— Você já deu o depoimento? — Pergunta Fábio, vestido de preto dos pés a cabeça, na qual estava um chapéu estilo fedora, em luto pelo namorado do amigo, o cabelo preto, grosso, volumoso e liso, na opinião de Gustavo revelava muito mais sua descendência asiática do que os olhos puxados, sentado em uma cadeira ao seu lado, batia suavemente o pé o no chão enquanto conversavam.
— Ainda não — Responde Gustavo de cabeça baixa, sua voz sai áspera e seca, deu um gole no energético que conseguiu escondido com o amigo, foi penoso fazer Fábio delinquir-se mesmo por um momento, não queria discutir nada daquilo, na verdade não queria falar sobre nada, ficar sozinho com seus pensamentos era seu maior desejo no momento, mas ao mesmo tempo queria que alguém de sua confiança ficasse ali, Isa estava em estágio atendendo no consultório naquela manhã, então restava Fábio. O amigo insistiu no assunto, era inevitável, e ele precisava dar o depoimento completo, era a única forma de conseguir justiça para Vitor.
— Se você quiser pode ficar lá em casa, os caras não vão se incomodar. — Fábio morava em uma república de amigos/conhecidos, Gustavo havia estado lá mais vezes do que era capaz de contar, mas não queria estar em lugar algum.
— Eu não sei... preciso pensar... eu... queria sumir, só isso. — Gustavo olhou pela janela e contemplou as árvores, cujo as folhas balançavam de forma sinuosa enquanto o vento as abraçava, isso o impediu de ver o sorriso de Fábio.
O quarto branco do hospital fazia Gustavo sentir-se seguro, desidratado e em choque, foi a única observação dos médicos, fazendo apenas um ou outro curativo na clavícula e nas mãos. O deixaram no quarto com um soro depois do banho, foi quando proibiu a enfermeira de desligar a luz depois de saber que nenhum corpo foi encontrado na cabana na sua rápida conversa com os policiais.
— Quer que eu te leve? — Novamente aquele assunto, Gustavo respirou fundo, contendo a irritação, quem sabe seria melhor mesmo acabar com aquilo de uma vez, além disso, com Fábio ao seu lado estaria mais seguro.
*
Fábio andava rigorosamente no limite de velocidade, o que fazia um percurso curto não ter fim Gustavo se sentia enjoado, sentado no banco da frente olhava atentamente cada detalhe das ruas estreitas e casas pequenas, a cabeça apoiada no vidro impedia de ter um contato visual com o motorista, tudo parecia tão tranquilo. Durante o dia a cidade repleta de árvores e edifícios pequenos parecia menos sinistra do que a noite
— Preparado? — Pergunta Fábio.
—Não, mas não é como se eu tivesse muita escolha... — Desinteressado, vira ainda mais o rosto.
— Pense que tudo vai acabar hoje.
— Não vai, eles vão querer vários depoimentos iguais pra saber se estou mentindo, e ainda tem a procura pelo assassino e depois o julgamento e depois a prisão e depois de anos a liberdade, essa porra não tem fim! — Talvez tenha se exaltado, mas não é como se não tivesse dado sinais que não queria permanecer nessa conversa.
— Você viu ele? o rosto? reconheceria se o visse?
— Fábio! Eu não quero falar disso...
— Você está indo para a delegacia dar seu depoimento, quero saber o que você vai dizer. — Sua voz era pacífica, homogênea, artificial.
Fábio tirou o chapéu, uma marca no alto da testa, vermelha arroxeada, a voz, tão familiar mas desconhecida, o tom homogêneo, abafado por plástico e tecido, o reflexo de puxar a maçaneta e pular do carro foi forte demais para conter, isso é claro, se a porta não estivesse com a maçaneta quebrada do lado de dentro, virou-se para ver Fábio, ele sorria. Elevou o braço, cerrou o punho, mas o soco saiu em uma velocidade mais lenta do que o pretendido, Fábio conseguiu desviar e devolver o soco, acertando em sua bochecha, sentiu... não sentiu... como se estivesse dormente, sua cabeça acertou o vidro da janela, fazendo sua visão dar voltas, mas não sentiu dor, aquilo estava errado.
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O Enforcado
HorrorGustavo é um jovem como qualquer outro, exceto pelas mensagens sinistras que tenta ignorar, perseguido por um assassino, luta pela sua vida até se tornar algo mais bonito aos olhos do sicário.