a morte camuflada de super phasma

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eu não sou um garoto muito bom, tampouco gosto de insetos. me puseram em um ônibus e me disseram, chorando, para ficar melhor. não é como se eu estivesse doente. um inseto nunca vai ser uma presa difícil.

não sei onde devia parar, mas parei onde senti que o som de grylloidea era mais alto. agora está chovendo e eu estou ajoelhado ao lado do banco de um ponto de ônibus no meio do mais absoluto nada, mas não pretendo me mexer, somente para não pisar em formicidae desesperadas no meio do caminho, porque, enquanto não existir predador maior que minhas pernas, eu ainda sou o Super Phasma.

a realidade é regida por linhas cômicas. caoticamente, de forma amedrontadora, cômicas. desde que eu exista, mas não por muito tempo, porque eu sinto que os gigantes estão chegando logo, logo à medida que sons naturais ficam mais e mais altos.

grylloidea, vespidae, culicidae, coleoptera, serpente, uma gigante, a outra.

você me olha, mas não te encaro de volta, pois eu sei que eles têm olhos cheios de esperança. você põe seu guarda-chuva verde, camuflado, sob minha cabeça. e eu sinto que posso morrer a qualquer instante, porque, camuflado, eu sou apenas um bicho-pau prestes a ser pisoteado.

“o que um menino da cidade gigante tá fazendo aqui? você tá pegando chuva, vai pegar um resfriado.”

“insetos não pegam resfriado.”

a gigante pondera por alguns momentos antes de voltar a me comer vivo, como um louva-a-Deus fêmea faminto por reprodução.

“ah! você deve ser aquele menino que a vó falou. o... bicho-pau?”

eu finalmente olho pra você com desgosto. você tem o sorriso mais lindo e esperançoso do mundo, e é horrível. eu quero desviar, mas minha visão é adaptada a encarar seres como você.

“tira essa coisa verde de cima de mim. eu vou morrer.”

e você ri do meu sofrimento, assim como eu ri de todas as formicidae que pisei.

“levanta daí, moleque, se não o máximo que você consegue é pernas cheia de lama.”

eu levanto, esmagado por uma garota camuflada na mata pela cor verde, mas visível pelo seu sorriso gigantesco não natural. estou tonto.

sou uma baratinha mexendo suas finas pernas à beira da morte por envenenamento, uma tortura, um sofrimento longo até a hora final, caminhando por inúmeras coisas grandes demais, longas demais, mais que minhas pernas, mas que um bicho-pau, mais que o super phasma pode aguentar.

e foi aqui, nas rédeas cômicas da realidade, que o vilão foi torturado vivo até a morte (uma casa tradicional numa vila pequena vigiada por uma gigante de cabelos grisalhos) e a super-heroína camuflada triunfou pela primeira vez com seu sorriso inalcançável.

um sorriso inalcançável como esperança.

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