"Ipê amarelo das flores de algodão; rogo seu perdão".
Tempestade torrente avinha com a ventania; torcia os galhos e ramos; punha curvada a Rainha do Jardim do Paço.
Naquele escuro dilúvio de tarde, pôs-se ao seu defronte e lhe gritou um homem desesperado:
- Que fazes de mim, ó musa?!Pequeno europeu confrontava o ipê. Seu amante tropical.
- Que fazes ao coração deste velho marinheiro?!
O aipê yubá com seus trinta de metro, chorava pétalas amarelas de tristeza, que caiam pingadas na cabeça e ombros portugueses.
- Sei que estás zangado. Pois, com razão. Eu mereço! Eu mereço vossa raiva!
Faísca de corisco confirmou a ira da jovem ibirá.
- Mas a de me entenderes. Tudo que fiz, foi por vós. Por amar vós!
Trovão o acusou de mentira. Tupã sentia cheiro de covardia. A paciência do ipê dourado se gastava.
- Por que estás a me evitar?! A me recusar?! A me negar o amor?!
Caraíba punha de volta sua máscara vil. Encarnava Juruparí.
- Eu ainda sou seu dono!!
Raio flechou o tronco. Partia-se em mágoa a alma da yubá.
Vinha ventania. Ipê pedia que fosse o luso embora.
- Ah! Estás a expulsar-me? Pois, entendi. Entendi. Não me queres mais...
Na voz tinha verdade. Chuva acalmou, porém, não cessou.
Ibirá não disse não; não disse sim. Do europeu não gostava nem desgostava.
Mas isso não bastava. Homem branco pedia mais; sempre mais.
Pedia que fosse mais seu.
Aipê já era árvore. Mas não lembrava de ser árvore antes do luso.
Trezentos anos. Trezentos anos que o cravo vermelho mancha o alegre amarelo do ipê.
Aipê já foi árvore. Já foi bicho; já foi gente.
Nessa terra abençoada de Deus, foi tudo, é tudo e será tudo; ontem, agora e sempre.
Esta terra é ele. Mas seu dono, era Porto.
E este ainda não o entendia.
Era ibirá yubá. Vermelho não era sua cor.
Luso se punha de joelhos; ensopado de água como estava. Já não era Juruparí, o Mal encarnado; era seu Porto, o aventureiro obstinado.
Percorria a mão áspera pelo seu corpo, seu tronco. O olhava com seu olhar verde de mar sereno. E lhe implorava:
- Fique. Fiques comigo.
Agridoce. Assim era ele.
Mas afinal, quem era Porto?
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Os Perdões de Um Ipê
Historical FictionUma história de amor conturbada. Um marinheiro desesperado, com seus dias de glória no passado; e uma árvore amarela cansada e sufocada; nunca entendida e nunca respeitada. O inicio do fim de uma longa relação de flores e espinhos.