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Na saída do hospital

Caminhei ao lado de papai em silêncio total, ainda estou tentando digerir e entender tudo o que o Dr. Charlie me disse. Não é fácil saber que você pode nunca lembrar de metade da sua vida. Valentina e minha mãe estão a nossa frente, elas conversam baixo uma com a outra, quer dizer, minha mãe está falando e Valentina apenas a ouve.

É muito curioso ver as duas dessa forma, parecem tão intimas, como grandes amigas de anos. Me pergunto em qual momento Tina conseguiu a proeza de conquistar minha mãe dessa forma, eu consigo me lembrar bem do quão protetora ela era na minha adolescência em relação as garotas que tentavam se aproximar de mim para terem um relacionamento. E agora dona Sinu parece amar Valentina de uma forma tão verdadeira.

Como se fosse mãe e filha.

— Kaki. — Papa me chamou antes de nos despedirmos. Olho para ele esperando que continue. — Pelo menos hoje, por favor, tente ser mais amigável com sua esposa.

Sinto vontade de fazer uma careta pela forma que ele se referiu a ela, mas ainda estou atordoada demais com as notícias de hoje para ter alguma objeção. Sorrio para meu pai e o abraço.

— Eu prometo que me esforçarei.

Digo em seu ouvido e o ouço suspirar, alisando a base de minhas costas. Ele me aperta mais contra si e deposita um beijo no topo de minha cabeça.

— Vai dar tudo certo, princesa.

Ele tenta soar confiante, embora sua expressão facial entregue o quão receoso ele está. Abro um sorriso amarelo e apenas aceno com a cabeça.

Espero mesmo que dê tudo certo, papai... E como espero.

//

Valentina passou o caminho inteiro calada, agora estamos em frente à casa que dividimos e eu estou esperando que ela diga algo ou que ao menos destrave as portas logo. Ela respira fundo, suas mãos apertam o volante com força. Entorto os lábios, minhas mãos inquietas em meu colo, não sei o que dizer, muito menos se devo dizer algo ou apenas fique calada.

— Está com fome? — Sua pergunta me pega desprevenida, Valentina olha para mim e sorri. Olhos tristes e apagados, ela está forçando o sorriso. Já consigo identificar algumas coisas. — Posso ir buscar algo se quiser.

Sugere e então paro para pensar, não estou com tanta fome assim, porém acho que ela só precisa de uma desculpa para dar uma volta e espairecer as coisas. Eu sei que temos comida em casa.

— Sim.

— Pizza e cupcakes.

Ela não perguntou, pareceu mais uma afirmação. Estou meio boquiaberta por ela já saber o que eu iria pedir. Bem, ela é sua esposa, Luiza, óbvio que te conhece. Eu queria a conhecer um pouco mais também, saber suas vontades e gostos, coisas assim.

Sem dizer mais nada, solto meu cinto e abro a porta, olho para Valentina e esboço um sorriso antes de finalmente sair do carro e fechar a porta. Lá dentro vejo ela acenar para mim e então o carro é ligado outra vez. Vejo-o sumir na esquina e solto um longo suspiro.

Então vamos lá né, viver minha vida.

Ou tentar.

30 minutos depois e ela ainda não voltou, não que eu esteja controlando o tempo que ela fica na rua, mas confesso que estou preocupada. Valentina nunca foi uma pessoa muito instável, nunca soube lidar com suas emoções e isso é uma coisa que não parece ter mudado com o passar dos anos. Tenho receio de que ela faça algo errado ou que aconteça algo a ela. Ando de um lado para o outro na sala, vejo meu celular em cima da mesinha de centro e vou até ele o pegar. Acendo a tela e logo vejo uma mensagem, mensagem dela.

𝐕𝐀𝐋𝐔 ✓ • 𝐒𝐓𝐔𝐏𝐈𝐃 𝐖𝐈𝐅𝐄 •Onde histórias criam vida. Descubra agora