Capítulo 1 : O cão de Santa Teresa

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As aparências enganam e muitas vezes somos ensinados desde criança que não devemos julgar um livro pela capa.

Esse era ironicamente um ensinamento que Laura Black passou para o seu filho Edgar desde muito cedo.

Os Black eram descendentes dos povos indígenas que habitaram aquela região na época da colonização, mas o contato com o homem branco acabou por segregar a família, eles se dividiram, alguns ficaram na aldeia que veio a se tornar o povoado de Santa Teresa, enquanto que uma pequena parte da família teve um papel crucial para a fundação de Woody Rivers.

Os Black que ficaram em Santa Teresa não acompanhavam os avanços e progresso, e devido a mentalidade de raça pura herdada do povo branco cada vez menos indivíduos saudáveis nasciam, muito por conta das relações incestuosas que os Black praticavam. Em poucas gerações os Black de Santa Teresa se tornaram pobres, doentes e decadentes.

Foi em um celeiro que ficava nas terras dos Black nos limites da vila de Santa Teresa, parcialmente habitada e construída contra uma colina, a seis quilômetros e meio da vila e a dois quilômetros e meio de qualquer habitação, que Edgar Black nasceu, às cinco horas de um domingo choroso, no dia 14 de março de 1950. Essa data foi relembrada porque um dia antes uma grande tempestade atingiu o vale Olsen, as pessoas em Santa Teresa observaram apavoradas os raios e com horror testemunharam os estrondos causados ao atingir repetidas vezes a chamada "colina do pescoço quebrado", os cães do campo latiram e uivaram persistentemente, por toda a noite anterior ao nascimento do menino.

Menos passível de se notar foi o fato de que a mãe era uma das Black decadentes; uma mulher de descendência indígena e albina, que os habitantes julgavam como promíscua, e por causa de sua cor algumas a chamavam de aberração, ela estava em seus trinta e cinco anos mas sua mentalidade era de uma criança de doze, ela morava com o pai idoso e meio caduco, sobre quem as histórias mais aterrorizantes foram sussurradas durante a sua juventude se tratar de um monstro,ao menos nas noites de lua cheia. E que mantinha relações com a filha desde da morte da esposa.

Laura Black não tinha marido pelo que se sabia, mas era comum os comentários maldosos  que passavam de boca em boca sobre Laura abrir as pernas pra qualquer um em qualquer lugar, fosse homem ou animal.

A verdade no entanto era que Laura era mentalmente fragilizada, e muitos homens da aldeia se aproveitavam disso. Mas as esposas sempre culpavam Laura. E preferiam dizer que ela se deitava com animais do que admitir as infidelidades dos maridos. E a possibilidade de paternidade de um deles.

Apesar da aparência da criança ela não tentou repudia-lo; Devido a fama de Laura, os habitantes da região especularam quanto a identidade do pai da criança, seria alguém da própria família? Ou um morador de Santa Teresa? Pela aparência da criança talvez o pai nem fosse humano. Também se falava se os Black estariam dispostos a cria-lo. Mas ao contrário do que todos esperavam, ela parecia estranhamente orgulhosa da criança de aspecto estranho.

Laura nunca frequentou a escola mas sempre tentava ler os livros que herdou de sua mãe, que morreu de forma misteriosa e violentamente inexplicável quando Laura tinha doze anos.

As únicas pessoas que viram Edgar durante seu primeiro mês de vida foram o velho Zecharias Black, primo mais novo do velho Black, dos Black não decadentes, e a pretendente de Tomas Sawyer Black, Mary Towers.

A visita da mulher foi meramente por curiosidade e suas narrativas subsequentes fizeram justiça às observações, Zechariah veio conduzir um par das vacas de Three Rivers, que o Velho Zecharias Black havia comprado de seu outro filho, Uris Black dos Black não decadentes.

Ferimentos estranhos ou chagas, com aspecto de incisões, pareciam deixar os animais visivelmente aflitos e, uma ou duas vezes  — durante os primeiros meses do ano — alguns visitantes imaginaram que pudessem discernir feridas similares próximas à garganta do velho e desleixado Black, e de sua filha desmazelada, albina e de olhos vermelhos.

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