilibrado, até que Do Yoon resolveu terminar tudo devido à incompatibilidade de nossos horários. A rotina de um concluinte do ensino médio era diferente da rotina mais tranquila que eu ainda podia sustentar. Foi difícil conciliar o relacionamento, e eu até que entendi bem seus motivos e apoiei os seus sonhos, embora não estivesse exatamente bem com o término.

Terminamos faltando cinco meses para o fim do ano e menos tempo ainda para a tão aguardada prova. Era verão, mas, mesmo meses depois, eu quase quebrei o antigo rádio do meu avô materno no dia da primeira neve, quando o locutor de voz grave e sedutora começou a falar sobre a primeira neve do ano e a tradição de estar com a pessoa amada.

A mesma baboseira de todos os anos.

Uma parte de mim, pensou que Do Yoon iria reatar o relacionamento após ingressar na universidade dos sonhos com todos os méritos. Afinal, na época, aquele havia sido o único "empecilho" aparente do nosso relacionamento. Mas as coisas não aconteceram como o esperado, e o dia da sua graduação foi também o último dia em que o garoto esteve em minha vida, até mesmo das minhas redes sociais.

Eu estaria mentindo se dissesse que não pensei nele durante os últimos meses. Sentia na pele o que minha avó disse uma vez: "primeiros amores são mais difíceis de esquecer."

O meu último ano letivo já havia iniciado, eu era respeitada pelos mais novos por ser uma veterana proativa (embora ainda me sentisse desconfortável com o título de sunbae e o exemplo a passar) e estávamos no início da primavera. E como a brisa do vento que carrega pétalas de cerejeiras, maus presságios e lembranças de amores nostálgicos, Park Do Yoon havia retornado.

Às 22h30min da noite do dia 24 de fevereiro de 2018, para ser mais específica, como uma piada de mal gosto e o gosto azedo do chiclete de embalagem estilo comic que cobria boa parte do meu balcão de trabalho. Senhor Hong havia me dito uma vez o motivo de pôr tal produto praticamente na cara dos clientes. Em suas palavras: "ninguém compraria algo com o gosto tão ruim, ainda mais se ficasse escondido nos fundos da loja, mas a embalagem cumpre o seu propósito de chamar a atenção, e o destaque dado salta aos olhos dos clientes todas às vezes que eles dirigem o olhar ao balcão de pagamento."

Até a última pétala de cerejeira | JungkookOnde histórias criam vida. Descubra agora