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O alaúde quebrado

São sete e meia de uma noite de agosto. As janelas da sala de estar da casa cinzenta estão escancaradas, pacientemente trocando o ar interno viciado de álcool e fumaça pelo frescor do entardecer que custa a cair. Há traços de perfume floral pelo ar, tão fracos e frágeis como indícios de um verão já distante no tempo. Mas agosto ainda é proclamado pelos milhares de grilos em torno da varanda lateral, um dos quais se escondeu dentro de casa, atrás de uma estante de livros, fazendo soar de tempos em tempos sua inteligência e sua vontade indômita.

A sala está em desordem. Sobre a mesa há um prato com frutas que são reais mas parecem artificiais. Por toda a volta estão agrupados jarros e copos e amontoados cinzeiros, estes ainda soltando fumaça no ar pesado – faltando apenas uma caveira para dar ao conjunto o efeito daquele cromo respeitável pendurado outrora em todos os "lares", que apresentava os elementos da vida de prazeres com um sentimento delicioso e inspirador de medo.

Depois de algum tempo, o solo do grilo dentro de casa é interrompido por um novo som – o lamento melancólico de uma flauta tocada por dedos incertos. É evidente que o músico está ensaiando, não executando, pois de tempos em tempos o som se interrompe e depois de um intervalo de murmúrios indistintos, recomeça.

Ao recomeçar pela sétima vez, um terceiro som contribui para a desarmonia. É um táxi lá fora. Mais um minuto de silêncio, de novo o táxi, e sua retirada barulhenta quase abafa o som de passos no cascalho. A campainha da porta soa alarmante por toda a casa.

Da cozinha vem um japonês pequeno e fatigado, abotoando apressadamente o paletó branco de criado. Abre a porta e deixa entrar um belo jovem de 30 anos, vestido com as roupas bem-intencionadas peculiares dos que servem à humanidade. Toda a sua personalidade emana um ar bem-intencionado: seu olhar pela sala é uma mistura de curiosidade e de otimismo determinado. Quando fixa os olhos em Tana, o desejo de salvar o oriental ímpio transparece em seus olhos. Seu nome é Frederick E. Paramore. Foi colega de Anthony em Harvard, onde, devido às iniciais de seus sobrenomes, ficavam sempre lado a lado nas aulas. Uma relação fragmentária estabeleceu-se entre os dois, mas desde então jamais se encontraram novamente.

Não obstante, Paramore entra na sala com um certo ar de quem chega para uma longa visita.

Tana está respondendo a uma pergunta.

TANA (sorrindo cordialmente): Foram jantar fora. Volta meia hora. Foram desde seis e meia.

PARAMORE (vendo os copos na mesa): Têm visitas?

TANA: Sim, visita. Caramel, e Sra. Barnes, Srta. Kane, todos aqui.

PARAMORE (bondosamente): Vejo que andaram molhando a garganta.

TANA: Não comprende.

PARAMORE: Andaram bebendo.

TANA: Sim, anda, bebendo. Oh, muito, muito, muito bebendo.

PARAMORE (afastando delicadamente o assunto): Não havia alguém tocando quando eu cheguei?

TANA (com um sorriso espasmódico): Sim, eu toca.

PARAMORE: Um instrumento japonês.

(Ele é, evidentemente, assinante da revista National Geographic.)

TANA: Eu toca flaauta, flaauta japonesa.

PARAMORE: Que estava tocando? Uma canção japonesa?

TANA (com uma evidente contração de testa): Toco canzão do trem. Como diz? – Canção do trilho de trem? Assim diz no meu país. Como trem. Va-a-a-i. Quer diz apito. Trem sai. Aí, z-u-u-u-u. Quer dizer trem vai. Vai assim. Canção muita bonita em meu país. Canção criança.

Os Belos e Malditos (1922)Onde histórias criam vida. Descubra agora