Verdades que Machucam

DOIS

Quando Dimitri, meu neto mais velho, conheceu Olívia, eu sabia que eles ficariam juntos. Eu só não sabia que junto com ela, viria um passado que me atormetou durante anos. E eu também não fazia ideia, de que, esse passado pudesse colocar a vida das pessoas que mais amo em perigo.

Talvez seja a idade, pois tudo o que aconteceu a alguns meses atrás, eu jamais imaginaria que iria acontecer.

Ver Dimitri, deitado em uma cama de cirurgia, sem saber se ele ficaria bem ou não, mexeu demais comigo. E ainda saber que Olívia estava grávida e que poderia perder o homem que ama, mexeu ainda mais. Afinal de contas, eu finalmente teria um bisneto ou uma bisneta, e eu me culparia eternamente se essa criança não tivesse a presença do pai junto a ela.

Confesso que tive medo de Dimitri ser para sempre o boêmio - as pessoas ainda falam essa palavra? - que era, mas graças a Deus e a santa Olívia, que não. Meu neto finalmente tinha sossegado. Eu vivi para vê-lo rastejar atrás de uma mulher. Isso é uma coisa satisfatória demais para mim. 

Sabe o que não é nenhum pouco satisfatório? O que estou prestes a fazer nesse momento.

Ao meu lado, está Vera, minha companheira.

Depois que Yanka faleceu, vítima de um câncer, eu me afundei em trabalho e esqueci do mundo. Vera veio trabalhar na minha casa e foi ela, que me ajudou a sair do fundo do poço. 

Eu cheguei duas vezes ao fundo do poço e uma foi praticamente seguida da outra.

A primeira, quando tentei a todo custo achar e ajudar alguém e m frustei, porque não consegui nenhum e nem outro e quando minha querida Yanka faleceu.

Eu fiquei remoendo esses dois acontecimentos durante muito tempo e foi ela, a Vera que me ajudou a superar e voltar a andar com minha vida.

Demorei um tempo para entender que ela era a pessoa com quem que compartilharia o final dos meus dias. Ainda estava crente de que se não fosse Yanla, não sei mais ninguém, mas a vida é engraçada e vive pregando peçinhas em nós.

Estamos juntos anos e nunca nada foi oficializado. Não acredito que a essa altura ela vá reclamar disso. Vera viu Yvannia virar uma mulher e passar por muita dor, viu meus netos crescerem e nutri o mesmo amor que eu sei que Yanka teria por eles. Anya e Nikolai não tiveram o prazer de conhecer a avó, mas eles tem Vera, e isso me conforta. 

A minha frente estão Dimitri e Olívia, que carrega consigo uma barriga linda de seis meses de gravidez. Consigo ver, que logo a seu lado, estão Anya e Lavínia, que descobrimos ser irmã dos gêmeos. Filha do homem que eu procurei para tentar ajudá-lo, mas não tive sucesso. Meu outro neto, Nikolai, está em pé, escorrado na parede, como se não houvesse local para ele sentar. mas claro que há, o problema de Niko, é que ele se afasta emocionalmente das pessoas. e eu estou tentando melhora isso, mas algo me diz, que brevemente, isso mudará.

Yvanni, minha filha, acaba de passar pela porta, seguida de Mikhail e eu me pergunto se, no passado, tudo tivesse sido diferente, será que estaríamos aqui nesse momento? Será qu teriamos passados por tudo que passamos?

Ainda falta uma pessoa. A mãe de Olívia. A pobre mulher que teve sua vida arruinada pela mesma pessoa que arruinou a vida da minha filha por uma ideia deturpada. Uma verdade que ele criou em sua própria cabeça e não nunca mais teve paz.

— Dedushka¹, o que é de tão importante? — Dimitri, como sempre, o impaciente — Olívia precisa descansar, foram ordens médicas.

— Ora, parshivets², acha que não sei o que são ordens médicas? 

— Estamos esperando mais alguém? — Niko é quem pergunta.

— Sim, estamos. A sra. Márcia.

— Minha mãe? — Olívia diz, confusa — Mas, o que ela tem a ver com isso tudo? — Olívia já sabe porque estão todos aqui.

Eu disse que contaria a ela o meu lado da história, mas achei justo abrir as história para todos. Afinal de contas, somos uma família.

— Não foi ela quem ficou casada com Vladmir durante todos esses anos? Comendo o pão que o diabo amassou... — a moça me olha com os olhos arregalados — Ela também merece ouvir o que tenho a dizer. É uma forma de eu me desculpar com ela... e com todos vocês também.

— Dedushka, a gente já falou...

— Eu sei que já falaram que eu não preciso fazer isso, mas quem decide isso sou eu e não vocês — respondo a minha neta, que se encolhe no sofa ao lado da irmã recém descoberta.

A campainha toca e Vera se levanta para abrir a porta, em poucos segundos, Márcia aparece no corredor e se espanta ao ver todo mundo junto.

Da última vez que isso aconteceu, muitas coisas foram descobertas e muita verdades foram ditas. E dessa vez não vai ser diferente.

Aponto para uma das poltronas que está vaga, pedindo, silenciosamente que a mulher se sente. Ela o faz e então me começo a me preparar para as verdades que mais me machucam nessa vida.

Respiro fundo e tento me lembrar de um começo distante. O exato momento onde tudo começou a desandar.

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¹ Avô/ ² Moleque