All at Once [Rarijack]

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Sexta-feira

Meu humor havia transitado em muitas emoções durante a semana, desde frustração extrema à felicidade inebriante. Eu tinha esse mal de achar que quando uma única coisa não saía como planejado todas as demais já estavam arruinadas. Era algo que eu tinha para trabalhar no meu interior, mas que ainda era difícil. 

Acordei cedo, como sempre, e ajudei minha família nas atividades matinais. Descarregamos o caminhão, o limpamos e secamos. Quando terminei as obrigações, ainda era cedo e Twilight estava longe de acordar. Ela era a pessoa mais genial que eu conhecia, mas também a mais dorminhoca. Twi tinha a mania de perder o horário do café da manhã constantemente e, se ela não fosse afilhada de uma das donas, os cozinheiros jamais se incomodariam de  deixá-la com fome até a hora de servir o almoço. 

Eu admito que me considerava um tanto ansiosa. Esse momento do dia era um sofrimento, em que eu estava sem trabalho para fazer e consciente de que uma das minhas melhores amigas estava apenas alguns metros de distância. Eu tinha vontade de ir até seu quarto no prédio Oeste e esmurrar a porta até Twilight saltar da cama, mas o pouco de senso e noção que eu tinha me impediam. 

Fui ao meu quarto para trocar de roupa. Amarrei meus fios loiros num rabo de pônei, guardei minhas vestes serviçais no lugar usual e fixei meu chapéu no gancho atrás da porta. Vesti uma blusa térmica branca para me proteger dos raios UV, já que minha última experiência não tinha sido uma das melhores, coloquei um short jeans e uma viseira preta. 

Desci e fui para o restaurante. Lá, Vovó Smith estava sentada numa mesa ao lado da porta que levava até a cozinha e Apple Bloom estava na fila dos biscoitos artesanais. Olhei em volta para buscar Rarity e Sweetie Belle. Caso estivessem sozinhas, eu as chamaria para ficarem conosco outra vez. Todavia, vi o perfeito cabelo roxeado de costas para mim, numa mesa afastada e com seus familiares. Dei de ombros e sentei-me com minha avó. 

— Oi, meu bem. Sentirá muito calor com essas mangas compridas, não? -a matriarca da família me questionou. -Você vai fritar nisso. 

— Não, vovó. Ela é justamente pra me proteger do sol. - ri fraco. -Graças a minha soneca no sol da tarde, tô toda descascando.

— Não entendo essas lógicas modernas. -ela balançou a cabeça ligeiramente. 

Reparei que suas mãos envelhecidas seguravam um baralho maltratado. Sorri. Era do meu avô, vovó mesmo havia o presenteado com ele nas bodas de ouro de seu casamento. Dava para ver em seus olhos como ela sentia falta dele. Vovô e vovó eram como aqueles casais de filmes. Lembro-me bem do meu velho enchendo o peito para contar, sentado em sua antiga poltrona de couro, que estava noivo de outra mulher, mas fugiu do altar e escolheu Vovó Smith, como se tivesse algo do que se orgulhar em admitir que foi infiel . Enfim, o importante é que eles compartilharam de um amor genuíno enquanto o tempo os permitiu. 

— Caramba! -Apple Bloom sentou-se conosco. -Acho que peguei comida demais.

E, de fato, tinha. Seu prato, como de costume, era um empilhado. Tinha tanta variedade naquele mix de biscoitos que eu nem saberia diferenciar todos os sabores direito. 

— Eu tenho é certeza! -acompanhado de uma risada, falei. 

— Divide comigo, AJ, por favor? - minha irmãzinha pediu.

— Claro, vai me poupar de levantar e enfrentar toda aquela fila. 

Apple Bloom enfiou um biscoito de queijo inteiro na boca - suas bochechas ficaram enormes - e seu olhar, intrigado, parou nas mãos da vovó, que remexiam e embaralhavam as cartas freneticamente. 

— Vamos jogar pife! Que tal? -Bloom lançou enquanto limpava farelo do queixo. Vovó a encarou por um instante, imóvel.

Apple Bloom era nova demais quando vovô faleceu, ela quase não se recordava dele e, muito menos, sabia o significado daquele baralho surrado. Fiquei tensa, não consegui decifrar a face da Vovó Smith. Geralmente, era fácil de lê-la, mas naquele momento parecia impossível.