Capítulo 3

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Aos poucos, retorno os sentidos. Abro os olhos devagar, e sinto uma pontada de dor na cabeça.

— Tinha que ser o Mark mesmo — ouço uma voz feminina ao fundo — Você nem sabe andar de skate.

Logo ouvi a resposta de um garoto. A voz dele parecia meio fronha, como se tivesse algo apertando seu nariz:

— Você não sabe se maquiar e hoje recebemos a ilustre presença de um palhaço na comunhão. — "Pah!" Ouvi um tapa — Ai!

— A próxima vai ser um soco bem no seu nariz.

— Vocês poderiam parar de brigar? — Essa voz eu reconhecia, era Rose. Quando minha visão voltou ao normal, consegui ver Rose com uma garota e um garoto loiros. Eles eram bem parecidos. — Mary! Graças a Deus.

Ela veio até mim e me ajudou a sentar no sofá, onde eu estava deitada. Pisco algumas vezes e percebo estar em uma sala. Algumas pessoas estavam ali me observando, e dentre eles estava pastora Sophia.

— Você está bem? — ela me perguntou. — Como está se sentindo?

— Eu tô... — tento raciocinar com a enorme pontada de dor em minha cabeça — com fome — A pastora sorri e suspira aliviada — E com dor na minha cabeça também.

Apoio a minha mão atrás de minha cabeça, onde doía. É  provavelmente eu estava com um galo na cabeça.

— O que aconteceu? Eu só me lembro de pegar refrigerante e... bom, eu apaguei.

— Sinto muito. — a garota loira disse, dessa vez bem mais calma do que falava com o garoto — Foi o tonto do meu irmão tentando mostrar suas habilidades inexistentes no skate.

Ela apontou para o tal garoto loiro, que estava sentado ao lado dela numa poltrona. Ele apoiava uma bolsa de gelo em seu nariz e fuzilava a sua irmã com o olhar enquanto resmungava.

A pastora também me entrega uma bolsa de gelo e se senta ao meu lado.

— Eu sinto muito. Tenho certeza que meu filho, Mark, está arrependido pelo acidente — ela se volta para o tal Mark, que desvia o olhar — Afinal, não se deve andar de skate por aqui. Certo, Mark?

Ele fica em silêncio segundos e suspira.

— Certo. — Todos ficam parados o encarando, como se estivessem esperando algo — O que foi?

— Ah, sei lá — Rose cruzou os braços — Estamos esperando um pedido de desculpas para a Mary?

Ok, talvez seja impressão minha, mas todos ali pareciam acusar Mark. O ambiente já estava ficando diferente. Isso, até a pastora mudar de assunto:

— Certo! Está melhor, Mary? Caso ache que precise, podemos levá-la ao hospital.

Dou um pequeno sorriso.

— Não, tudo bem. Eu só estou com bastante fome. — Olho para ela. — Mesmo.

Imediatamente Sophia se levanta e me ajuda a me levantar também.

— Ah, sim! Claro. Venha, querida, sobrou um pouco do almoço. Pode comer o quanto quiser.

— Obrigada — digo um pouco constrangida com tanta bondade da parte dela.

Certo, carne de churrasco nunca foi tão gostoso quanto agora. Talvez seja por conta de fome ou porque quem estava responsável pelo churrasco seja um ótimo cozinheiro, ou talvez as duas opções mesmo. Não era apenas um pão com hambúrguer grelhado, era _o_ pão com hambúrguer grelhado.

— Nossa! Essa carne está muito boa. — Elogiei sem tirar os olhos da comida.

— É, — Sophia concordou com um sorriso — o sr. Donald é um ótimo cozinheiro.
 
Ainda que estivesse da cozinha, dava para ouvir a música alta dos irmãos e as conversas entre eles. Nem parecia que uma garota tinha acabado de desmaiar. Pensando bem, acho até melhor que nao comentem. Certamente não sou o tipo de pessoa que serve para ser o centro das atenções.

Franzi o cenho e voltei a atenção para a pastora.

— Quanto tempo fiquei desacordada? Era para estar todo mundo no hotel onde vamos ficar, certo?

