Por que eu?

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Eugênio vagou pelos corredores da tecelagem por mais ou menos uma hora tentando entender completamente o que acabara de acontecer. Sua mente estava em um completo reboliço e andava aflito de um lado para o outro, na tentativa de achar algo que aliviasse a agonia que sentia, ao mesmo tempo, algo que pudesse lhe trazer as respostas que tanto ansiava encontrar.

O que Matias havia dito era verdade. As especulações corriam soltas sobre por que o casal não havia produzido um herdeiro. Passou da típica piada entre os funcionários, para uma pressão sufocante em cima da Violeta, que por muitas vezes teve que ouvir absurdos de pessoas que a questionavam sobre seu dever de esposa.

Ele poderia permitir que isso acontecesse se tivesse a chance de detê-lo? Ele sempre teve o sonho de construir uma família e de ter filhos, mas depois de tudo o que Dirce fez, viu esse sonho se esvaziar por suas mãos e ficar cada vez mais distante, mas agora, ele tinha a oportunidade de ter um filho, mesmo que ninguém além de Matias e Violeta soubessem disso.

Violeta... Sua chata de galocha... Sua sócia... Sua amiga... O relacionamento deles seria o mesmo se eles passassem por isso? Relacionamento esse que demorou tanto tempo para chegar a esse nível de confiança e cumplicidade, agora corria o risco de passar por uma enorme turbulência.

Ele balançou a cabeça em negação. Afinal, tinha muitas perguntas e nenhuma resposta. Só havia uma maneira de descobrir isso... Ele tinha que falar com ela. Ela tinha as respostas que ele precisava.

Claro que ele não tinha ideia de que ela estava se fazendo muitas das mesmas perguntas...

Agora restava saber onde ela estava. Mas ele a conhecia muito bem para saber onde era seu refúgio. A lagoa existente no engenho Camargo. Eugênio se lembrava de Violeta dizer que era para lá que ela corria todas as vezes que precisava silenciar o mundo para poder ouvir a si mesma.

Rapidamente, ele foi até seu encontro.

Violeta estava sentada no deck de madeira, com seus pés descalços na direção das águas cristalinas do corpo de água. Ela estava perdida em seus pensamentos, em busca de consolo, conforto e sabedoria, enquanto ponderava sobre a cruel reviravolta do destino que a vida lhe dera.

Ela sentiu sua presença muito antes que ele dissesse qualquer coisa e ela permitiu o momento de silêncio entre os dois. Muitas coisas que aconteceram naquele dia eram incertas, mas havia uma coisa que era mais do que certa... A conversa que ela e Eugênio estavam prestes a ter NÃO seria agradável.

Ela finalmente quebrou o silêncio, embora não se voltasse para ele.

- Acredito que dona Iara está muito chateada comigo, porque saí da fábrica as pressas e acabei deixando minhas obrigações todas pendentes nas últimas horas e não tenho intenção de retornar a elas hoje.

- Tenho certeza de que ela fará um bom trabalho de cobertura e reagendamento para você. Todos merecem um descanso de vez em quando. (O silêncio surgiu novamente entre eles) Posso falar com você? Mas desta vez, não como minha sócia.

Ela finalmente se virou para ele, sua expressão ilegível, o que Eugênio achou muito incomum e muito desconcertante.

- Como meu sócio, você aparentemente tem liberdade para fazer muitas coisas, entre as quais falar comigo.

Ele teve que tomar algumas respirações profundas antes de continuar a manter a dor fora de sua voz.

- Quero conversar com você sobre o assunto que Matias abordou hoje de manhã. (Disse sem encarar os olhos dela)

- Você tem alguma ideia de como tem sido nos últimos seis anos? A tentativa, a esperança, a decepção, a frustração? Ouvir as pessoas falarem e dizerem coisas incrivelmente dolorosas, incluindo suas capacidades como mulher e a virilidade de seu marido? (Sua voz soava irritada)

Gerar um Herdeiro - A PersonificaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora