01. Da Capo...

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Domingo, 31 de Agosto.

Em seu sonho, Heeseung observava uma figura imensa, escura e monstruosa se aproximar — observava, pois seus pés estavam plantados no chão como se tivessem criado raízes. O ritmo de sua respiração competia com o de seu coração, impedindo que ele gritasse, por mais que quisesse; se mover, então, era impossível, o medo restringindo-o como uma camisa de força. O som deslizante e asqueroso de sua aproximação era tão real que ribombava em seus ouvidos, cada vez mais perto, à medida em que o monstro se erguia sobre ele e se preparava para abocanhá-lo por inteiro, de uma vez só...

— Heeseung!

Sobressaltado, o menino abriu os olhos, a visão turva do sono profundo. Seu coração estava acelerado como no sonho, mas as imagens vistas — talvez a experiência vivida descrevesse melhor o que se passou — já começavam a lhe escapar. Heeseung esfregou os olhos com força, seu cérebro operando na manivela. O que tinha sonhado mesmo? O menino se esforçou para lembrar, mas era como se as lembranças tivessem desaparecido, varridas como pó para debaixo do tapete do seu inconsciente. Foda-se, pensou, sacudindo a cabeça.

— Filho, você já está pronto? — a voz que vinha de detrás da porta era de sua mãe, com um tom de impaciência perceptível na vozinha sempre calma. Ela bateu na porta mais uma vez, e uma sensação de familiaridade o atingiu com força: passos ribombantes e pesados... O menino bocejou, piscando para afastar o sono. Pela janela aberta entrava pouca luz, e com os olhos apertados na penumbra, Heeseung viu que o mostrador do relógio digital piscava em 16:58 — A gente vai sair pra te levar de volta daqui meia hora!

Assim que entendeu do que ela estava falando, torceu o nariz em aversão. Seus passinhos de salto alto ecoaram para longe dali como uma ameaça, mas Heeseung só afundou o rosto no travesseiro novamente, abafando um grito frustrado. Por favor, cara aí de cima, pensou. Se você existe de verdade, mande seu asteroide pra cá agora mesmo.

Heeseung não estava pronto para voltar à escola; nunca esteve, e talvez nunca estivesse.

O último termo antes da formatura parecia pior do que todos os outros antes dele. Só de pensar em toda aquela chatice de provas e regras e provas e regras e professores malditos e provas e regras... Por um segundo, se permitiu imaginar o que aconteceria caso ele não voltasse — como faria isso nem passou pela sua cabeça — e sorriu em satisfação. Cada cenário imaginado era melhor do que o outro: acordar todos os dias depois do meio-dia, pedir comida de delivery, jogar até altas horas da madrugada, ouvir música no último volume sem ser perturbado por ninguém... Só que daí ele percebeu que todos eles envolveriam ficar em casa. Suas expectativas murcharam como um balão; ele podia odiar o colégio com todas as suas forças, mas não mais do que odiava ficar ali. Suspirando derrotado, mas ainda contrariado, o menino se ergueu da cama, se espreguiçou e escaneou o chão bagunçado a procura de sua bolsa de viagem, tudo o mais lento possível, imaginando que essa atitude seria pelo menos uma alfinetada nos pais.

O menino tomou um susto quando seu celular começou a tocar, o grito energizante de Glenn Danzig e a progressão de acordes de Bobby Steele de Last Caress dos Misfits estourando nos auto falantes; ele tinha esquecido de tirar o aparelho conectado no bluetooth.

I got something to say

I killed a baby today ♪

Alarmado, já que música alta era um problema, com dedos rápidos Heeseung desligou a caixa de som, ao mesmo tempo em que checava a tela acesa com os olhos arregalados: ali brilhava uma foto bem grande de seu melhor amigo usando uma camisa xadrez e fazendo uma pose com os dedos em "V" no meio dela, indicando uma chamada por FaceTime. Ele aceitou a ligação, e já começou a falar sem nem mesmo dizer "alô".

That High School BandOnde histórias criam vida. Descubra agora