3- Amanda, a tia.

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      A jovem Amanda era extremamente bondosa, mas não possuía muito jeito com os rapazes. Seu foco nunca fora amor, mas sim um futuro pleno e confortável, com regalias e possibilidades infinitas; não queria nunca mais se sentir impotente; não queria nunca mais ter limitações financeiras. Então decidiu por arquitetura, seria a maior arquiteta do Brasil, a mais bem paga e mais reconhecida. Faria casas lindas para a sua família: sua irmã Selma teria um lindo "flet"; sua mãe Vilma teria uma casa espaçosa que pudesse ocupar com todas as espécies de cães que pudesse imaginar. Vilma adorava cães, quase tanto quanto suas filhas. Com seu marido falecido por causa da Diabetes, ela possuía uma responsabilidade incomparável de criar duas damas, e a presença de cães em casa fazia com que ela se sentisse mais segura. Mas a real ameaça não viria de fora.
      Quando Amanda tinha 20 anos, no segundo período de sua faculdade de Arquitetura, sua mãe começou a apresentar os primeiros sintomas de um possível câncer. Aos 23, a futura arquiteta enterrava sua mãe, depois de longos 3 anos de cuidados e tempo investidos em sua recuperação. As duas irmãs se viram, então, obrigadas a deixar suas diferenças de lado e criar laços mais fortes, uma união verdadeira por que, afinal de contas, só tinham uma a outra.
      Enquanto Amanda já tinha seu futuro traçado desde pequena, Selma ainda não sabia quem realmente era. Quando pequena, a jovem amava animais e era decidida a cursar veterinária. Na adolescência as coisas mudaram um pouco e a sua paixão se voltou para os livros, e optou então por uma faculdade de letras. Só no dia de sua prova de vestibular, após estudar incessantemente, decidiu que se tornaria enfermeira. O que veio bem a calhar quando sua mãe mais precisava. A diferença de idade entre as duas irmãs era de aproximados 5 anos, e como Selma era mais velha, quando terminou sua faculdade de enfermagem, Amanda começava a sua própria.
      Na época em que Vilma começou seus tratamentos, Roberto Villas Boas surgiu na vida da jovem enfermeira. Era um homem sensato e inspirava confiança, sempre disposto a ajudar – e ajudava mesmo –, mas Amanda sabia que algo não cheirava bem nele, e depois de muitas brigas com a sua irmã mais velha, o casamento surgiu, e todas as suas desconfianças se transformaram em realidade em menos de 2 anos de casamento: com 1 ano e 8 meses de casados, Henrique nascera, mas Roberto não estava presente no parto. É que no mesmo dia do nascimento do seu filho, o seu grupo do trabalho marcara um jogo de futebol importantíssimo que não aconteceria sem ele. Ao visitar seu recém nascido herdeiro, o cheiro de bebida fazia com que todos lacrimejassem constantemente, e suas piadas enojavam até os mais pacientes. Amanda queria sua irmã livre daquele traste, mas não da forma que aconteceu. Não era o que ninguém queria.
      No dia anterior à sua morte, Selma procurara sua irmã para contar a respeito da violência doméstica que vivia sofrendo. Queria denunciá-lo, mas simplesmente temia pela sua própria segurança e de seu filho. Fez Amanda prometer que cuidaria de Henrique caso algo acontecesse à ela, e que cuidaria bem dele pra que tivesse um futuro brilhante. Como dizer não à uma promessa assim? Depois da resposta de que cuidaria de seu sobrinho, Amanda pedira a sua irmã que fosse a delegacia imediatamente, que fizesse logo sua parte, mas Selma disse que esperaria mais um dia pra que pudesse ajeitar as coisas em casa, arrumar uma forma de escapar da fúria de seu marido quando recebesse sua devida punição. Mas não deu tempo. O dia seguinte era dia de pizza.

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