— Bom, algumas horas. Sim, deveríamos, mas você não precisa se preocupar. Só começaremos as atividades amanhã. De alguma forma vocês vão chegar no hotel e ter mais um tempo de lazer.

Acenti com a cabeça como se estivesse tranquila com a ideia, mas por dentro estava me sentindo um tanto culpada. Com certeza dentre tantas pessoas ali, algumas queriam estar no hotel descansando agora. Quero dizer, por minha causa elas estavam ali ainda e...

Certo, Mary. Pare de se sentir culpada. Você não escolheu ser atropelada por um baixinho de skate. Lembre-se que acusação e ansiedade não provém do Senhor.

Respiro fundo e finalizo o delicioso hambúrguer. Enquanto isso, pastora Sophia parecia um tanto concentrada no telefone, pela sua expressão provavelmente resolvendo algum problema. Ela me olha e sorri.

— Pronto? Podemos nos reunir para dar partida, então.

Concordo com ela e a sigo até o quintal novamente. Chegando lá, fico um pouco nervosa ao perceber o olhar de algumas pessoas. Esfrego as minhas mãos tentando disfarçar que estou tendo um pequeno surto na frente deles e vou até um cantinho, mais especificamente ao lado de Rose.

Um homem loiro, bem parecido com os filhos de Sophia, aparece e chama a atenção de todos. É, sem dúvidas ele é o pastor.

— Pessoal! Bem-vindos a este movimento tão precioso de evangelismo. Meu mome é Samuel. sou o pastor responsável pelo nosso treinamento evangelístico nessa região. Creio que vocês já conheceram a pastora Sophia, minha esposa — Ele aponta para ela, que retorna para todos com um sorriso.

Difícil não ver a expressão apaixonada de Samuel para Sophia, mesmo que ele volte sua atenção para ela por apenas alguns segundos.

— Com certeza vocês não estão aqui por nada, mas porque são escolhidos. — Ele continua — É uma alegria ter pessoas com um encargo tão grande no coração. Alguns vieram de muito longe, até mesmo de outros países para estar aqui. Certamente vocês serão muito surpreendidos pelo Senhor nesses dias.

— Amém! — dizem todos em uníssono.

— Tivemos algumas complicações mas, nada que possa fugir do controle dEle. Antes de darmos partida, gostaria de fazer uma oração com vocês. Que vocês possam estar orando em concordância comigo, e que possam vocês mesmos pedir a Deus que aprendam, que sejam usados, e que sejam levados a lugares mais profundos na presença dEle.

Todos concordamos e fechamos nossos olhos. O ambiente é voltado para todos orando, e em específico, do pastor:

— ...Que o Senhor possa nos usar em dias tão poderosos guardados por Ti. Declaro que cada um aqui receberá uma dose de unção e espalhará essa unção, esse fogo para outras pessoas, para outras nações. Em nome de Jesus, amém!

Impossivel não sentir uma paz ao ouvir o pastor e todos orando. Imediatamente todo o nervosismo e ansiedade que eu estava se foram. Uma alegria e expectativa tomara conta do meu coração. Me viro para Rose entusiasmada.

— Nossa, não vejo a hora de sair pelas ruas e... e... Caramba, ver um cadeirante andar.

Rose ri e apoia suas mãos em meus ombros enquanto caminhamos até o ônibus.

— É, sei como você se sente. Ainda nem começamos!

Era impossível para todos ali se manterem calmos e quietos enquanto entravam no ônibus. Ninguém conseguia conter a animação para o que vai acontecer nesses meses, e eu não estava muito diferente deles.

Me sentei perto da janela e Rose ao meu lado. O ônibus dá partida e eu só consigo pensar em tudo que Deus está fazendo.

Mesmo com o que aconteceu, sinto que vou ter muitas surpresas nesses meses. E por algum motivo, eu tenho uma certeza no meu coração que algo vai acontecer nesse tempo, algo em específico. Eu não sei bem o que é, mas tenho uma certeza que é algo que Deus está guardando,  que vai me surpreender muito.

Sorrio com esse pensamento, mais uma vez com a certeza de que vai ser muito além das minhas expectativas

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