Eu já estava cochilando quando, alguns momentos depois, Amelie me acorda dizendo que nosso destino chegou. Gostaria de ajudá-la a dirigir, para que pudesse descansar também, todavia, infelizmente ainda não tirei a carteira de motorista. Seria bom dizer que não pude porque Ame é um ano mais velha que eu e, logo, teve vantagem, porém, meu argumento seria refutado se levarmos em conta que ela dirige há dois anos.
Enfim.
— Mary, não se esqueça de pegar seu violão. Está na mala. Eu vou pegar as comidas e os lençóis.
Saímos do veículo, ambas em direção à mala. Quando chegamos lá, antes de abri-la, Ame se vira em minha direção.
— Clara, sério, muito obrigada por vir. Essas últimas duas semanas foram muito especiais. Sempre quis uma amizade como a sua, e fico feliz de Deus ter atendido às minhas orações e enviado alguém como você. Sabemos, é claro, Clarinha, que se não acontecesse, Ele Se manteria o mesmo: soberano. Mas, sabe, eu sonhei por muito tempo em passar um ano-novo assim, diante do Rei e com uma amizade que O glorifica. — Ai, meu Deus. Acho que vou chorar. Não. Acho que já posso sentir algumas lágrimas molharem a alça do meu vestido. Levanto meus óculos para limpar os olhos. — Sério, eu te amo. Você é muito importante para mim.
Ai, Amelie. Eu te amo. Você que é muito importante para mim.
— Eu te amo, Amelie. Acredito que outra qualidade sua, além de todas as que você tem, é ser boa com as palavras. Sinto as mesmas coisas que você disse, mas não acho que conseguiria expressar isso um dia. — Solto um riso fraco, enquanto ela me olha de forma terna. — Também sempre sonhei com um ano-novo assim, para falar a verdade, porém, não com uma grande amizade, a exemplo, mas com um namorado. Por muito tempo, eu foquei nas coisas erradas; antes de querer um namorado, e futuro marido, para suprir a carência que estava instalada em mim, eu deveria pensar nas amizades que glorificam a Cristo que eu deveria ter. É claro que romances são bons, mas antes deles precisei aprender a valorizar boas amizades. Você é uma dessas boas amizades, Amelie. No seu apelido, "Ame", há uma ordem expressa para amar. Alegra-me saber que antes do Soberano me ensinar a amar um parceiro, me ensinou a amar uma amiga.
Seu olhar terno perdura, como alguém que é muito amável, deixando lágrimas solitárias rolarem por seus olhos. Assim como eu, Ame é pecadora, entretanto, exulto em saber que é uma pecadora arrependida.
Nós nos abraçamos. É um abraço amoroso, cheio de sentimento, onde eu consigo sentir o aroma cheiroso do cabelo de Amelie.
— Ai, Maria Clara — Ri. —, você me fez chorar toda. Eu te amo, mas vamos para a praia achar um lugar antes que seja tarde. E não sei se acredito que você não é boa com as palavras. — Solta outro riso, até que parece se lembrar de algo, como se uma chave fosse virada em seu cérebro. — Ai, meu Deus, Mary Claire, eu lembrei de uma coisa!
— Que foi? Não é nada de vida ou morte, né? — sugiro, irônica.
Minha amiga ri.
— Como você é engraçada, Clara. Veja, meus pais têm uma casinha rústica aqui em Gold Coast, meio que uma cabana. Na parte de trás da cabana, tem algo tipo um planetário, onde dá para ver o céu sem toda aquela interferência urbana. Sei que eles não se incomodariam se a gente fosse.
Que bela notícia, Ame.
— Por que não vamos, então?
Dá de ombros, acompanhada de um sorriso amarelo.
— Eu não tenho a chave.
— Meu Deus, Amelie! O que você pensando em fazer?
— Voltar? — conta, relutante, soando mais como uma pergunta a uma afirmação.
— São duas horas de carro, ida e volta somadas. Tem certeza que quer isso? Amelie, já são 20h30!
— Tudo bem por você? Contribuirá ainda mais para a nossa aventura! E, aliás, justamente por ser 20h30 que precisamos nos encaminhar depressa!
— Quem ainda diz depressa, Ame? — brinco. — Mas tudo bem, vamos logo. Seja o que Deus quiser.
Ela sorri. Então, eu e Amelie voltamos aos bancos de passageiro e motorista, respectivamente, antes mesmo da mala do seu carro sem capô ser aberta, como o planejado.
Decerto, já vi minha amiga pegar o celular para ligar para os pais pelo menos cinco vezes hoje, sobretudo nas pausas que tivemos, onde ela pôde se abster de dirigir. Por isso, sinto que preciso perguntar o porquê não liga agora.
— Vai ligar para os seus pais?
— Vou ligar para avisar que chegamos em Gold Coast, sem comentar sobre a nossa volta. Quero fazer uma surpresa.
— Certo. Legal. Por falar nisso, Ame, tem certeza que não tem nenhuma chave reserva na cabana? Às vezes deixam, sabe, embaixo do tapete.
— Meus pais não são desse tipo, Mary, mas, mesmo se tiver alguma chave assim, depois que pensei em ir e voltar, não vou rejeitar essa aventura pelas ruas da Austrália — revela, animada.
Então, Amelie liga para os pais, como disse que faria, até que estivéssemos na estrada novamente. Antes de irmos, ela não esqueceu de dizer:
— Que Jesus nos acompanhe.
Chegamos. Amelie é a primeira a sair do carro, prestes a tocar a campainha. Em seguida, eu quem me retiro do automóvel. A mãe de Ame, Patrícia, parece surpresa em nos ver.
— Achei que estivessem em Gold Coast, meninas. O que aconteceu? Vamos, entrem. — Dá espaço para que entremos no lugar. Em seguida, fecha a porta.
— Era para estarmos lá, tia Pat — respondo —, porém, Amelie lembrou de algo no momento em que chegamos.
Pat olha para a filha, esperando que ela dê continuidade à história.
— Mamis, lembrei que você e o papis têm uma casinha rústica em Gold Coast. Pensamos se poderíamos ir para lá.
— Claro que podem, meu amor. Foi por isso que voltaram?
— É. Não tenho a chave.
— Parece uma coisa boba, mas tudo bem. Se não me engano, ela está aqui — diz, se referindo ao molho de chaves ao lado da porta por que entramos. — Achei. — Tira do molho de chaves e entrega a Amelie.
— Obrigada, mamis — Ame agradece, ao passo que Pat sorri.
— Só um momento. Já que vieram, deixe que eu chame seu pai para se despedir mais uma vez. Ele está lendo alguma coisa lá em cima.
Assentimos. Patrícia vai escada acima, voltando alguns instantes depois com Carlos ao seu lado. Todos nos abraçamos e nos despedimos.
— Vão com Deus, queridas. Feliz ano-novo. Aproveitem a cabana! — Carlos quem diz.
Saímos da casa e seguimos à viatura de Amelie.
— Vamos logo, Mary Claire! Estou com receio de que não dê para fazer tudo o que eu pensei.
— O que você pensou?
— Seja na cabana ou na praia, conversar e louvar, sobretudo.
Sorrio.
— É um bom plano.
— Vamos. — Pisa na embreagem. — Que Jesus nos acompanhe.
— Que Jesus nos acompanhe.
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Pelas ruas da Austrália: um conto de ano-novo
ContoMaria Clara e Amelie são duas jovens universitárias que estudam na Universidade de Queensland. Cristãs, as amigas passam a véspera de ano-novo juntas pelas ruas da Austrália. Conto de ficção cristã temático de ano-novo, narrado sob a perspectiva de...