Tudo é feito para ser Quebrado

Capítulo 1

Bebo mais um gole de vinho e pouso a taça em cima da mesa. Minha cabeça latejava de dor, mas eu tentava ignorar porque nada doía mais do que meus pensamentos. Já eram três da manhã e eu não conseguia dormir. Caminhei pela varanda enquanto sentia a brisa leve sobre meu rosto e me debrucei para olhar o movimento na rua. Apesar de ser madrugada, haviam muitas pessoas nos bares. Procurei novamente pela taça e me servi com mais um pouco. Meu corpo estava começando a ficar quente. Virei a taça de uma vez na boca, e no mesmo instante meu celular começou a tocar.

Não me apressei para atender. 

- Onde você está? - Uma voz misturada com música alta perguntou.

- Alice? - Questionei.

- A própria! - Respondeu falando mais alto. - Estamos aqui na boate, desce pra cá!

Avaliei a possibilidade, e como estava levemente alterada pela metade da garrafa de vinho que bebi sozinha, confirmei que iria sim. Fazia tempo em que eu não saía para boates, já que meu trabalho ocupava todo o tempo que eu tinha. Mas hoje eu não tive plantão então resolvi aceitei o convite da minha amiga.

- Tudo bem, irei sim! - Confirmei. 

- Então venha logo, estou com uma galera muito importante se é que me entende.

Alice era assim, para ela todos os homens bonitos eram "uma galera muito importante". Ela e eu estávamos solteiras por um bom tempo, não por escolha, mas porque simplesmente não acreditávamos em amor. Minha vida amorosa era um desastre, então optei por amar somente a minha carreira profissional e tudo bem.

Escolhi um vestido preto midi, bem colado e com uma fenda na coxa esquerda. Soltei meu cabelo e passei um batom claro. Escolhi um salto não tão alto, mas que me deixava extremamente sensual. Estava com um pressentimento estranho, não era ruim ou bom. A tal boate ficava em frente ao meu prédio. Desci pelo elevador e segui até atravessar a rua. Minha cabeça ainda doía, mas eu era péssima para tomar remédios e sempre tentava melhorar sem eles.

Entrei na boate e demorei um tempo até localizar Alice. Ela estava em um camarote, rodeada de homens e mulheres que eu nunca tinha visto. Não eram da cidade, com certeza. Estavam usando ternos e roupas sociais. Percebi que estavam muito alterados, pois dançavam como se estivessem em um festival de música eletrônica. Dei meu nome para o segurança que conferia a lista do camarote, e Alice veio ao meu encontro. 

- Finalmente consegui te tirar de casa! - Comemorou já me entregando um drink. Provei e era gin com algum xarope muito doce.

- Quem são essas pessoas? - Perguntei bebericando meu drink e fazendo careta.

- Conheci em um pub mais cedo, e acabei chamando todos. Você sabe da minha facilidade em fazer novas amizades, porque tem uma palavra chamada "simpatia" e você deveria aderir.

Revirei os olhos e continuei bebendo.

- Você sabe da promessa que eu fiz. - Reclamei e ela sorriu. - Nunca mais vou me apaixonar por ninguém, e isso inclui fazer amizades já que eu posso simplesmente cair no colo de um executivo e do nada casar e ter filhos. Estou fora disso!

- Eu também fiz essa promessa Fernanda, mas pra isso não preciso me isolar do mundo. E sem contar que preciso transar toda semana ou eu fico louca! - Alice disse bem séria.

Rimos bastante, até eu notar um homem sentado no sofá passando o dedo cheio de anéis sobre a borda de um copo com uísque. Ele tinha o cabelo um pouco grande, que caía sobre o rosto e olhos muito azuis. Reparei também em sua barba bem feita e a forma como seus dedos tocavam o copo. Ele parecia estar preso em alguns pensamentos, e de repente seus olhos se encontraram com os meus. Desviei o olhar imediatamente e voltei a escutar Alice tagarelar. E desde então ele me olhava como se eu fosse um pedaço de carne. Não disfarçava. Percebi ele encarando minhas pernas por muito tempo, como se estivesse procurando um deslize na fenda do meu vestido.