Believe

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Believe

Audrey

4/5 anos

Ela não conseguia se mover.

A última imagem do sonho ainda estava fresca em sua memória. Balões coloridos flutuando em um céu muito azul. Um lindo mural colorido para os seus olhinhos infantis. Uma última recordação sem propósito, apenas bela e calma para um despertar sereno.

O sonho, porém, desvaneceu veloz, pois ela, já desperta, não conseguia se mexer.

Qualquer serenidade de um sonho bonito esmoreceu.

Não conseguia abrir os olhos. Não conseguia levar a mão ao rosto para esfregá-lo. Não conseguia chutar as cobertas para longe. Não conseguia abrir a boca para gritar por seus pais.

Audrey sentia o corpo imobilizado, pesado como não deveria ser já que era uma criança pequena e delicada. Sua imaginação infantil poderia dizer que cada um de seus dedos eram como filhotes de elefantes, cada braço e cada perna eram os papais e mamães dos elefantinhos. Seus olhos pareciam rudemente vendados, sua boca colada e cheia de sal.

Ouviu sons de passos e objetos caindo e quis se encolher para se proteger, se esconder debaixo das cobertas. Mas não podia, não conseguia.

O chamado pela mãe morreu ali, na sua língua, deixando um sabor amargo do pânico crescente e avassalador que disparava sua mente e seu pequeno coração. Não demorou nada para parecer que não havia ar o suficiente.

Escutou uma risada baixa e terrível, uma respiração quente batendo em seu rosto assim como a falta de ar beijou-lhe a face.

Queria gritar desesperadamente. Precisava da mãe. Precisava do pai. Precisava conseguir se mover.

Não importava o perigo que ela corria ali naquele momento, não importava o quão ela tentasse, a princesinha permanecia terrivelmente congelada em seu pânico invisível e insensível a qualquer um.

A ausência de ar era tamanha que ela sentiu a moleza de seus membros desistindo da luta pela vida. Seu peito doía naquela infindável sensação de afogamento, e a menina quase teve certeza de que estava se afogando em um revolto mar não fosse ainda sentir seu colchão tão macio, seu cobertor tão levinho.

Foi repentino o toque em sua pele. No primeiro segundo, quis gritar, porém não tardou a perceber a realidade do toque tão reconfortante e delicado, uma benção para a princesinha. E tão benção era que, finalmente, seu corpo se libertou da prisão.

Seus olhos se abriram e se arregalaram sem protestar frente a luz do quarto. O medo de não conseguir abri-los de novo fez jorrar lágrimas gordas. Seus músculos protestaram, mas dessa vez o desespero não reprimiu seus movimentos; ela se moveu desajeitada e ligeira até estar encolhida no peito da mãe.

Aurora a abraçava como se pudesse fazer tudo mais desaparecer, como se nada além de Audrey importasse ou existisse. E a menininha se desfazia e se reerguia ali em quase todas as manhãs.

A jovem herdeira da bela adormecida tinha casos recorrentes de paralisia do sono, além de crises de insônia por não querer de forma alguma viver dos episódios de forçada imobilidade.

A mãe tinha o melhor abraço do mundo, o cheiro mais gostoso e o cafuné perfeito para acalmar qualquer um. Aurora deslizava as mãos pelos cabelos da filha, então as costas, logo escondia o próprio rosto nas mechas escuras da menina sempre murmurando uma bonita canção ou afirmações de sua segurança.

-Está acordada, meu amor – disse – Está acordada, está tudo bem.

Audrey deixou aquelas palavras penetrarem em sua pele, acompanhadas pelo carinho da mãe.

InocentesOnde histórias criam vida. Descubra agora